Opinião: “Os Profissionais da Política”

*Por André Beltrão

O Presidente da República no Brasil, mesmo com a Constituição de 1988, ainda concentra muitos poderes. No entanto, essa mesma Constituição fortaleceu o Congresso Nacional e ampliou as prerrogativas do Ministério Público e dos órgãos de fiscalização e controle. Além do mais, somos um país continental, com cinco regiões diferentes cultural, social e economicamente. É como se fossem cinco países distintos dentro de uma federação chamada Brasil. Posso afirmar que um pernambucano de Araripina que chegue na cidade de Santa Cruz do Sul no Rio Grande do Sul, com certeza pensará que estará em uma cidade alemã.

Considerando essa realidade, o Presidente da República precisa, portanto, ter capacidade de ouvir, de dialogar e buscar o consenso no exercício de suas atribuições executivas. Enfim, esses são ingredientes de um cargo político e o presidente da República precisa fazer política para governar. Caso contrário, ocorre o cenário que vivemos hoje, onde o presidente da Republica tem uma visão da realidade econômica e política do país e o Congresso Nacional tem outra visão, fazendo esse prevalecer sua vontade, fruto do diálogo com os atores sociais.

O Presidente Bolsonaro sempre teve uma visão autoritária no seu pensamento político. Não posso afirmar que essa lógica iria para a gestão, uma vez que ele nunca exerceu um cargo executivo. Bolsonaro saiu da condição de capitão do Exército para Deputado Federal, exercendo o mandato por 28 anos consecutivos. Como disse um general de Exército, na patente de capitão, o militar não pensa. Exercita fisicamente e executa ordens.

“Presidente Bolsonaro sempre teve uma visão autoritária no seu pensamento político”.

O Presidente Bolsonaro, assim como a presidente Dilma Rousself, tem uma visão autoritária do poder. Pensa que o presidente da República pode tudo. Inclusive na sua relação com os outros poderes. É uma visão monárquica imperial, autoritária, quase ditatorial do exercício do poder. Além do mais é uma visão pequena, que desconhece ou ignora a história das Nações democráticas.

Em qualquer país democrático, o ambiente da falta de diálogo, de negociação, pode gerar crise política por vários motivos, algumas alheias a vontade do Presidente da Republica e outras crises criadas no próprio governo por seus assessores e ministros. No governo Bolsonaro podemos acrescentar os familiares.

Por vários motivos, desde o seu início, o governo Bolsonaro alimenta crises políticas na sua relação com os demais poderes. A mais recente crise, que seria considerada pequena para um governo federal, teve como protagonista um sujeito pequeno que vivia nos limites do submundo do Rio do Janeiro, que emergiu para o cenário nacional, um policial militar sargento, que era uma espécie de faz tudo da família Bolsonaro. Hoje, a percepção que temos é que o presidente da República e seus familiares são reféns desse policial militar, o já famoso Fabrício Queiroz.

Amigo do presidente há mais de 30 anos, Queiroz é apontado pelo MP-RJ como o operador financeiro do esquema da “rachadinha”, prática que consiste na devolução de salário de assessores ao parlamentar.

É nesse momento de fragilidade do Presidente da República que os profissionais da política ou por que não dizer, os políticos profissionais entram em ação, percebendo ou intuindo a oportunidade de retornar (ou será retomar o governo?) ao governo e exercerem o poder, como tem feito em todos os governos desde a redemocratização. São os partidos do chamado Centrão e do MDB. Figuras como Ciro Nogueira, Valdemar da Costa Neto, Gilberto Kassab, Ricardo Barros, Renan Calheiros, Eduardo Gomes, Fernando Bezerra Coelho, Fernando Collor de Melo, o DEM e por um dever de justiça e reconhecimento, não pode faltar na lista Michel Temer e José Sarney.

Todos percebem os desencontros, a falta de rumo e principalmente a incompetência do governo Bolsonaro em todas as áreas. Essa “turma”, imbuídos do mais elevado espírito público que norteia seu pensamento e principalmente suas ações, está sempre disponível para “contribuir” com a “governabilidade” do país e justiça seja feita que dispõem de quadros técnicos qualificados que também serviram a todos os governos desde 1985.

Como no conto de fadas do dinamarquês Christian Andersen, o rei ficou nú e os profissionais da política já tem pronta a roupa nova que o vestirão de agora em diante. Bolsonaro participou no Congresso Nacional do impeachment de dois presidentes da República autoritários e parece ter despertado que precisava mudar antes que fosse tarde. A nova política ficou para o passado, como mais um discurso de campanha. Sendo assim, é melhor entregar o anel do que perder o dedo. Ao que parece e pensando na sua sobrevivência, não restou a Bolsonaro senão se render ou se curvar aos profissionais da política ou políticos profissionais. Na verdade Bolsonaro é um desses políticos, só que pertencia ao baixo clero. É essa turma que “faz acontecer”, é “gente que faz” no sentido plural da palavra.

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*André Beltrão é jornalista 

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