Política de empresas nacionais fracassa com a Oi
A chamada política das ‘campeãs nacionais’, criada há seis anos pelo governo Lula e executada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), encontra na Oi seu mais novo exemplo de fracasso. A fusão da operadora brasileira de telefonia com a Portugal Telecom, encarada pelo mercado como ‘venda’, deve se concretizar nos próximos meses e criar um gigante com receita da ordem de 40 bilhões de reais.
Os investidores estão otimistas com a fusão, afinal, a entrada do capital português poderá ajudar a empresa a investir em infraestrutura e conquistar maior participação de mercado em telefonia móvel e em banda larga. “Para a Oi, é benéfico porque a empresa sai de uma situação de dívida altíssima para uma empresa com uma estrutura de capital bem melhor, além de fazer parte, agora, de um grupo internacional”, diz Pedro Galdi, da SLW Corretora. Contudo, a venda enterra, mais uma vez, o discurso do chamado “capitalismo de estado”, em que empresas são ‘turbinadas’ com dinheiro público para se tornarem multinacionais.
Essa política previa que o estado investisse em alguns segmentos do setor privado por meio do BNDES (comprando participação ou emprestando dinheiro com taxas de juros subsidiadas pelo Tesouro), com o objetivo de criar empresas brasileiras fortes para competir no mercado global. O banco injetou cerca de 20 bilhões de reais em companhias como JBS, Marfrig, Lácteos Brasil (LBR), Oi e Fibria. O resultado, seis anos depois, não é nada animador: LBR pediu recuperação judicial, Marfrig teve de vender a Seara para a JBS para reduzir seu endividamento, enquanto a empresa dos irmãos Wesley e Joesley Batista, apesar de em melhor saúde financeira que a concorrente, também sofre para reduzir as dívidas adquiridas ao longo de seu processo de expansão.
A Oi é um caso de fracasso à parte não só porque envolveu a participação maciça do BNDES. Sua própria constituição foi um exemplo de intervencionismo — e a venda para os portugueses evidencia o plano equivocado. Em 2008, o governo mobilizou todos os seus esforços sob o comando do próprio Lula, da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ministro das Comunicações, Hélio Costa, para mudar a legislação e permitir que a Oi comprasse a Brasil Telecom.
O negócio, visto como prejudicial para os acionistas minoritários porque diluía sua participação e porque eles tampouco concordavam com o preço (5,8 bilhões de reais), foi viabilizado depois de um lobby ostensivo que contou até mesmo com um decreto do presidente mudando as regras do setor. Segundo a legislação da época, um mesmo controlador não podia ser dono de duas concessionárias de telefonia fixa. O problema foi resolvido por meio de um decreto sem que o Congresso sequer participasse da decisão.
O argumento do governo era de que o país não podia deixar todas as suas empresas de telecomunicações nas “mãos de estrangeiros”. E, como a Brasil Telecom vinha sendo assediada por investidores de fora, como o bilionário egípcio Naguib Sawiris, dono da Orascom, houve uma movimentação sem precedentes para que ela fosse adquirida pela Oi. “O discurso era claramente de que o Brasil tinha de preservar a soberania e não deixar um ativo tão importante nas mãos de um estrangeiro”, afirma um executivo que participou da negociação da Brasil Telecom, em condição de anonimato. O BNDES entrou na negociação financiando 2,6 bilhões de reais, enquanto 4,3 bilhões de reais foram aportados pelo Banco do Brasil. Os fundos de pensão Previ, Petros e Funcef, que já detinham participação na Brasil Telecom, passaram a ser donos de 34% das ações da nova empresa.
A história começou a mudar quando, em 2010, numa negociação entre três partes, a Portugal Telecom vendeu sua participação na Vivo para a Telefonica e entrou na Oi. “Quando isso aconteceu, todos esperavam que os portugueses assumissem o controle cedo ou tarde. Era apenas uma questão de tempo”, afirma outra fonte próxima da empresa, que preferiu não ter seu nome citado. Assim, o anúncio da fusão apenas costura o desfecho de uma estratégia que começou errada e, no lugar de criar uma grande multinacional, deu origem a uma tele ineficiente financiada pelo capital do BNDES. “A Oi receberá um novo aporte de 7 bilhões que ajudará a companhia a aumentar investimento e reduzir dívida. Contudo, o aporte não resolve todos os problemas da empresa. Ela precisará montar um plano para reduzi-la”, afirma Arthur Barrionuevo Filho, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
O negócio entre Oi e Portugal Telecom ainda não foi assinado, mas foi chancelado pelo governo e pelo BNDES. Em um ‘mundo perfeito’, essa chancela poderia ser compreendida como um reconhecimento, por parte do PT, de que a estratégia de interferir de forma tão contundente no setor privado não poderia render boa coisa. Mas, como a realidade é bem outra, trata-se do inverso. O governo continua valendo-se do discurso da soberania, mas com outro objetivo — até mais danoso. Ao tentar forçar empresas estrangeiras de tecnologia, por meio do marco civil, a montar seus datacenters no Brasil, numa ingênua tentativa de ‘espantar’ a espionagem internacional, ele mostra ainda não ter aprendido com certos erros do passado. (Veja)