“Na prática, a decisão do STF sobre maconha não vai mudar muita coisa”, diz Pedro Serrano

Jurista destacou em entrevista que a decisão do Supremo mantém a arbitrariedade policial na aplicação da lei.

Pedro Serrano e maconha
Pedro Serrano e maconha (Foto: Felipe Gonçalves / Brasil 247 I Divulgação)
O jurista Pedro Serrano fez críticas, em entrevista à TV 247, à recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) descriminalizando o porte de maconha para uso pessoal. O analista descreveu a decisão como insuficiente e comparou o resultado a “uma montanha que pariu um rato”, uma vez que o Congresso Nacional analisa uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) proibindo o porte de qualquer quantidade de drogas.

“Eu acho que a montanha pariu um rato. Esse debate entre Supremo e Senado acabou virando algo como a frase de Shakespeare: ‘cheio de som e de fúria, que nada significa’. Por que eu falo isso? Porque infelizmente no final a decisão do STF na prática não vai mudar muita coisa do que está posto aí. Num primeiro momento, considerou ilícito administrativo e eu já vi com antipatia, porque eu acho que hoje você reconhece que as pessoas têm direito a fazer com o corpo delas o que elas querem, desde que não interfiram significativamente na vida de terceiros, senão não temos liberdade no país”, disse.

Serrano também apontou que a falta de uma definição clara entre tráfico e porte mantém a subjetividade na aplicação da lei, o que prejudica principalmente a população negra e pobre. “O pior é o artigo cinco da decisão, porque o grande avanço que poderia sobrar para essa decisão do Supremo era estabelecer claramente a diferença entre tráfico e porte claramente. Então, por exemplo, quando estipula 40g, abaixo de 40 gramas é porte para uso, acabou. Eu tenho que ter claro se a conduta que eu adotei é crime ou não na hora que eu a adoto. E aí é arcar com as consequências disso. Agora, do jeito que foi feito mantém o problema da legislação de hoje, que a autoridade policial e o juiz definem se é tráfico ou não, porque do jeito que eles construíram o item cinco da decisão, o delegado vai julgar face às circunstâncias se as tais 40g caracterizam o tráfico ou não”.

Para Serrano, a arbitrariedade policial permite que autoridades mantenham práticas discriminatórias:

“Ou seja, é uma presunção relativa de que é uso as 40g, e uma presunção relativa não é uma presunção absoluta, então o delegado vai poder dizer: ‘não, mas calma aí, tudo bem ele tá portando dois cigarros de maconha, mas ele tem uma balança aqui, ou ele tá numa atitude suspeita de que queria comercializar o segundo cigarrinho de maconha, e é preto’. Eles argumentam isso, então, para os pretos e pobres vai continuar havendo essa esfera de subjetivismo de autoridades do sistema em vez de ter uma regra anterior que defina qual comportamento é crime e qual não”.

A decisão do STF, finalizada em 26 de junho de 2024, fixou critérios para diferenciar uso e tráfico de maconha, estabelecendo um limite de 40 gramas para presunção de uso pessoal. No entanto, a quantidade é um critério relativo, permitindo que autoridades considerem outros fatores para determinar tráfico, como a presença de balanças e anotações de venda.

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