Familiares da vítima esperam por julgamento durante cinco anos. Crédito: Marina Silva/ CORREIO
O Tribunal do Júri de Salvador absolveu o policial militar acusado pelo assassinato da menina Geovanna Nogueira da Paixão, de 11 anos, morta a tiros no bairro do Jardim Santo Inácio, em 2018, após uma ação policial na localidade. Nildson Jorge Sousa França foi a júri popular na manhã da última segunda-feira (21), no Fórum Ruy Barbosa.
Segundo Daniel Keller, advogado de defesa de Nildson Jorge, a decisão do júri foi baseada na falta de provas de que o tiro que acertou Geovanna tenha partido da arma do policial militar. Para o advogado, houve falhas no isolamento do local do crime e na realização da perícia. O julgamento durou quatro horas.
“A Polícia Civil que deveria ter investigado esse caso da forma correta, não fez. Existe no processo apenas um laudo que atesta que existiam vários projéteis de arma de fogo no local do crime e não se consegue determinar, através da perícia, qual foi o projétil que acertou a vítima […] É impossível determinar qual foi a arma do crime”, avaliou Daniel.
Após cinco anos aguardando uma resposta, o sentimento que fica para a mãe de Geovanna, a trabalhadora de serviços gerais Maria Ângela, é de tristeza. Segundo a advogada de acusação que representou a família da vítima, Lorena Pacheco, do Instituto Odara, Maria Ângela é uma mulher de muita fé, mas não conseguiu esconder a decepção pelo resultado do júri.
“Ela [mãe da vítima] se conforma através do apego religioso, do que diz ser a justiça divina. Maria disse que voltaria para casa e continuaria as orações. Mas, obviamente, é um sentimento de tristeza por não haver uma responsabilização pela morte da filha dela. É como se a vida tivesse se perdido e o Estado não tivesse conseguido responsabilizar ninguém”, contou Lorena.
Abalada, Maria Ângela preferiu não conversar com a imprensa após a absolvição do policial militar. Antes do julgamento, porém, ela conversou com o CORREIO, contou que ainda carrega as marcas da tragédia e deseja apenas justiça. Mãe de outros dois filhos, precisou mudar de casa porque o irmão mais novo de Geovanna, na época com 5 anos, ficou traumatizado.
“Não é vingança e, sim, justiça pelo sangue da minha filha que foi derramado. O sonho dela foi frustrado. Ela fazia aula de violino e já estava para ir para Neojiba… [tudo] foi frustrado em cinco minutos”, lamentou Maria Ângela.
Ato de esperança
De acordo com Lorena, advogada da família, Maria Ângela guardou uma cápsula de bala encontrada dentro de casa, dois dias após o crime, durante os últimos cinco anos, na esperança de apresentar como prova no momento em que fosse chamada em juízo. No entanto, o objeto foi desconsiderado por não ter sido apresentado antes.
“A família não tem um conhecimento técnico, jurídico, ela guardou essa cápsula até o momento de ser chamada em juízo, porque achou que se apresentasse antes [o material] seria descredibilizado”, disse Lorena, antes de contar a avaliação do tribunal. “Disseram que poderia ser uma prova duvidosa […] para ela conseguir o resultado que almejava”, contou a advogada.
Ainda segundo Lorena, a perícia apontou que, das três cápsulas de bala encontradas no local do crime, duas partiram da arma do policial Nildson Jorge. A decisão ainda pode ser recorrida no prazo de cinco dias. No entanto, o recurso precisa do aval do Ministério Público da Bahia (MP-Ba). A reportagem entrou em contato com o órgão para saber qual a avaliação sobre a aplicação do recurso, mas até a publicação desta matéria não houve retorno.
Único acusado
Além de Nildson Jorge, o policial militar Emerson Camilo Sales Pereira também estava sendo investigado pelo assassinato de Geovanna. No entanto, apenas Nildson Jorge foi levado a julgamento, porque entende-se, até o momento, que ele estava apenas dirigindo o carro.
Também não foram encontrados indícios de que as balas encontradas no local do crime tenham partido da arma que ele portava. Ainda assim, os dois policiais militares foram afastados das suas funções na época e ainda seguem assim.
Relembre o caso
Geovanna foi assassinada na porta de casa, no dia 24 de janeiro de 2018, durante uma operação da PM no bairro do Jardim Santo Inácio, onde ela morava. Na ocasião, a menina estava abrindo o portão de casa para receber o avô, quando foi atingida com um tiro na cabeça após disparos de agentes da 48ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM).
Geovanna chegou a ser socorrida, mas não resistiu aos ferimentos. A cena trágica foi assistida pelo irmão mais novo dela, com 5 anos. Na época, a Polícia Militar (PM-Ba) emitiu uma nota dizendo que os policiais militares envolvidos no assassinato buscavam informações sobre a fuga de autores de homicídios na região da Mata Escura e que houve troca de tiros. Versão contestada pela família da vítima.
Diante da lentidão nas investigações do crime, a família resolveu entrar com uma ação contra o estado. O pedido foi de uma indenização civil pelo assassinato da garota por policiais militares.
O processo pede indenização por danos morais de 500 salários mínimos (R$ 477 mil na cotação de 2018; R$660 mil na cotação atual), fora o ressarcimento de despesas funerárias e a pensão mensal de dois terços do salário mínimo a partir da data em que a garota completaria 14 anos. A reportagem questionou a advogada da família sobre o resultado do processo, mas não houve resposta até o fechamento desta matéria.