Município terceiriza saúde pública há 16 anos
O Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul (MPF/MS) recomendou à Prefeitura e à Câmara Municipal de Aparecida do Taboado que regularizem o funcionamento do Hospital Municipal Nossa Senhora Aparecida, atualmente administrado pela entidade privada Santa Casa de Misericórdia. A prestação dos serviços públicos de saúde devem ser retomados pela administração municipal, devendo realizar licitações, concursos públicos e prestação de contas.
O MPF descobriu que o município, a 443 km da capital, terceiriza integralmente, desde 1997, os serviços de saúde do único hospital municipal. A lei determina que a intervenção privada deve ocorrer apenas de forma complementar ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Auditoria realizada pela Coordenadoria Estadual de Controle, Avaliação e Auditoria (CECAA) constatou que a Santa Casa ocupa o prédio do hospital municipal, recebe e gerencia as verbas federais repassadas à prefeitura e ainda prestava atendimento médico particular e por meio de convênios. A investigação descobriu que a Santa Casa estava irregular no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e, portanto, inabilitada para receber verbas públicas. Para que ela pudesse receber os recursos federais, a prefeitura editou uma lei – inconstitucional – que permite o repasse.
Recursos públicos, contratações privadas – A auditoria constatou que associados da Santa Casa exerciam funções de direção no SUS, o que é ilegal. Além disso, mesmo recebendo verbas públicas, a Santa Casa não realiza concurso ou licitação quando precisa contratar pessoal ou adquirir materiais, obrigação de instituições que recebem dinheiro público.
De acordo com as investigações, a situação começou nas administrações anteriores – que também estão sendo investigadas – e continua com a atual gestão municipal. A lei que autoriza a cessão do hospital municipal para a Santa Casa foi aprovada em 1997. Desde então, a gestão da entidade municipal e o recebimento de verbas públicas estão sob a administração da Santa Casa.
Outras leis aprovadas cedem bens móveis, imóveis, equipamentos e servidores do hospital municipal para a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia. A Lei municipal n° 726, inclusive, dispõe sobre a concessão e permissão da prestação de serviços públicos de competência do município. Já a Lei n° 742 autorizou transferências de recursos financeiros do SUS para a Santa Casa, até que o hospital estivesse cadastrado no Sistema Único e tivesse condições de receber diretamente as verbas públicas. Para o MPF, ao aprovar essas e outras leis, o município atuou em desacordo com os preceitos constitucionais e leis federais que regem o tema.
A Lei federal n° 8.080/90, que trata da participação complementar de serviços oferecidos pela entidade privada, estabelece que é dever do município gerar e executar serviços públicos de saúde, podendo recorrer à iniciativa privada apenas em caráter complementar aos serviços prestados pelo SUS e quando os atendimentos da rede pública forem insuficientes para cumprir a demanda. O MPF alerta que o que ocorre é justamente o contrário, pois, neste caso, o poder público está repassando a administração de um hospital público para uma entidade privada.
Recomendação – A recomendação é uma forma extrajudicial de atuação do MPF e não tem valor de ordem judicial, mas deve ser observada para evitar ação judicial. É um recurso usual para melhoria de serviços públicos ou de relevância pública bem como para fazer respeitar os direitos coletivos. A Prefeitura e a Câmara Municipal de Aparecida do Taboado têm o prazo de 15 dias, a contar do recebimento, para encaminhar resposta com relação às solicitações do MPF.