Restos mortais de João Goulart serão recebidos com honras de estado
“É um momento histórico da maior importância. O procedimento investigativo é, de um lado, a busca da verdade pela família e pela nação. Do outro, é a realização de um ato de justiça, já que o único presidente que morreu no exílio não recebeu nenhuma homenagem especial”, afirma a ministra-chefe da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário. De acordo com ela, a orientação da presidente é a de preparar esse ato com respeito pleno à figura histórica de Jango.
Do Aeroporto de Brasília, os despojos vão para o Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal, no Setor Policial Sul, para dar início aos trabalho que tentarão comprovar a causa da morte. A suspeita é de que o ataque cardíaco que vitimou Jango, conforme aponta o laudo oficial, foi provocado por uma ingestão de substância misturada criminosamente aos medicamentos que tomava em virtude de problemas cardíacos. Sua morte teria sido uma ação de agentes da Operação Condor, uma aliança político-militar entre os regimes militares ditatoriais do Brasil, Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai e Bolívia, que atuou na década de 80 e 90, para perseguir os opositores.
Amostras
No dia da exumação, estarão presentes autoridades, os peritos convocados e familiares. Mas só poderão ficar próximos ao jazigo os especialistas do Brasil, da Argentina, do Uruguai e de Cuba, responsáveis pelos exames e análises do material, e o filho do ex-presidente João Marcelo Goulart, que é médico. A participação do perito cubano Jorge Perez Gonzalez foi uma solicitação dos familiares. Reitor da Faculdade de Medicina de Cuba, Perez participou da exumação do revolucionário venezuelano Simón Bolivar e do argentino Che Guevara.
Amostras serão encaminhadas a laboratórios internacionais para verificar a presença de substâncias estranhas ou em excesso que podem ter provocado a morte do ex-presidente. Mesmo que os laudos não sejam conclusivos sobre a causa da morte, fragmentos serão guardados para eventual retomada do caso no futuro, com o desenvolvimento da tecnologia. A ministra Maria do Rosário explica que, caso não seja possível comprovar o assassinato do ex-presidente, permanecerão os indícios com base em documentação e depoimentos de testemunhas de que, mesmo estando no exílio, Jango foi monitorado e perseguido pelas ditaduras do Cone Sul.
O processo de exumação dos restos mortais do ex-presidente teve início em 2007, quando os familiares solicitaram a reabertura das investigações sobre sua morte ao Ministério Público Federal. Após o arquivamento do caso pelo órgão, eles recorreram à Secretaria dos Direitos Humanos. Eles se basearam em revelações feitas por Mário Neira Barreiro, ex-agente da ditadura uruguaia, preso em Porto Alegre, que garantiu que Jango foi morto pela Operação Condor. A exumação foi determinada em abril do ano passado pela Comissão Nacional da Verdade, criada pela presidente Dilma.
“É, de um lado, a busca da verdade pela família e pela nação. Do outro, é a realização de um ato de justiça, já que o único presidente que morreu no exílio não recebeu nenhuma homenagem especial”
Maria do Rosário, ministra-chefe da Secretaria de Direitos Humanos
Para saber mais
Jazigo vistoriado
A sepultura de Jango permanece intocada desde 1976, segundo o governo. Peritos já estiveram no cemitério em agosto deste ano inspecionando o local, tirando medidas e coletando informações sobre o jazigo, que é da família. No caso de Jango, não houve a tradicional exumação do cadáver que ocorre, em geral, a partir do quinto ano após o enterro para acomodação dos restos mortais em sepulturas menores e definitivas. O jazigo onde está o caixão do ex-presidente tem três metros de profundidade e duas galerias. De um lado, estão Jango e sua mulher. Do outro, sua irmã Neuza Brizola e o marido e ex-governador do Rio de Janeiro Leonel Brizola.
Os peritos verificaram, no entanto, que há sinais de infiltração por água de chuvas, o que pode comprometer a integridade do material que precisa ser coletado para as perícias. A equipe responsável pela exumação, composta de peritos brasileiros e também da Argentina, do Uruguai e de Cuba, já providenciou um caixão um pouco maior que o do ex-presidente, para, se possível, acomodá-lo integralmente e, assim, evitar alteração do estado em que forem encontrados os despojos. Caso não tenha condições de retirá-lo sem desfazer a estrutura do caixão, os restos mortais serão acomodados em uma caixa. (Correio Braziliense)