Justiça Federal ouvirá testemunhas de acusação durante a ditadura militar
Elaine Patricia Cruz
Na próxima semana a Justiça Federal em São Paulo vai realizar audiências para ouvir as testemunhas de acusação sobre o desaparecimento de Edgar de Aquino Duarte, ocorrido em 1973 durante a ditadura militar.
A ação penal proposta pelo Ministério Público Federal em 17 de outubro do ano passado, acusa o coronel reformado do Exército, Carlos Alberto Brilhante Ustra e os delegados de polícia, Alcides Singillo e Carlos Alberto Augusto pelo sequestro qualificado da vítima. Ustra comandou o Destacamento de Operações de Informações-Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) de São Paulo no período de 1970 a 1974.
Os advogados de defesa tentaram anular a denúncia do Ministério Público alegando inépcia, inexistência de provas, prescrição do crime, obediência hierárquica e ocorrência de anistia, mas em outubro deste ano a Justiça Federal rejeitou essas alegações e determinou prosseguimento da ação penal.
As audiências serão conduzidas pelo juiz titular da 9ª Vara Criminal, Hélio Egydio Nogueira. Na audiência serão ouvidos o advogado do desaparecido e sete ex-presos políticos que testemunharam o sequestro de Edgar Aquino Duarte inicialmente nas dependências do DOI-Codi e depois no Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS), ambos em São Paulo, entre 1971 e 1973. Segundo o Ministério Público, será a primeira vez que agentes da repressão política serão confrontados com testemunhas de um crime cometido durante a ditadura militar.
Na segunda-feira (09) a partir das 14h deverão ser ouvidas as testemunhas José Damião de Lima Trindade, Artur Machado Scavone e Pedro Rocha Filho. Na terça (10) outras três testemunhas de acusação deverão ser ouvidas: Ivan Seixas, Lenira Machado e César Augusto Teles. Já na quarta (11), Maria Amélia de Almeida Teles e Virgílio Egydio Lopes Enei deverão testemunhar sobre o desaparecimento de Duarte. Ainda não foram agendados os dias em que serão ouvidas as testemunhas de defesa que serão arroladas pelos advogados dos réus.
Duarte nasceu em Pernambuco, em 1941 e foi fuzileiro naval. Em 1964, logo após o golpe militar foi expulso das Forças Armadas, acusado de fazer oposição ao regime após participação na revolta dos marinheiros. Exilou-se no México e em Cuba e voltou ao país em 1968 passando a viver em São Paulo com o nome falso de Ivan Marques Lemos. Ele trabalhava como corretor da Bolsa de Valores quando foi preso pelos militares em junho de 1971 e desapareceu. Segundo o Ministério Público, Duarte ficou preso ilegalmente nas dependências do DOI-Codi e, depois, no Deops-SP até meados de 1973.
Quando foi preso ele havia deixado de ser militante. Mas era amigo de um colega da Marinha, José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, que tinha acabado de retornar de Cuba e com quem passou a dividir um apartamento no centro de São Paulo. A suspeita do Ministério Público é que Duarte tenha sido sequestrado porque conhecia a verdadeira identidade de Cabo Anselmo, que passara a atuar como informante dos órgãos de repressão.
Durante as investigações os procuradores encontraram documentos do 2º Exército que atestavam que Edgar de Aquino Duarte foi preso, que não pertencia a nenhuma organização política e que atuava como corretor de valores.
A tese usada pelo Ministério Público Federal é de que Duarte foi sequestrado e se encontra desaparecido, crime que, portanto, não estaria prescrito e não se encontra sob a Lei de Anistia. A ideia é que, enquanto não se souber o paradeiro da vítima e o corpo não for encontrado, o crime de sequestro perdura. A Lei de Anistia não se aplicaria ao caso porque os crimes continuaram a ser cometidos após a lei ter sido editada, em 1979.