Pryce Jones, o empresário que antecipou em 160 anos o modelo da Amazon e criou negócio milionário
Peter Shuttleworth
Muitas coisas mudaram no Natal deste ano, inclusive como e onde compramos os presentes desembrulhados há poucos dias.
O modelo de entregas em casa, atualmente um negócio bilionário, foi inspirado por um pouco conhecido vendedor de tecidos galês do século 19, que abandonou a escola aos 12 anos.
Pryce Jones não podia imaginar o impacto que sua iniciativa empreendedora teria no mundo quando estava vendendo flanelas à rainha britânica Victoria e à pioneira da enfermagem moderna Florence Nightingale, na segunda metade dos anos 1800.
Jones criou uma empresa considerada similar ao que é hoje a gigante do comércio eletrônico Amazon, mas não no Vale do Silício ou em algum dos grandes centros globais de comércio, e sim no interior rural do País de Gales, no Reino Unido.
O comerciante é considerado o pioneiro do sistema de entregas por correio, setor que é avaliado atualmente em 75 bilhões de libras (R$ 527 bilhões), e que cresceu significativamente nos últimos meses devido às restrições impostas pela pandemia.
Estima-se que um terço de todas as compras natalinas tenham sido realizadas pela internet em 2020, devido aos fechamentos de estabelecimentos físicos em todo o mundo.
Primeiros catálogos
Antes da internet e dos serviços de entregadores, Pryce Jones utilizou o que havia de mais eficiente no seu tempo: a ferrovia e o sistema de mala direta.
Ele não tinha um aplicativo ou um site, mas em 1861 começou a distribuir catálogos — os que são considerados os primeiros catálogos compras do mundo.
Essas revistas incluíam os mais recentes lançamentos da moda, de calças a ternos de três peças, e chegavam aos seus 200 mil clientes em todo o Império Britânico e outras partes do mundo.
Jones chegou a ter um armazém com agência de correios própria próximo à ferrovia, para conectar suas instalações com o resto do mundo. Com isso, ele transformou Newtown, uma pequena cidade mercantil do País de Gales, em um “importante centro de comércio internacional”.
Clientes importantes
O vendedor dava atenção especial aos seus melhores clientes.
“A ‘mãe da enfermagem moderna’ Florence Nightingale gostava tanto dos seus produtos que Jones deu o nome dela a um corte especial de flanela”, diz o historiador John Evans.
“A rainha Victoria foi uma de suas primeiras compradoras e chegou a dizer que só usava calças de flanela galesa”, acrescenta Evans.
“Na década de 1870, Pryce Jones forneceu roupas para grande parte dos monarcas da Europa e enviou flanelas para lugares tão distantes como os Estados Unidos e a Austrália. Tudo isso a partir de um lugar que muitos consideram como ‘o meio do nada’. É uma história extraordinária!”
Empreendedor pioneiro
Pryce Jones reinventou a venda de roupas e levou a flanela galesa aos armários de todo o mundo.
A jornada de Jones até se transformar num homem de negócios internacional e receber o título de cavaleiro começou aos 12 anos, quando ele abandonou a escola para aprender com John Davies, um comerciante de tecidos de Newtown, no País de Gales.
Jones assumiu o negócio de Davies quando tinha apenas 20 anos.
Ele então abriu um novo armazém de tecidos, o Royal Welsh Warehouse, em 1859.
O vendedor começou a enviar listas de preços aos clientes, para que eles não ficassem restritos a comprar produtos somente quando estivessem em Newtown.
Mas ele decidiu dominar o mundo quando sua cidade foi ligada pelo trem a Londres, seis anos depois de as ferrovias chegarem ao País de Gales.
“Jones já estava enviando amostras de flanela galesa aos seus melhores clientes, mas ele viu a oportunidade de enviar encomendas pela ferrovia quando o serviço postal chegou, e o negócio floresceu”, diz Evans, curador do Museu Têxtil de Newtown.
Inovações tecnológicas
O empresário pioneiro não parou por aí: sua companhia de lã em constante expansão inventou o que muitos consideram como o primeiro saco de dormir do mundo, em 1876, chamado de tapete Euklisia.
Logo ele se mudou para um armazém de tijolos vermelhos de última geração, voltado à entrega de mercadorias “o mais rápido possível”.
“Era o equivalente a um armazém atual da Amazon”, diz Evans.
“Foi instalado deliberadamente ao lado da estação de trens, com sua própria agência de correio e tinha inclusive seu próprio gerador de energia elétrica para alimentar a fábrica”, conta o historiador.
“Ele era louco pela tecnologia. Se considera que foi a primeira pessoa em Gales a ter um telefone em casa”, afirma.
“Foi um empreendedor pioneiro, um gênio do marketing e um inovador. Embora o edifício Pryce Jones seja destaque em Newtown hoje em dia, sua história não é muito conhecida na cidade”, lamenta.
Nobreza
Jones foi nomeado cavaleiro em 1887, no Jubileu de Ouro da Rainha Victoria, celebrado em 1887, por ocasião do quinquagésimo aniversário de ascensão da monarca.
Tornou-se então Sir Pryce-Jones e passou dois mandatos como membro do Parlamento pelo distrito de Montgomery.
Os dois filhos de Jones, William Pryce-Jones e Albert Westhead Pryce-Jones, foram jogadores internacionais de futebol pelo País de Gales.
Jones morreu aos 85 anos, em 1920. Está enterrado na Igreja de Todos os Santos, nos arredores de Newtown, um templo que ele pagou para construir em 1890.
Posteriormente, sua empresa foi gravemente afetada pela Grande Depressão das décadas de 1920 e 1930 e foi comprada por outra pouco antes da Segunda Guerra Mundial.
Mesmo que ela tenha desaparecido, da próxima vez que comprar pelo correio, lembre-se que o modelo foi possível graças a pioneiros como Pryce Jones.