Opinião: Lamento a uma mãe desalmada
Redação
O Poeta e músico juazeirense, Gilberto Maciel revela em seu texto a tristeza de vê a cidade perder o seu brilho ao longo dos últimos anos devido à falta de compromisso dos prefeitos. Neste texto, ele faz um profundo desabafo sobre a realidade dos fatos. Veja:
Por: Gilberto Maciel
Nobre conterrâneo.
Decidi escrever para você, porque tenho notado que ultimamente, estás perdendo o encantamento por nossa terra e pela política de Juazeiro. Assim sendo e, por conta de nossa amizade, é minha obrigação falar alguma coisa a respeito.
1. A exemplo de todos os lugares do mundo, Juazeiro (Bahia) é o reflexo das decisões e ações das pessoas que ocupam cargos de comando. Além disso, existe a questão da aura da cidade, que é o resultado das somas das auras (campo de energia que envolve um corpo humano) de seus habitantes. E a aura de Juazeiro não é boa, diferentemente de Petrolina.
2. Desde 1890, até os dias atuais, tivemos 29 prefeitos, em 36 mandatos. Alguns prefeitos foram bons e outros, péssimos. Muitos prefeitos ocuparam o cargo com nobreza, enquanto outros, nem tanto.
3. Segundo a história, a época dourada da política de Juazeiro, ocorreu entre 1890 e 1950. Durante esse período, a nossa cidade era desenvolvida, mercantil, elegante, aconchegante, progressista e acolhedora. Nesse mesmo espaço de tempo, Juazeiro era conhecida como a terra da riqueza, prosperidade, do luxo e dos bordeis (bregas).
4. Como Petrolina (PE) praticamente não existia até 1950, o patriarca da família Coelho, senhor Kelê, idealizou um projeto político, econômico e social (a longo prazo) para a sua cidade, capitaneado por sua família, o que resultou num sucesso absoluto, até os dias atuais e que durará ainda por muitos anos.
5. Desde que Juazeiro era apenas uma passagem, até os dias de hoje, ainda não nasceu ou apareceu, um iluminado ou visionário, a nível do senhor Kelê, de Petrolina. Se nasceu ou apareceu, deve ter sido levado por uma das enchentes do rio São Francisco.
6. Enquanto Juazeiro demolia a belíssima estação de trem (no início da Ponte Presidente Dutra) e o mercado municipal (onde anos depois funcionou o bar La Barca – próximo ao cais), Petrolina distribuía terrenos para a construção do 72BI, aeroporto, órgãos federais e estaduais, instalação de indústrias, empreendimentos privados, etc.
7. O desenvolvimento de Juazeiro, em grande parte foi impedido pela diocese, em razão de que, quase todas as terras da sede do município pertenciam (não sei se ainda pertencem) a Nossa Senhora das Grotas, a qual herdou de um latifundiário, que por sua vez, ganhou do Estado ou as tomou dos índios.
8. O edifício dos correios (que era majestoso para a época) só foi construído em Juazeiro porque foi um programa do governo federal, sem a interferência dos políticos locais. A mesma coisa aconteceu com a construção da ponte Eurico Gaspar Dutra.
9. Enquanto Petrolina criava e habitava os bairros KM² e Areia Branca (nessa época ficavam longe do centro), para expandir a cidade e dar morada digna a população, Juazeiro dava as costas para o bairro da Piranga.
10. Enquanto Petrolina fazia a avenida da integração para ampliar a circunferência da cidade, Juazeiro ficava bebendo cerveja, nos bares Primavera e Kisabor.
11. Dizem que nós juazeirenses temos síndrome de vira-lata em relação a Petrolina. Isso é mentira. O que temos é uma inveja muito grande, porque Petrolina sempre foi exemplo de organização, competência, trabalho, crescimento, oportunidade e progresso. Juazeiro é o contrário de tudo isso.
12. Até a natureza favorece Petrolina e deixa Juazeiro mais complexada. A topografia da cidade pernambucana faz com que as águas das chuvas corram do centro em direção ao rio São Francisco, evitando os alagamentos. Enquanto, a topografia de Juazeiro converge as águas das chuvas para o centro, sem possibilidade de escoamento, como já aconteceu inúmeras vezes e continua acontecendo.
13. As poucas coisas boas que aconteceram e esporadicamente ainda acontecem em Juazeiro, provém dos milagres de Nossa Senhora das Grotas, atendendo aos pedidos de um padre juazeirense chamado Gilberto Luna, feitos quando ele ainda estava vivo.
14. Creio que a 1ª eleição para prefeito de Juazeiro, através do voto popular, ocorreu depois da Resolução do TSE 3.532, de 4/08/1950. A partir desta data foram eleitos Edson Ribeiro, José Padilha, Alfredo Viana, Américo Tanuri, Joca de Souza Oliveira, Durval Barbosa, Arnaldo Vieira, Jorge Khouri, Joseph Bandeira, Misael Aguilar, Rivas Espínola, Isaac Carvalho, Marcus Paulo Alcântara Bomfim e Suzana Ramos, a primeira mulher a ocupar este cargo. Como se vê, apenas Isaac conseguiu reeleger-se.
15. Apesar da “Alternância de Poder” ser benéfica para a democracia, em Juazeiro, ela representa outras situações: ausência de um líder ou de um grupo político, desunião política, falta de um projeto político a longo prazo, descontinuidade administrativa (o que um prefeito fez de bom o outro desmancha) e eleitores descompromissados com o destino do município, etc.
16. A política em Juazeiro sempre foi diferente. Primeiro porque não existe uma família política tradicional. Segundo porque existem alguns políticos que se acham líderes, mas, não tem votos suficientes para se elegerem sozinhos. Terceiro porque os partidos opositores são desunidos. Quarto porque os bons políticos (os poucos que ainda existem) não querem se candidatar. Quinto porque grande parte dos eleitores mudam constantemente de lado, desde que os seus interesses sejam atendidos. Por último, é porque Juazeiro sempre esteve contra os governos estaduais e federal. Petrolina caminha sempre com o vento a seu favor.
17. A injustiça, falsidade, traição e a ingratidão na política em Juazeiro vêm de longe. Que os espíritos dos ex-prefeitos Aprígio Duarte Filho e Dr. José Inácio da Silva, se manifestem e falem de suas mágoas.
18. O que também não entendo é o desinteresse de meus conterrâneos pela história política de Juazeiro e consequentemente, a falta de ação em coisas importantes. Por exemplo: Alfredo Viana (homem honesto, justo, humano, elegante, cordial e simples) foi prefeito de Juazeiro em 4 (quatro) ocasiões e, mesmo assim (pelo que sei), não existe na cidade, nenhuma grande rua ou avenida em seu nome. Parece-me que o seu nome foi dado apenas a uma escola. Se não chega a ser uma injustiça, é no mínimo, uma ingratidão.
19. Além da falta de conhecimento de muitos conterrâneos, falta amor pela cidade, ousadia e coragem para enfrentar algumas situações. Eu soube recentemente que em 1993, o prefeito Misael Aguilar Silva Junior acertou com o prefeito Fernando Bezerra Coelho, que nos anos pares, a Fenagri seria realizada em Petrolina (PE) e nos anos impares, seria realizada em Juazeiro (BA). Pois bem, Petrolina não realizou a Fenagri em 2020, por conta da pandemia (Covid19), mas, se achou no direito de adiar e sediar a 28ª Edição, em 2021, sem consultar e sem dá a mínima para Juazeiro. Depois de muitos comentários negativos nas mídias sociais, o prefeito Miguel Coelho voltou atrás e decidiu adiar novamente a Fenagri para 2022, ano par, que de fato lhe era direito. No entanto, chegando próximo a data da realização da feira (que deveria ter sido realizada em novembro de 2022), o município de Petrolina adiou mais uma vez a 28ª edição da Fenagri e realizou a feira entre 9 e 12 de agosto de 2023 (ano ímpar), tomando a vez, a voz e o direito de Juazeiro, em realizar o seu evento. É mole?
20. Existe uma maldição em Juazeiro (acreditem quem quiser), que vem de longo tempo. Como consequência, surge a desunião, bloqueios de bons pensamentos, dias difíceis, desânimos e apatias coletivas. Essa maldição faz com que as “trevas” continuem agindo sobre Juazeiro, fazendo também, que fiquemos olhando apenas para os nossos umbigos ou comentando sobre o progresso de Petrolina.
21. Há anos, eu e alguns conterrâneos elaboramos um projeto turístico para Juazeiro, onde criamos 30 produtos turísticos para o município. Durante quatro anos, a cidade deveria receber a visita de 1 (um) milhão de turistas, regionais, nacionais e até internacionais. Para cada dólar investido pela prefeitura municipal, o retorno (em impostos) seria de 4 dólares americanos. O projeto não foi pra frente.
22. Numa época, durante a realização de um seminário de desenvolvimento social, apresentei uma ideia, para mudarmos a sede administrativa da prefeitura municipal para o distrito de Carnaíba (distante 21 quilômetros), deixando a parte antiga e atual, com a estrutura já existente. Nesse local, seria construído, um centro administrativo, duplicação da rodovia, novo terminal rodoviário, novo mercado do produtor, novo hospital, universidades, 10 mil casas para ser financiada por um banco federal, etc. Iriamos desafogar o trânsito e melhorar a qualidade de vida dos conterrâneos da Juazeiro antiga. Dentro de 50 anos, Carnaíba e a Juazeiro antiga estariam ligadas, se transformando numa grande cidade. Sinalizei quais seriam os ministérios envolvidos neste projeto e as fontes federais dos recursos. Também não foi pra frente.
23. Noutra época e, tomando por base que o turismo religioso é o mais atrativo e crescente, apresentei uma ideia com um projeto básico, para construírem uma estátua na ilha do fogo de 30 metros, iluminada. Numa só construção teríamos duas santas. De um lado, seria Nossa Senhora das Grotas (padroeira de Juazeiro) e do outro lado, seria Nossa Senhora Rainha dos Anjos, padroeira de Petrolina. Novamente informei quais os ministérios estariam envolvidos neste projeto e as fontes federais dos recursos. Há de se lembrar que na ponte Presidente Dutra, que liga as duas cidades, passam mais de 10 mil veículos por dia e que entre estes, pelo menos, mil, são caminhoneiros em trânsito, que levariam o nome de Juazeiro, pelo Brasil afora. Torceram o nariz e eu fiquei com cara de babaca.
24. Também apresentei um projeto para a construção de portais gigantes, nas quatro entradas do município de Juazeiro, com a instalação de 80 outdoors (estilo americano) nessas rodovias, sem nenhum custo para a cidade. Além de demarcar o município, passaríamos a ideia que Juazeiro era organizada e de povo feliz. Mais um projeto que não prosperou.
25. Mais recentemente, dei a ideia para a realização de um seminário, com o objetivo de tratarmos a respeito das muriçocas e acabar com elas, de uma vez por todas. Cheguei a contatar com a maior autoridade deste assunto, que se colocou a disposição para participar do encontro. Responderam-me que já existia muriçoca em Juazeiro há mais de 100 anos, que o povo já estava acostumado com elas e que nenhum prefeito tinha dado jeito. Fiquei sem ação pra responder.
26. Creio que a maior maldição de Juazeiro vem das mortes de alguns seguidores do beato Antônio Conselheiro, que vieram a nossa cidade apenas para receber madeiras que tinham sido compradas há muito tempo ou receberem o dinheiro de volta. Ao invés disso, foram mortos (numa emboscada) na entrada da cidade, próximo ao Juazeiro Velho e a barragem antiga do tabuleiro. Tempos depois, três conterrâneos nossos, achando pouco o que fizeram em Juazeiro, participaram ativamente do complô para realizarem a guerra de canudos, onde morreram 20 mil sertanejos, entre estes, o próprio Conselheiro.
Conclusão:
Eu teria mais a escrever, mas, creio que isso será suficiente para você compreender que Juazeiro não mudará, há não ser que a maldição seja destruída por algum exterminador do futuro (uma pessoa jovem, carismática, diferenciada e sem conchavos, voltada para uma administração séria, moderna e justa). De outra forma, essa maldição só poderá ser destruída se chamarem, pelo menos, 7 (sete) pais de santos, de Codó, município do Maranhão, para fazerem um trabalho dentro do Paço Municipal de Juazeiro.
Sem as soluções acima, Juazeiro seguirá nessa mesma mesmice, por “anos a fio”. Aceitemos essa condição que doerá menos.
Quero dizer ainda que o seu desencantamento com Juazeiro é normal, muita gente já passou por isso. Não perca o seu tempo pensando como mudar e melhorar a nossa Juazeiro, utilize o tempo que ainda lhe resta de vida (que são muitos, graças a Deus), para coisas edificantes.
Juazeiro já teve e ainda tem, inúmeras filhas e filhos maravilhosos que amaram e /ou ainda amam muito a nossa terra (naturalmente, não estou me refiro a João Gilberto, Ivete Sangalo e Daniel Alves). Vou citar como exemplo, Maria Isabel, a nossa Bebela. Mulher extraordinária, inteligente, educada, educadora, professora, bilíngue, bonita, alegre, entusiasmada, agradável, simpática, escritora, atriz, esposa, mãe, amiga, etc, que foi praticamente esquecida ou ignorada por grande parte dos políticos. Por tudo que ela era e pelo amor incondicional que tinha por Juazeiro, ela deveria ter tido um cargo vitalício na prefeitura municipal sob a nomenclatura de “Embaixadora”. Numa oportunidade em que a visitei, disse-lhe: Bebela, pra mim, você é perfeita. Seu único defeito foi amar Juazeiro. Se Bebela tivesse deixado Juazeiro quando jovem e ido morar no Rio de Janeiro, teria sido, com certeza; atriz, escritora, diretora de cinema e/ou membro da academia brasileira de letras.
Se Juazeiro fez isso com uma pessoa do nível de Bebela, imagine o que poderá fazer conosco? Apesar de que, Juazeiro já nem se lembra mais de nós dois. Fique tranquilo.
Fora isso, você só deve esperar pelo próximo carnaval de Juazeiro, para brincar e cantar a marchinha “Máscara Negra” de Zé Keti… Quanto riso! Oh! quanta alegria! Mais de mil palhaços…
Pelo menos, o carnaval de Juazeiro é feito pelo povo e é a única coisa (ACREDITEM) que Petrolina ainda não conseguiu superar a nossa cidade. Neste sentido, Petrolina tem uma inveja danada de Juazeiro. E não é de hoje. Essa inveja vem desde o início do século 20, quando o carnaval de Juazeiro já atraia grandes multidões de toda região, com os desfiles de carros alegóricos, escolas de samba (Cacumbú, Piratas Reis do Samba, A Voz do São Francisco), lança perfume, mulheres bonitas, blocos dos caretas, festas nos clubes 28 de Setembro, Apollo, Artífices, Clube dos Sargentos e, desfiles dos jipes, cujos proprietários colocavam apitos de ferro nas saídas dos escapamentos dos veículos para produzirem um som estridentes, quando acelerados.
Se você quiser enviar esta mensagem para outro amigo e conterrâneo, poderá fazer, afinal, nada do que foi dito aqui é mentira. E quem fala a verdade, não merece castigo. Apesar de que, para iniciar uma guerra, não é preciso pegar em armas, é só dizer o que pensa.
Fui.
Gilberto Maciel – Poeta e músico