Preservação de Sobradinho depende de racionamento
Reservatório opera em situação crítica, com apenas 1,77% de sua capacidade instalada, segundo ONS
Raquel Freitas
Chesf solicitou ao Ibama diminuição da vazão
Principal reservatório para geração elétrica na Região Nordeste, Sobradinho está em situação crítica. Com 1,77% de sua capacidade, – segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) -, a perspectiva é de que o volume morto seja atingido entre o final deste mês e o início de dezembro, quando o mesmo deixará de ser usado para produção do insumo. Embora essa margem do volume morto, com 6 bilhões de metros cúbicos (m³), ainda garanta o abastecimento produtivo do Vale do São Francisco, humano e animal dos que moram à margem do lago, especialistas recomendam preservar a água que resta para evitar um colapso hídrico. Sobradinho é alimentado pelo Rio São Francisco.
Na tentativa de evitar isso, a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) – responsável pela operação do reservatório -, solicitou ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) uma redução da vazão dos atuais 900 m³/s para 800 m³/s. “Para esticar o máximo possível de água que temos lá”, justificou o diretor de operações da Companhia, José Ailton Lima. O problema é que, segundo Lima, a população vive em um verdadeiro dilema sobre a destinação do líquido. “Se dependesse dos que moram por trás da barragem, a Chesf fechava as comportas e não soltava água para ninguém (ou seja, para uma população que vive numa extensão de 800 quilômetros entre os estados de Pernambuco e Bahia). O pessoal que mora abaixo da barragem, por outro lado, quer que solte mais água. Não tem consenso”, explicou, fazendo um apelo para que a população entenda a motivo do pleito para redução da vazão.
“Isso não beneficia a Chesf em nada, porque, do ponto de vista elétrico, quanto mais água, mais geração de energia elétrica”, reforçou. No momento, o pedido segue no Ibama e, até a próxima semana, sairá o posicionamento. “Quando chegar a zero não vai ter geração de energia, mas o consumo humano e animal vão continuar existindo. É, portanto, fundamental preservar o que tem lá. Não tem outro caminho que não seja racionalizar”, frisou o diretor.
Em relação ao desabastecimento elétrico, José Ailton tranquilizou ao informar que a Região continuará sendo alimentada por meio de intercâmbio de energia, pela geração térmica, por outros reservatórios da Região e por fontes renováveis. “Em cima do histórico do Rio São Francisco, existe uma esperança que chova até abril”, destacou.
O professor de irrigação hidráulica da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Pedro Robson Fernandes, teme que isso não aconteça. “No nível agrícola, já existem áreas com racionamento. Chegando ao volume morto, vai chegar ao ponto que a represa não vai liberar água, evitando que a mesma chegue ao consumo”, lamentou.
Para evitar maiores danos, o professor especialista em recursos hídricos da UFRPE, Ênio Farias, contou que tudo é uma questão de gestão dos Comitês da Bacia Hidrográfica, responsáveis por discutir e colocar em debate as demandas dos recursos hídricos e as medidas mitigadoras. Procurado, o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Anivaldo Miranda, disse que “nas licenças que foram dadas pelo Ibama e pela ANA (Agência Nacional de Águas) à Chesf, cabe fazer a conscientização da população e ações que visem monitorar os impactos dessas reduções (nos reservatórios) para todos os usuários”.
Obras de bombas devem custar R$ 40 milhões
Quando o volume morto do reservatório de Sobradinho for acionado, as empresas de fruticultura irrigada do Vale do São Francisco, em Petrolina, precisarão captar água do lago por meio de bombas flutuantes. Os perímetros de Nilo Coelho e Maria Tereza dependem dessa água para manter as produções da região. A ideia é que a obra fique pronta antes que o volume morto seja atingido. Do contrário, os 25 mil hectares de área irrigada sentirão os efeitos da estiagem.
De acordo com o presidente da Associação dos Exportadores Hortigranjeiros e Derivados do Vale do São Francisco (Valexport), José Gualberto, a obra será antecipada diante da possibilidade de o volume útil se esgotar ainda neste mês. Ao todo, somente para o Perímetro Nilo Coelho, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) vai investir cerca de R$ 40 milhões.
Mesmo com essas obras, no mês passado, a Folha publicou que o sistema de rodízio passaria ser implantado por lá. Por conta recordes diários em relação à queda do nível útil de Sobradinho, os produtores do Distrito de Irrigação Senador Nilo Coelho estavam se preparando para continuar produzindo o mínimo com o volume morto da barragem. A previsão era que, neste mês, o período de irrigação diminuísse e que, posteriormente, o uso da água fosse intercalada dia sim, dia não. Os impactos devem refletir na qualidade dos produtos e nos preços ao consumidor final. “Por enquanto, isso não acontece. Se houver um racionamento, será debatido com a Codevasf”, destacou Gualberto.