Na cama com os romanos: como o sexo mudou a história da Roma antiga
Paul Chrystal
O sexo teve uma importância política e histórica extraordinária na Roma antiga desde a sua fundação em 753 a.C., segundo o historiador romado Tito Livio Patavino, lembrado como Livio.
Desde o princípio, o sexo esteve vinculado a alguns dos principais acontecimentos romanos. A violência sexual contra mulheres sabinas, no ano de 740 a.C. foi uma estratégia cuidadosamente executada na construção nacional. Para repor a “escassa” população de mulheres férteis, os romanos raptaram as esposas e filhas dos povos sabinos, num episódio que ficou conhecido como o Rapto das Sabinas.
Pouco depois, o sexo teve papel importante no fim da monarquia e na fundação da república e, depois, na restauração dessa república tão fundamental para a democracia romana.
Lucrécia e Virgínia
O suicídio da virtuosa Lucrécia em 510 a.C., após ser estuprada por Sexto Tarquínio, significaria o fim da monarquia romana.
A morte dela provocou uma rebelião que faria de Tarquínio o último rei de Roma. O destino da legendária nobre romana teve um papel-chave na transição do Reino Romano para a República Romana.
Depois, em 449 a.C., o sexo também esteve presente na defesa da república, quando os governantes começaram a se comportar como monarcas. No contexto da luta entre patrícios e plebeus, foi criada uma instituição chamada decenvirato, composta por 10 homens cuja missão era regular as relações entre os cidadãos.
O primeiro decenvirato era controlado por patrícios, e os romanos estavam descontentes com a corrupção e os abusos cometidos por eles – e pelo fato de não convocarem eleições.
Na época, Ápio Claudio Crasso, que presidia o primeiro decenvirato, ficou obcecado com uma bela plebeia chamada Virginia, filha de Lúcio Virgínio, um respeitado centurião romano (sexto na cadeia militar romana no comando de uma legião). Mas Virgínia estava comprometida com Lúcio Icílio, um antigo tribuno da plebe.
Quando o patrício Crasso usou seu poder para ficar com a moça, o pai a assassinou para evitar que fosse estuprada. O que se seguiu foi uma revolta que derrubou o decenvirato e restaurou os valores da república.
O puritanismo
O puritanismo, ou preservação da “virtude sexual”, era um conceito central da ética sexual dos antigos romanos. Foi o que custou a vida de Lucrécia e Virgínia, que se tornaram lendas que serviram de exemplo de comportamento para as mulheres romanas.
Uma vez casadas, as mulheres daquela época e região não deviam esperar nenhum prazer do ato sexual, pois seu papel era simplesmente procriar. Além disso, as mulheres precisavam aceitar a infidelidade dos maridos. No caso dos homens, trair era uma prova de virilidade e destreza sexual.
Solteiros ou casados, eles tinham liberdade para fazer sexo com prostitutas, dançarinas e até com outros homens, com a condição crucial de que eles penetrassem o outro, e não o contrário. Os homens que se deixavam penetrar eram considerados deficientes em virilidade e virtude. Poderiam ser denunciados e vilipendiados como afeminados.
Valores familiares
Nos últimos tempos da república romana, no entanto, o sexo fora do casamento passou a ser questionado socialmente.
Augusto, como primeiro líder do Império Romano, tentou restabelecer “valores familiares” por meio de leis.
No entanto, as intenções dele foram ofuscadas pelo comportamento de sua única filha biológica, Júlia, que, segundo diziam, fez sexo até no púlpito de onde Augusto apresentou sua legislação moralista.
O imperador a exilou em Pandataria (hoje ilha Ventotene, na Itália), uma remota ilha, naquela época, livre de homens, em frente à costa da Campania.
O marido de Júlia, seu meio-irmão Tibério, que sucedeu Augusto como imperador, seguia a moda do travestismo popularizada por Júlio César, que, anos antes, quando tinha 20 anos, viveu como mulher na corte do rei Nicomedes IV.
O imperador Tibério se vestia de mulher durante suas desenfreadas celebrações em Capri, enquanto seu sucessor, Calígula, às vezes aparecia em banquetes fantasiado de deusa Vênus.
Já o imperador Nero, atormentado por ter matado sua esposa grávida Poppaea Sabina, quis substituí-la por alguém que se parecesse com ela e encontrou Sporus, um jovem escravo a quem mandou castrar antes da boda.
Nero, que teria tido uma relação incestuosa com a mãe, Agripina, a Jovem, também protagonizou os notórios banquetes de Tigelino: envolto em pele de animais selvagens, ele era liberado de uma jaula para “mutilar” com a boca as genitálias de homens e mulheres presos a uma estaca.
A rainha das prostitutas imperiais
Dizia-se que Messalina, imperatriz de Cláudio, escapava discretamente da cama do marido enquanto ele dormia para visitar um fétido bordel, o que lhe rendeu o título de “rainha das prostitutas imperiais”.
O autor romano Plínio diz que, em uma orgia épica, Messalina desafiou uma prostituta veterana a uma maratona sexual de 24 horas. A imperatriz ganhou o desafio após 25 homens.
O sexo também ocupou lugar de destaque na curta “vida indescritivelmente repugnante” do imperador Heliogábalo (AD c 203-222).
De acordo com a História Augusta, uma coleção de biografias de imperadores romanos, de Adriano a Numeriano: “Com cada orifício de seu corpo tomado de luxúria, ele enviou agentes em busca de homens com pênis grandes para satisfazer suas paixões. (…) O tamanho do órgão de um homem determinava o cargo que ele ocupava na administração.”
De acordo com essa coleção de livros, Heliogábalo ofereceu uma fortuna a qualquer médico que pudesse dar a ele genitais femininos permanentes. O comportamento dele provocou reação da Guarda Pretoriana e do Senado romano. E, em um complô tramado por sua avó, Heliogábalo foi assassinado quando tinha apenas 18 anos.
Em 525 d.C, o sexo continuava a ser um aspecto importante da vida romana. A imperatriz Teodora era 20 anos mais jovem que seu marido, Justiniano I. Ela havia trabalhado num bordel de Constantinopla antes do casamento, onde era protagonista de teatro burlesco obsceno. Em uma das peças, Teodora convidava os demais atores a fazerem sexo com ela no palco.
Quando assumiu o posto de imperatriz, ela empreendeu uma série de reformas sociais para proteger as mulheres de abusos físicos, sexuais e de discriminação.
*Paul Chrystal é autor de “Na cama com romanos”, publicado pela editora Amberley