“Fulano não me representa”. A cantiga do eleitor

Tonico Magalhães*

O quiosque que frequento no calçadão da avenida Boa Viagem estava fechado na noite do Reveillon. No dia seguinte fui indagar o que tinha acontecido para justificar o fechamento e o pequeno comerciante não aproveitar uma noite tão promissora para os negócios. A resposta foi clara, mais uma extorsão do poder público para tirar dinheiro do cidadão-contribuinte:

A Prefeitura do Recife estabeleceu a cobrança de uma taxa de R$ 250 para quem mantivesse o quiosque aberto depois da meia-noite do dia 31 de dezembro. E com pagamento adiantado, não se importando se iria ou não ter faturamento para tanto. A multa para quem descumprisse a portaria da prefeitura seria mais de R$ 1.000. O quiosque que frequento não viu 2020 chegar em Boa Viagem.

Mas o prefeito Geraldo Júlio estava no bairro, no apartamento de um amigo rico – por que os esquerdistas têm sempre um amigo rico? – na avenida Boa Viagem, de onde viu o espetáculo barulhento dos fogos, segundo a coluna social de João Alberto.

Na véspera do ano eleitoral inaugurado ontem, no qual o PSB quer eleger como sucessor de GJ, o menudo João Campos, a Prefeitura do Recife deslanchou a inauguração de várias obras que vinham sendo mantidas em banho-maria. A memória popular, no entender dos marqueteiros, fixa melhor os acontecimentos mais recentes. E  é isso que está acontecendo.

As obras inauguradas têm seu valor social, mas para concluí-las a Prefeitura vem tirando seus recursos dos cidadãos-contribuintes por qualquer motivo. É o caso, por exemplo, da tentativa de aumentar o Imposto Predial e Territorial Urbano, o famigerado IPTU, barrada temporariamente na Câmara Municipal. O alvo de Geraldo Júlio foi acrescentar mais imposto na conta dos moradores que já pagam mais, como os dos bairros mais bem estruturados da cidade e que abrigam pessoas com melhor renda.

A tentativa do IPTU maior motivou os vereadores do Recife a agir contrariamente por mexer com seus apoiadores e financiadores de campanha. Fosse pelos bairros populares, de onde eles só tiram votos, não haveria tal reação parlamentar.

Se, por um lado, os vereadores brecaram o aumento do imposto, eles fizeram a gentileza de aumentar seus rendimentos para a próxima legislatura. Caso sejam reeleitos, lhes esperam um bom salário e mais uma série de penduricalhos que multiplicam seus ganhos.

Mas, na verdade, não queria falar aqui só de quiosque fechado, cobrança excessiva de taxas municipais, dos fogos de Boa Viagem ou de salários de vereadores. Mas sim da baixa representatividade dos políticos em relação à expectativa dos eleitores. “Fulano não me representa” virou mote em manifestações políticas por todo o País.

Se viu que o prefeito de Paulista na Região Metropolitana do Recife contratou para o show da virada na praia do Janga a cantora Anitta por uma fábula de dinheiro. Em Jaboatão vieram cantar Zezé de Camargo e Luciano. O cachê da dupla não foi baratinho. Na zona sul do Recife, os cachês de shows mais baratos ficaram no Pina. Os de Boa Viagem foram mais altos. Pergunto: não haveria ação mais adequada para aproximar o representante do representado?

É o que acontece quando a verba pública – vinda dos impostos pagos por todos – fica sendo usada por um grupo em benefício de um negócio ou ideologia política. O cidadão-eleitor tem sido acusado injustamente de ser o responsável pelas péssimas escolhas, mas os acusadores esquecem das tramóias que o levam  à opções erradas.

Na campanha, são todos bonzinhos, prometem casas populares, ruas calçadas, hospitais, escolas, creches, vias expressas, trânsito de primeira, atendimento direto do cidadão etc. Só não dizem que tudo isto tem um custo financeiro e de articulação política. Mas no final o cidadão-eleitor tem pouco acesso a fiscalização e termina perdendo o contato direto com o eleito.

Na atual estrutura política do País, especialmente na área parlamentar, poucos se lembram do último voto proporcional, qual o vereador ou deputado votado. Um parlamentar é votado em várias zonas eleitorais ou em distintos pontos do Estado. Um pinga-pinga de votos, no qual a maioria dos eleitos perde a ligação com seu eleitor.

Caso fosse feita uma reforma política que pudesse realmente levar esse nome e não apenas para prover o aumento do fundo eleitoral de financiamento público de campanha, a melhor opção seria o voto distrital.

Nesse sistema cada parlamentar é eleito individualmente por um distrito, área geográfica ou conjunto de bairros no caso de eleições municipais. O representante está bem próximo do eleitor e identificado com suas propostas. O que facilita a fiscalização e a pressão política diante do Poder Executivo.

Na Assembléia Constituinte de 1988, a adoção do voto distrital  foi derrotada na fase das subcomissões. O sistema proporcional em vigência levou à baixa representatividade parlamentar. É o que apontam pesquisas e manifestações públicas.

Por que não tentar um sistema novo? E ter a certeza que de que políticos e governantes estão nos escutando e realizando a obra política que se comprometeram na campanha. É isso.

*Integrante da Cooperativa de Jornalistas de Pernambuco

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