Edgar Moury Fernandes Neto*
O X está fora do ar.
Por decisão do Ministro Alexandre de Moraes, o Brasil e os brasileiros estão isolados do mundo civilizado e democrático, na infeliz companhia de países controlados por ditaduras, como China, Rússia e Coreia do Norte.
A suspensão se deu por ter o X fechado o seu escritório no Brasil, ao argumento de que a lei conteria exigência de necessária representação no País, pelo fato de ser estrangeira.
Mesmo esse argumento é discutível, pois, ser acessível no Brasil, como diversos canais de televisão, rádios, sites de apostas, etc., não faz, necessariamente, do X uma empresa que aqui exerceria, jurídica e fisicamente, as suas atividades. Mas esse não é o principal problema da decisão.
A verdade é que, do “piso ao teto”, o ato monocrático do Ministro é indefensável, a saber:
– O STF não é delegacia de polícia, por isso não tem competência para investigar quem quer que seja, muito menos pessoas que não têm prerrogativa de foro;
– O Ministro Alexandre foi “indicado”pelo então presidente do STF, Ministro Dias Toffoli, para relatar o procedimento ao qual está vinculado o inquérito em que contida essa decisão. Isso violou – e viola – o princípio do juiz natural, que impõe a distribuição aleatória dos processos e procedimentos, sendo vedada a escolha dirigida de um determinado magistrado;
– A decisão ultrapassa os limites subjetivos da lide, na medida em que impõe, a todos os brasileiros, indistintamente, a proibição de acessar o X, mesmo por VPN, sob pena de multa diária, de cinquenta mil reais;
– Pelas suas drásticas consequências, a decisão jamais poderia ter sido proferida isoladamente e, ainda que pudesse, nunca deveria produzir efeitos antes que apreciada pelos demais integrantes da Corte e de seu trânsito em julgado.
Pelas razões acima, é fácil perceber que a decisão jamais poderia gerar efeitos válidos, mas, na prática, está causando irreparáveis e pesados prejuízos à autonomia individual, à liberdade de expressão, à livre circulação das ideias, ao direito à informação, ao sistema de justiça, ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório e ao próprio STF, que não existe para isso.
Mas não é só!
A decisão afeta, também, a segurança jurídica, a credibilidade, a imagem e a confiabilidade do Brasil, bem assim a liberdade econômica, o direito ao trabalho e os interesses comerciais de pessoas naturais e de empresas, que tinham na plataforma o seu espaço e instrumento profissional.
As justificativas do Ministro não se sustentam.
Para entender isso, não precisa ser jurista, basta ter bom senso.
É inaceitável que se queira retaliar o X porque a empresa fechou o seu escritório no país, ante a ameaça de prisão a seus funcionários, e a imposição de multas, por força de decisões nulas, e de motivação discutível, como acima demonstrado, cuja intimação se fez através da própria plataforma, a pessoas que vivem e estão fora do Brasil, e, que, por isso, deveriam ser comunicadas por carta rogatória, em respeito aos limites da jurisdição brasileira e à soberania nacional alheia.
Diante disso, o que deveria fazer a empresa? Sucumbir a decisões nulas? Derrubar perfis e violar, ela mesma, a liberdade de expressão, a autonomia individual, a livre circulação de ideias, o direito à informação, dentre outros bens jurídicos e econômicos acima destacados? Deixar os seus funcionários à mercê de prisões e de outras ordens ilegais?
Apesar de sua gritante nulidade e exorbitância, o ato (como os que o antecederam) teve a aprovação do Procurador Geral da República, o apoio do Chefe do Poder Executivo, do Presidente do Senado, de parte dominante da classe política e, o que é pior, da grande imprensa (que parece ignorar que poderá ser a próxima), especialmente da Rede Globo (sem o suporte da maior empresa de comunicação do país, arrisco-me a dizer, nada disso estaria acontecendo), sem falar do “silêncio” ruidoso de tantos que a isso têm o dever de resistir.
É verdadeiramente espantoso, mas o Brasil não para de surpreender…
É que essa decisão é do mesmo tribunal que reconhece o tráfico de drogas como crime, mas que decidiu que o porte de certa quantidade de maconha pode se dar sem nenhum problema para o usuário.
Por que, então, mesmo entendendo, absurdamente, que acessar o X seria “ilegal” no país, o STF, na pessoa do Ministro Alexandre, está a estender, para quem o “consome”, a mesma pecha de ilegalidade imposta à plataforma?
Não seria o caso de “liberar” o “consumo” do X (como se fez com a maconha), mesmo sendo a “venda” da plataforma (como o é a comercialização de drogas) supostamente ilegal no país?
Por que o usuário não é penalizado por fumar maconha e o será por “consumir” o X?
Estivesse esse acontecimento retratado no livro “1984”, certamente, o “Ministério da Verdade” estabeleceria: “vocês podem fumar baseado, vocês podem fumar (e fazer) quase tudo”, só não podem pensar, falar e consumir a informação que quiserem e onde bem entenderem.
Eita tempo distópico…
*Sócio do GCTMA Advogados, Procurador do Estado de Pernambuco aposentado, Conselheiro de Administração/IBGC