Opinião
A operação da Polícia Federal que revelou um suposto plano para assassinar o presidente Lula (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, e dar um golpe de Estado no Brasil em 2022, ainda tem pontos a serem esclarecidos.
Uma das questões centrais é por que as investigações não levaram à prisão do ex-ministro da Casa Civil, Braga Netto, que disputou a eleição de 2022 como candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro. Ontem, Lula falou pela primeira vez publicamente sobre o caso. “Eu sou um cara que tenho que agradecer agora, muito mais, porque eu estou vivo. A tentativa de envenenar eu e Alckmin não deu certo, nós estamos aqui”, disse o presidente em um evento no Palácio do Planalto.
“E eu não quero envenenar ninguém”, afirmou, depois, no mesmo discurso. “A única coisa que eu quero é, quando terminar o meu mandato, que a gente desmoralize, com números, aqueles que governaram antes de nós.” Segundo a investigação, o general Braga Netto teria participado dos planos golpistas, inclusive realizado uma reunião sobre o tema em sua residência em Brasília.
A operação levou a outras cinco prisões de agentes que teriam operacionalizado a tentativa de golpe de Estado. Foram presos o policial federal Wladimir Matos Soares e quatro militares do Exército, integrantes de forças de operações especiais, conhecidos como “kids pretos” — o general de brigada da reserva Mário Fernandes, o tenente-coronel Helio Ferreira Lima, o major Rodrigo Bezerra Azevedo e o major Rafael Martins de Oliveira.
EMBOSCADA – Outro ponto ainda não esclarecido é o que levou os investigados a abortar uma tentativa de sequestrar Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Essa emboscada teria sido realizada dentro dos planos intitulados “Copa 2022” e “Punhal Verde Amarelo”, que envolviam o monitoramento, a prisão ilegal e até uma possível execução de Moraes, Lula e Alckmin, que naquele momento eram o presidente e o vice-presidente eleitos.
Bolsonaro indiciado – Uma terceira questão é qual será o impacto das novas revelações sobre Bolsonaro, que também é investigado e foi indiciado no inquérito que apura os atos antidemocráticos de 8 de janeiro e supostos planos golpistas, mas não foi alvo direto da operação de terça-feira passada. Há expectativa de que esse inquérito seja concluído ainda este ano, podendo levar ao indiciamento de Bolsonaro, primeiro passo para uma eventual denúncia criminal.
Cortina de fumaça – O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) saiu em defesa do pai e chamou a operação de “mais cortina de fumaça para desgastar sua imagem política”. “Mais uma vez ele não tem nenhuma responsabilidade direta ou indiretamente. Eram agentes de segundo ou terceiro escalão”, disse em entrevista ao jornal O Globo. “Você não pode responsabilizar uma pessoa pelos atos de outra. Se é que é verdade, obviamente que ninguém sabia. Parece muito mais narrativa, para mais uma vez tentar envolver Bolsonaro.”
Prisão de Braga Neto – Após a operação da Polícia Federal na terça-feira, muitos passaram a questionar nas redes sociais porque Braga Netto não teve a prisão preventiva decretada, já que ele é apontado como um dos mentores do suposto plano golpista. “A pergunta que não quer calar: que horas o Braga Netto vai ser preso?”, questionou, por exemplo, o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), vice-líder do governo Lula na Câmara. Para o criminalista Davi Tangerino, professor de direito penal da Universidade de Estado do Rio de Janeiro (Uerj), não é possível entender os fundamentos jurídicos para a Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitar — e Moraes decretar — a prisão de apenas parte dos investigados.
Execução do plano – Segundo a polícia, os participantes do plano se comunicavam em um grupo chamado Copa 2022, composto por seis integrantes, que usavam os codinomes Alemanha, Áustria, Brasil, Argentina, Japão e Gana. O documento do STF aponta que “as mensagens trocadas entre os integrantes do grupo ‘Copa 2022’ demonstram que os investigados estavam em campo, divididos em locais específicos para, possivelmente, executar ações com o objetivo de prender o ministro Alexandre de Moraes”. Às 20h33 daquela noite, a pessoa associada ao codinome Brasil informa um dos locais em que estava atuando. Ele diz: “Estacionamento em frente ao gibão carne de sol. Estacionamento da troca pela primeira vez”. Em seguida, a pessoa associada ao codinome Gana informa que já estava no local combinado: “Tô na posição”.
MONITORAMENTO – A investigação da PF cruzou as informações fornecidas pelos envolvidos e dados de chips de celular, de aluguel de carros e outras fontes para concluir que o grupo monitorava Moraes. “A análise permite concluir que é plenamente plausível que a pessoa de codinome Gana estivesse próxima à residência funcional do ministro Alexandre de Moraes”, diz trecho do relatório.
DENÚNCIA – A conclusão do inquérito levou ao indiciamento de Bolsonaro. Indiciado, a PGR decidirá, na sequência, se apresenta uma denúncia criminal contra ele. A apuração trouxe elementos contra pessoas muito próximas ao então presidente, como o próprio Braga Netto e o general de brigada da reserva Mário Fernandes.
MINUTA – Essa não é a primeira vez que investigações apontam possível atuação direta de Bolsonaro. Em fevereiro, outra operação da PF indicou que o então presidente teria recebido uma minuta com teor golpista, prevendo as prisões dos ministros do STF, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além do presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Na ocasião, o próprio Bolsonaro teria feito ajustes no texto.
Por: Magno Martins