Gases podem alterar a saúde mental das mulheres e tratar a depressão pós-parto, diz estudo

Os pesquisadores encontraram correlações entre a composição bacteriana intestinal e os níveis desses hormônios esteroides, especialmente durante a gravidez

Estudo mostra que estes microorganismos podem influenciar especialmente a saúde das mulheres, inclusive em quadros de depressão pós-parto  – Foto: divulgação
Uma pesquisa recente publicada na revista científica Cell revelou uma possível relação entre as bactérias intestinais e a saúde humana.

O estudo mostra que estes microorganismos podem influenciar especialmente a saúde das mulheres, inclusive em quadros de depressão pós-parto.

De acordo com a pesquisa, certas bactérias intestinais produzem gases que estimulam outras bactérias a converter glicocorticoides, um tipo de esteroide, em progestinas, hormônios envolvidos na gravidez.

O microbioma intestinal, uma comunidade complexa de microrganismos que vivem no nosso trato digestivo, tem sido cada vez mais reconhecido pelo seu papel significativo na saúde humana. Os hormônios esteroides, que são essenciais para vários processos fisiológicos — como metabolismo, resposta ao estresse, desenvolvimento sexual, reprodução e comportamento — podem ser modificados quimicamente pelas bactérias intestinais.

Os pesquisadores encontraram correlações entre a composição bacteriana intestinal e os níveis desses hormônios esteroides, especialmente durante a gravidez. No entanto, os mecanismos exatos pelos quais as bactérias intestinais modificam estes hormônios e o impacto resultante na saúde não foram bem compreendidos.

Para investigar o papel das bactérias intestinais na produção hormonal, os pesquisadores conduziram uma série de experimentos envolvendo modelos humanos e de camundongos. Eles se concentraram na conversão da tetrahidrodesoxicorticosterona (THDOC), um glicocorticoide encontrado na bile, em tetrahidroprogesteronas (THPs), que incluem hormônios como a alopregnanolona, usada para tratar a depressão pós-parto.

Os investigadores estabeleceram pela primeira vez que o microbioma intestinal desempenha um papel significativo na produção de THPs. Eles descobriram que as fezes de camundongos livres de germes continham níveis muito baixos de THPs, em comparação com aos animais livres de patógenos específicos.

Estes são de laboratório, completamente desprovidos de todos os microorganismos, incluindo bactérias, vírus, fungos e parasitas. Camundongos livres de patógenos, por outro lado, estão livres de patógenos específicos, mas não totalmente desprovidos de microorganismos. Ao contrário dos ratos livres de germes, os ratos livres de patógenos têm um microbioma normal.

A descoberta indica que as bactérias intestinais são essenciais para a conversão de THPs. Os investigadores também descobriram que o microbioma intestinal humano poderia realizar esta conversão, como evidenciado pela presença de THPs em amostras de fezes de seres humanos saudáveis.

Uma descoberta importante foi a identificação de duas espécies bacterianas, Gordonibacter pamelaeae e Eggerthella lenta, que foram capazes de converter THDOC em THPs. Descobriu-se que esta conversão depende fortemente da presença de gás hidrogênio (H2). O gás hidrogênio é produzido predominantemente por bactérias intestinais durante a fermentação de carboidratos não digeríveis.

O estudo mostrou que E. coli Nissle 1917 (EcN) produziu gás hidrogênio, que por sua vez promoveu a 21-desidroxilação de THDOC em THPs. Isto indica uma forma de metabolismo cooperativo onde as atividades metabólicas de uma espécie bacteriana facilitam a produção hormonal por outra.

É importante ressaltar que o estudo descobriu que os níveis de THPs eram significativamente mais elevados nas fezes de mulheres grávidas no terceiro trimestre em comparação com não grávidas. Isto sugere que a gravidez induz alterações no microbioma intestinal que aumentam a produção de THPs. O sequenciamento metagenômico revelou que as bactérias que abrigam o agrupamento genético responsável por essa conversão eram mais abundantes em mulheres grávidas, indicando uma mudança no microbioma que poderia influenciar os níveis hormonais durante a gravidez.

Os pesquisadores também realizaram transplantes de microbiota fecal de doadoras grávidas em camundongos livres de germes. Os ratos receptores exibiram níveis aumentados de THPs nas fezes, apoiando ainda mais o papel do microbioma na produção hormonal. Além disso, a co-colonização de camundongos livres de germes com E. lenta e Ec N resultou em produção significativa de THP, demonstrando que essas bactérias podem trabalhar juntas in vivo para produzir hormônios a partir de esteroides endógenos.

Olhando para o futuro, os investigadores disseram que estudos de longo prazo que rastreiam as alterações hormonais durante a gravidez e os períodos pós-parto são necessários para compreender melhor o papel do microbioma em condições como a depressão pós-parto.

O estudo, “As bactérias intestinais convertem glicocorticoides em progestágenos na presença de gás hidrogênio”, foi de autoria de Megan D. McCurry, Gabriel D. D’Agostino, Jasmine T. Walsh, Jordan E. Bisanz, Ines Zalosnik, Xueyang Dong, David J. Morris, Joshua R. Korzenik, Andrea G. Edlow, Emily P. Balskus, Peter J. Turnbaugh, Jun R. Huh e A. Sloan Devlin.

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