Dez anos de amizade renderam ao professor e escritor Flávio Loureiro Chaves um arsenal de relíquias de Erico Verissimo, como originais corrigidos de próprio punho, edições raras, inéditos e até uma gravação em vinil, ao que se sabe a única, do romancista lendo “O tempo e o vento”. Por mais de 30 anos, esse manancial de documentos pôde ser visto apenas em exposições esporádicas. Agora o acervo, acrescido de originais que estavam com a família do crítico Mário de Almeida Lima, fará parte do Memorial Erico Verissimo, que será aberto hoje ao público no centro cultural que leva o nome do autor, no centro de Porto Alegre.
Mapa de Antares em 3D
A maior parte dos documentos, segundo Chaves, é inédita e nunca esteve à disposição de críticos e estudiosos. Isso inclui, entre outros, os originais de “Fantoches” (1932), primeiro livro de Erico, e do segundo volume de “Solo de clarineta” (1975), biografia inacabada que coube a Chaves terminar depois da morte súbita do autor.
— Erico não tinha vaidade, o que pode ser comprovado pela absoluta desordem dos originais. Assim como me presenteou com alguns, deu vários a outras pessoas sem se preocupar com o futuro — lembra Chaves.
Entre os originais raros estão a planta da cidade fictícia de Antares — onde foi ambientado o romance “Incidente em Antares” (1971) — e o mapa da também inventada ilha de Sacramento, onde transcorre a narrativa de “O senhor embaixador” (1965). A planta urbana de Antares ganhou versão em 3D.
Outras raridades do Memorial são a primeira — e única — edição de “Aventuras no mundo da higiene” (1939), com ilustrações do pintor João Fahrion, e de “Viagem à aurora do mundo” (1939), narrativa fantástica sobre a história da humanidade na qual a grande atração era um mapa dobrável desenhado pelo alemão Ernest Zeuner. Outro objeto curioso é uma carta em que Erico narra a Chaves seu primeiro encontro com Roland Barthes, com direito a uma caricatura do intelectual francês.
O Memorial está espalhado por 300 metros quadrados em dois andares do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo. A diretora do Centro, Regina Ungaretti, explica que o local terá espaço para pesquisadores, junto à biblioteca O Continente, e também para quem não conhece o trabalho do autor. Haverá oito ilhas interativas sobre o processo de criação de Erico, que enchia os originais de anotações e desenhos.
— Queremos que o memorial se transforme numa referência internacional em documentação e pesquisa sobre Erico Verissimo — diz Regina.
A negociação para abrigar as relíquias de Erico foi difícil e, segundo Regina, teve a concorrência de universidades norte-americanas. A próxima etapa, de acordo com a diretora, é incorporar o acervo do autor que está no Instituto Moreira Salles. O escritor Luis Fernando Verissimo, filho de Erico, já sinalizou que concorda em trazer os originais de volta ao Rio Grande do Sul.
Todo o material que faz parte do acervo foi digitalizado e estará disponível no site do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo.
Fonte: O Globo