Naufrágio do Titanic: busca por telégrafo abre batalha judicial sobre descanso dos mortos
Um século após seu naufrágio, o Titanic continua no centro das atenções.
Dessa vez, há uma batalha judicial em curso que divide aqueles que querem recuperar o telégrafo do navio e aqueles que preferem que tudo o que está no fundo do oceano seja deixado em paz de vez.
Este artefato é considerado chave na tragédia — mas para resgatá-lo seria necessário fazer buscas em uma área embaixo d’água onde ainda pode haver restos humanos das 1.500 pessoas que naufragaram com o transatlântico.
A polêmica surgiu desde que uma empresa americana, que já removeu diversos itens do transatlântico no fundo do oceano, anunciou novos planos.
A RMS Titanic Inc quer resgatar o telégrafo sem fio Marconi que emitiu sinais de socorro na noite do naufrágio, em 15 de abril de 1912. Esses chamados salvaram as vidas de cerca de 700 pessoas que conseguiram escapar em barcos salva-vidas.
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A expedição aconteceria no meio de 2021 e usaria um robô subaquático.
No entanto, o governo dos Estados Unidos se opõe a esses planos, alegando que tal operação violaria a lei federal e não respeitaria um acordo internacional, envolvendo também o Reino Unido, que reconhece o navio naufragado como um memorial aos mortos.
Originalmente, a Justiça do Estado da Virginia autorizou a expedição, dizendo que a recuperação do telégrafo “contribuiria para o legado deixado pela perda incalculável do Titanic, daqueles que sobreviveram e daqueles que deram suas vidas”.
Um consultor em salvamentos acrescentou ser improvável que corpos humanos permaneçam nos destroços.
Mas a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos, que representa o interesse público no caso, diz que a expedição corre o risco de perturbar restos humanos que poderiam estar dentro do casco do Titanic.
“Os espaços internos do casco, principalmente a seção de proa intacta, mesmo que inundados durante o processo de afundamento podem não ficar expostos ao ambiente externo atual”, afirma.
“Esses tipos de ambientes isolados criam uma condição na qual pressão constante, baixas temperaturas, nenhum fluxo e níveis de água anóxicos (onde o oxigênio dissolvido é esgotado) são conhecidos por preservar a matéria orgânica por séculos.”
Em código Morse: ‘Venham já’
O Titanic saiu de Southampton, na Inglaterra, para Nova York, nos Estados Unidos. Na noite de 14 de abril de 1912, às 23h40, o navio bateu contra um iceberg. O transatlântico começou a inundar com milhares de toneladas de água congelante.
Thomas Andrews, que estava a bordo, foi quem projetou o navio. Depois de inspecionar os danos causados pela colisão, ele confirmou ao capitão que eles iam afundar.
Às 00h15 de 15 de abril, o sistema Marconi começou a emitir sinais de socorro, ativando sem fios uma rede inteira de operadores de navios e estações em terra que se comunicavam freneticamente.
Eles usaram o código Morse, um sistema de comunicação telegráfica que forma palavras, números e outros símbolos por meio de pontos, linhas e espaços.
“Venham já. Nos chocamos contra um um iceberg”, avisou o operador de comunicações do Titanic, Jack Phillips, a outro navio, o Carpathia.
“Nós batemos em um iceberg e afundamos na proa”, escreveu a tripulação do Titanic ao Frankfurt, um navio alemão.
Jack Phillips transmitiu ainda mais informes.
“Estamos enviando passageiros em botes pequenos. Mulheres e crianças em botes. Não podem aguentar muito mais. Perdendo energia.”
Outro deles dizia: “Aqui é o Titanic… sala de máquinas inundadas”.
Os operadores continuaram com a troca de mensagens quando os botes começaram a sair e os homens se despediram de suas esposas e filhos.
Jack Phillips não sobreviveu ao desastre. Ele permaneceu em seu posto mesmo depois que o capitão o liberou do serviço. Por isso, seu heroísmo já foi diversas vezes exaltado em narrações sobre a tragédia.
As mensagens do Titanic causaram consternação e confusão em outras embarcações.
Às 2h10, a energia caiu e o sistema de comunicação foi desligado. A proa estava totalmente submersa e a popa, inclinada.
Por volta das 2h20, o navio se dividiu em dois e as duas metades começaram a descer até o fundo do Oceano Atlântico.
Menos de duas horas após o naufrágio, o Carpathia chegou à área e resgatou 700 sobreviventes que conseguiram escapar em botes salva-vidas — e que só tinham capacidade para metade das pessoas a bordo.
‘Cemitério’
Restos mortais começaram a ser encontrados em 1985 a cerca de 740 quilômetros de Newfoundland, no Canadá.
As duas metades do navio estão 4.000 metros abaixo do nível do mar, no local exato onde afundaram há um século.
Desde 1987, a RMS Titanic já recuperou mais de 5.500 artefatos, incluindo prataria, porcelana e moedas de ouro. Além disso, a empresa comandou oito expedições de pesquisa. Uma destas, recente, constatou que alguns dos artefatos embaixo d’água estão se deteriorando rapidamente.
Advertindo que o tempo está correndo, Bretton Hunchack, presidente do RMS Titanic Inc, defendeu que o novo projeto da sua empresa pode “recuperar um pedaço incrível da história”.
“Embora muitos objetos do Titanic tenham a capacidade de deslumbrar gerações sobre a vida de seus passageiros, apenas um artefato contém a história dos sobreviventes”, disse Hunchack.
“O sistema Marconi é um herói esquecido, responsável por inúmeras gerações de famílias que só existem hoje porque a comunicação veio em seu auxílio em nome de seus antepassados”.