PF usou decisão sobre relógio de Lula anulada pelo TCU para indiciar Bolsonaro em joias

O julgamento que livrou o presidente Lula de devolver o relógio Cartier recebido de presente em uma viagem à França desmontou o entendimento do TCU usado pela PF para embasar o pedido de indiciamento de Jair Bolsonaro no caso das joias sauditas. O inquérito que apura se o ex-presidente se apropriou indevidamente de presentes dados por autoridades estrangeiras tramita no Supremo Tribunal Federal.

No relatório de 476 páginas, a PF menciona 26 vezes o acórdão do TCU que dizia que presentes de luxo deveriam ser incorporados ao patrimônio público – em todas, como referência legal para o tratamento dos itens recebidos por presidentes da República.

Além do acórdão, também são citados uma lei de 1991 que trata da preservação dos acervos privados dos chefes do Executivo e que veda a comercialização dos bens para o exterior sem o aval da União.

O acórdão aprovado em 2016 estabelecia que apenas itens “personalíssimos”, de uso pessoal e baixo valor, poderiam ser incorporados ao patrimônio particular dos presidentes. Não é o caso das joias sauditas, avaliadas em R$ 6,8 milhões.

Esse entendimento, no entanto, foi implodido no julgamento sobre o destino do relógio de Lula na última quarta-feira (7) – quando o TCU, decidiu que não há lei específica sobre presentes, e portanto a Corte de Contas não pode obrigar nenhum ex-ocupante do Palácio do Planalto a devolver presentes, independentemente do valor.A decisão, aprovada por maioria de cinco dos nove ministros do TCU, dos quais três são ligados a Bolsonaro, abre espaço para que não só Lula, mas também seu antecessor, possa ficar com todos os presentes recebidos durante o mandato – inclusive as joias sauditas.

O novo entendimento do tribunal será usado pela defesa de Bolsonaro para desmontar a tese de que houve crime – o que pode afetar a argumentação da PF.

O relatório de indiciamento de Bolsonaro se sustenta no acórdão do TCU para incriminar, por exemplo, o ex-chefe do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH) da Presidência da República Marcelo Vieira, que segundo as investigações autorizou que as joias fossem incorporadas ao acervo privado de Bolsonaro.

Do Blog da Malu Gaspar para o Jornal O Globo.

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