Roberto Magalhães, o não-político

Por Aldo Paes Barreto

O ex-governador de Pernambuco entre 1983 e 1986, Roberto Magalhães, que está aí vivo e saudável, merecedor de todas as homenagens que devem ser prestados a um gestor público, culto, probo, que fez da política a arte do bem comum. Embora não fosse “político”, pela incapacidade de cultivar a popularidade ou de atender favores não republicanos, Roberto Magalhães faz parte do pequeno grupo que serviu sem se servir do poder.

Dr. Roberto Magalhães, governador de Pernambuco de 1983 a 1986, visitou a cidade de Petrolândia, acompanhado pela esposa, Dra. Jane Magalhães, além de comitiva. No mesmo período, era prefeito Dr. Francisco Simões de Lima. tendo como vice-prefeito Itamar Leite.

Quando governador, costumava viajar pelo interior, observando as obras públicas ou animando correligionários. Certa vez, em Salgueiro, o governador assim que desembarcou da caminhonete Veraneio na qual costumava viajar, foi abordado por um cidadão de aspecto grave, carregando uma gaiola:

— Governador, eu sei que o senhor é apreciador de canários. Este aqui é o melhor, o maior cantador do Sertão. Por isso, eu trouxe para o senhor… Aceite. É a homenagem de um humilde sertanejo!

Constrangido e envaidecido ao mesmo tempo, Magalhães relutou em receber o presente:

— Mas meu amigo, esse canário tem muito valor para o senhor. Não se desfaça dele; eu já me sinto homenageado com seu gesto.

— Não, senhor governador! Já decidi. O canário é seu. Tome!

Apreciador do canto dos pássaros de sua terra, a Magalhães não restou outra alternativa. Chamou o ajudante e recomendou:

— Capitão, coloque a gaiola no carro e cuide para o canário ir confortável.

Agradeceu ao matuto e já se encaminhava para outro compromisso, quando foi novamente abordado pelo mesmo cidadão:

— Governador, é que eu tenho duas sobrinhas que estão desempregadas…

— Capitão! Traga de volta essa gaiola! E devolva a esse senhor.

Doutor Roberto podia perder o voto, o eleitor, o amigo, mas só dizia o que pensava e só comia o que gostava. Fez política de forma singular, capaz de cometer as maiores franquezas não importando quando nem onde, muito menos diante de quem. Palavras não foram feitas para esconder o pensamento, repetia.

Durante visita que fez a Serra Talhada, na campanha para Governo do Estado, em 1981, teve o deputado Inocêncio Oliveira como cicerone. O almoço ia ser servido, anunciou o correligionário. Magalhães sentou-se à mesa. Da fumegante panela colocada sobre a mesa, saía o cheiro intenso de gorduroso sarapatel, molho escorrendo pela toalha. Embora de aspecto duvidoso, o sarapatel foi especialmente preparado pelo cozinheiro do Gregório, o mais famoso do Recife.

Quando Magalhães botou o olho na engordurada panela, assustou-se:

— Mas o que é isso, Inocêncio?

— Sarapatel, doutor Roberto! Especialmente feito para o senhor.

— Sarapatel? Deus me livre… Vocês deviam mandar essa coisa para os adversários… Mande para Dr. Arraes. Ouvi dizer que é o prato preferido dele em Paris…

Em outra cidade da região, a comitiva de Roberto Magalhães foi chegando e o antigo prefeito, gripado, tossindo , espirrando, adiantou-se para saudar o governador. Puxou do bolso um lenço que mais parecia um lençol de casal e assoou o nariz, deixando metade do produto nasal a escorrer pela lapela do paletó. Mesmo assim, apressou-se para abraçar Magalhães, e o faria se não fosse prontamente interrompido:

— Você não vai me abraçar com o paletó sujo desse jeito, vai, prefeito? – Perguntou Magalhães apontando a melequeira.

Desconfiado, o chefe político passou a mão na lapela suja, limpou a dita na perna da calça, esboçou um riso amarelo, e sem qualquer desconfiômetro tentou o aperto de mão.

— Mas com a mão suja, seu Epaminondas? – recuou Magalhães.

Aí o prefeito ficou zangado. Recolheu a mão e o apoio.

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