O crime de Lula: ter sido eleito presidente pelo PT
Por: Ribamar Fonseca
Sob os olhares complacentes do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, o juiz Sergio Moro continua desrespeitando as leis e abusando da sua autoridade em sua cruzada para levar o ex-presidente Lula à prisão. Depois de considerar-se competente para julgar o líder petista, baseado em hipóteses, o magistrado evidencia mais uma vez a sua parcialidade ao negar à defesa do ex-presidente operário o acesso aos autos do inquérito sobre o tríplex do Guarujá, conforme denunciado pelos próprios advogados. Segundo eles, em nota divulgada quinta-feira, Moro despachou duas vezes para negar o acesso ao inquérito, primeiro dizendo que já havia enviado os autos aos advogados, uma mentira, e, depois, reconhecendo a informação falsa, voltou atrás e alegou que havia diligências em andamento. Com essa atitude, segundo os advogados, ele violou o artigo 7º, inciso XIV e § 11, da Lei 8906/1994, e a Súmula Vinculante nº 14, do STF. Onde está a sempre zelosa OAB quando defende a constitucionalidade do golpe? Se a finalidade da OAB não é zelar pelo respeito às leis e ao exercício da advocacia, para que ela serve mesmo?
Desde que virou celebridade, por obra e graça da mídia golpista, o juiz Sergio Moro se tornou o homem mais poderoso do país, ignorando até mesmo o Supremo Tribunal Federal que, talvez por temer a imprensa, deixa-o à vontade para fazer o que bem entende. O magistrado de Curitiba, o único de primeira instância que tem jurisdição sobre todo o território nacional, além de responsável pelo desemprego de milhares de trabalhadores da indústria da construção civil, da indústria naval e da Petrobrás, também se dedica a perseguir Lula, cumprindo o seu papel no projeto para eliminá-lo do cenário político e impedir a sua volta ao Palácio do Planalto. Como os órgãos superiores do Judiciário não tomam nenhuma providência para conter esses abusos, o ex-presidente foi obrigado a recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU em busca de justiça. E, por isso, as perseguições se intensificaram, inclusive na órbita do Supremo, onde o ministro Teori Zavascki autorizou a abertura de inquérito contra ele e a presidenta Dilma Rousseff por uma suposta tentativa de obstrução da justiça.
Na verdade, a Justiça no Brasil parece ter perdido o rumo e, por via de consequência, a confiança do povo. Depois de eliminar a presunção de inocência e adotar a teoria do domínio do fato como prova para condenações, além de estabelecer a prisão para os condenados em segunda instância, o Judiciário também aceita o subjetivismo como base para processar alguém. E os acusados ficam sem argumentos para se defender porque tudo depende da interpretação dos juízes, que varia de acordo com o seu humor e a sua preferência política. Antes as pessoas eram inocentes até prova em contrário, cabendo aos acusadores o ônus da prova. Hoje mudou tudo e as pessoas são culpadas até provarem a sua inocência. E tem ainda a nova figura do delator, cuja palavra, mesmo sendo réu confesso, tem crédito suficiente para colocar na prisão seus desafetos. Depois vai para casa, sem devolver os milhões roubados, para desfrutar o prêmio da delação. Assim está funcionado a nova justiça.
Ainda recentemente a Justiça de São Paulo considerou culpado o fotógrafo Sergio Andrade da Silva, que ficou cego de um olho, ao ser atingido por uma bala de borracha, disparada pela policia, quando cobria uma manifestação. “O fotógrafo que, ao cobrir uma manifestação, se coloca entre manifestantes e policiais assume o risco de ser alvejado no caso de confronto”. Com essa justificativa o juiz Olavo Zampol Junior, da 10ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, negou ao fotógrafo o pedido de indenização. Ele pedia R$ 1,2 milhão de indenização do Estado pelos danos moral, estético e material, além de uma pensão mensal de R$ 2,3 mil e R$ 316 para custeios médicos. Antes dele, outro fotógrafo, Alexandre Silveira, também atingido no olho por uma bala de borracha durante uma manifestação, igualmente teve negado o seu pedido de indenização pela justiça paulista. Essa, infelizmente, é a Justiça do Brasil nos dias de hoje, onde a deusa Temis, com vergonha, a qualquer momento poderá trocar a venda nos olhos por um saco na cabeça.
Com esse raciocínio não haverá mais inocentes. Todos serão culpados se vítimas de algum assalto ou acidente na rua. A justificativa seria sempre a mesma: “Estava na rua. Se estivesse em casa não teria acontecido”. As vítimas de bala perdida nas favelas também serão sempre culpadas: “Se não morassem na favela não teriam sido atingidas”. Talvez essa nova ótica da Justiça explique a perseguição a Lula: se não fosse do PT não haveria problema. Se fosse, por exemplo, do PSDB poderia ter comprado votos para a aprovação da emenda da reeleição, poderia ter construído com recursos públicos um aeroporto em terreno da família, poderia constar da lista de Furnas, poderia ter fazenda e apartamentos em Nova York e Paris, poderia até ter um sitio em Atibaia e um apartamento tríplex no Guarujá que não teria nenhum problema. O seu crime foi ter sido eleito Presidente da República pelo PT. E, mais grave ainda, ter a preferência do povo, segundo as pesquisas, para voltar ao Palácio do Planalto. Esses crimes, portanto, devem ser punidos com a prisão. Fosse tucano e estaria voando livre, leve e solto, sem ser incomodado por ninguém.