Ocupação evita a degradação de prédios históricos
Anderson Sotero
“Se esse prédio histórico não estivesse ocupado, com certeza estaria degradado”, diz o presidente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), Eduardo Morais de Castro, enquanto caminha pela sede do estabelecimento, o primeiro imóvel a ser edificado em concreto armado no estado.
A frase dele pode servir para vários outros imóveis de Salvador, segundo urbanistas ouvidos por A TARDE. Eles dizem que o pior destino que se pode dar a um prédio antigo e histórico é deixá-lo desocupado.
Além do IGHB, os palácios Rio Branco e da Aclamação, ambos no Centro, a sede da Faculdade da Cidade do Salvador, no Comércio, são algumas das construções antigas, entre muitas outras, que, pelo uso, resistem.
O arquiteto e historiador Francisco Sena ressalta que não importa se a ocupação é pública ou privada. “O abandono é a primeira causa da destruição do imóvel. O pior de tudo é fechar as portas”, pontua. Na década de 70, ele participou de um inventário de proteção do acervo cultural da Bahia. “Naquela época, o slogan era ‘usar para preservar”, acrescenta.
Arquiteto e urbanista, Paulo Ormindo diz que até mesmo o “pior uso é melhor que o abandono”. “Se o imóvel é ocupado, as pessoas que nele vivem ou trabalham irão evitar que existam goteiras, que outros o saqueiem. Nosso patrimônio só chegou até nós porque havia pessoas dando um mínimo de conservação a esses imóveis”, pontua.
Mas a manutenção nem sempre é fácil e barata. Castro conta que o IGHB sofre atualmente com infiltração. Há 92 anos, a sede foi construída na Piedade para abrigar, especificamente, o instituto, que já existia desde 1894. A fachada e o imponente interior do imóvel com gigantescas colunas impressionam. “Só o prédio em si já é um patrimônio, mas a gente tem muita dificuldade com manutenção. Faltam recursos”, frisa.
Doença do amor
A secretária Cleide Nunes trabalha há 17 anos no IGHB e conta que há uma brincadeira entre os funcionários do local. “A gente diz que quem entra aqui pega a doença do amor pela instituição. Todo mundo afirma que é um dos institutos geográficos mais bonitos do Brasil. Caminhar por aqui é sentir que a gente está num local riquíssimo. É se sentir privilegiado”, destaca.
É desta forma que o diretor da Faculdade da Cidade, André Portnoi, também se sente ao entrar no imóvel que sedia a instituição privada desde 2003 e onde estudam três mil alunos: “Esse prédio é tombado pelo Iphan e tem mais de 200 anos. Funcionou por muito tempo como a poupança do Banco Econômico”.
O elevador do prédio destoa dos edifícios empresariais no Comércio e parece ter parado no tempo. O piso é feito, segundo Portnoi, de mármore Carrara. Em vez de porta, é uma grade de ferro que fecha o cubículo, com um barulho que assusta.
Lenda
No Palácio Rio Branco, nem o “risco” de tomar um susto afasta a coordenadora de Recursos Humanos da Secretaria de Cultura do Estado (Secult), Maria Enedina Brandão, do local construído cerca de 70 metros acima do nível do mar e onde funciona o órgão estadual. “Há uma lenda de que existe uma loira no palácio. Só que nunca vi. Acho que sou eu mesma”, brinca.
A história surgiu após a descoberta do afresco “As bacantes”. A imagem, que tem uma mulher no centro, estava recoberta com uma camada de tinta e foi encontrada durante a última reforma no edifício.
Brincadeira à parte, Enedina é uma entusiasta ao falar sobre a dia a dia no local, reerguido em 1919, após ter sido bombardeado durante a República Velha. “Trabalhar em um lugar com tanta importância histórica é fantástico. A gente tem que valorizar. Eu falo sempre para todo mundo aqui da importância deste palácio”, finaliza.
Fonte: A Tarde