Série governadores: Cid Feijó Sampaio

 

Capítulo 14

Candidato a governador nas eleições de 1958 pela UDN, Cid Feijó Sampaio, engenheiro por formação acadêmica, mas político por vocação, foi eleito sob o lema da industrialização e da reforma do sistema tributário. Mas para conquistar corações e mentes do eleitorado pernambucano recorreu a um verso do poeta João Cabral de Melo Neto, que dizia: “A melhor medida do homem não é a morte, mas a vida”. Conseguiu sensibilizar as massas e ganhar o apoio da maioria. Obteve 309.63 votos, derrotando Jarbas Maranhão, do PSD, que contabilizou 211.876 votos.

O pleito ocorreu em 3 de outubro como parte das eleições gerais no Distrito Federal, em 20 Estados e nos territórios do Acre, Amapá, Rondônia e Roraima. Seu vice, Pelópidas da Silveira, havia sido prefeito do Recife. Para o Senado, foi eleito o agropecuarista Antônio de Barros Carvalho, 22 deputados foram eleitos para a Câmara Federal e 65 para a Assembleia Legislativa. Diplomado em Química Industrial e Engenharia Civil, Cid nasceu em Recife e fez o primeiro curso na Universidade Federal de Pernambuco e o segundo na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

De volta a Pernambuco para comandar os negócios da família no setor sucroalcooleiro, fez oposição ao interventor Agamenon Magalhães e em 1945 entrou na UDN chegando à presidência do diretório estadual. Em 1952, foi escolhido presidente do Centro das Indústrias de Pernambuco. Nesse mesmo ano divergiu de seu partido e apoiou Osório Borba na eleição extra para governador, apesar da vitória de Etelvino Lins, candidato da maioria dos partidos políticos do Estado.

Ao lado dos irmãos, formou uma nova dissidência partidária e apoiou Cordeiro de Farias em 1954, mas romperia com o mesmo e quatro anos depois foi eleito governador com o apoio da esquerda devido ao fato de ser concunhado de Miguel Arraes. Anteviu e implantou em Pernambuco o sistema atualmente chamado de Parcerias Públicas e Privadas, iniciativa que consistia no lançamento dos bônus BS para circular no comércio, através do qual o Estado aumentava a arrecadação de impostos e os consumidores, detentores dos bônus adquiridos através de notas fiscais, se tornavam parceiros dos empreendimentos estatais.

Mediante essa parceria Estado-sociedade, implantou a Companhia Pernambucana de Borracha Sintética (Coperbo), no município do Cabo, a maior marca da sua gestão. Em 1971, a Coperbo foi vendida à Petrobras. Atualmente atuando como Petroquisa, subsidiária da Petrobrás, a empresa utiliza derivados de petróleo como matéria-prima, sendo considerada estratégica no setor da petroquímica nacional e regional. O sucesso de hoje veio da antevisão de Cid Sampaio.

Ainda no seu Governo, com sua visão empresarial, criou os distritos industriais do Curado e do Cabo e, mais tarde, os de Prazeres, Igarassu e Paulista. Transformou a Caixa de Crédito Mobiliário de Pernambuco, etapa inicial para o surgimento do Bandepe, o banco estadual. Fundou, ainda, a Cilpe, a Companhia de Revenda e Colonização, que interferiu no mercado de produtos agrícolas no objetivo de reduzir preços de venda ao consumidor. É dele a instituição da Cagepe (Companhia de Armazéns Gerais do Estado de Pernambuco), que construiu uma rede de silos e armazéns em todo o Estado (base de Caruaru e Arcoverde) e o silo portuário do Porto do Recife.

Atuação destacada no meio empresarial e na “Frente do Recife” – A liderança de Cid Sampaio também se mostrou expressiva como presidente da Federação das Indústrias e no Sindicato das Indústrias de Açúcar de Pernambuco. Nessas entidades representativas de classe, imprimiu a marca da modernidade administrativa e lutou pela implantação de um sistema tributário eficiente e dinâmico, daí emergindo como líder político. Depois de ser governador no quadriênio 1959-1962, teve participação decisiva nas alianças políticas que formavam a “Frente do Recife”, como polo aglutinador de empresários e lideranças políticas em Pernambuco. Nos idos de 1967, extintas as legendas da UDN, PSD e demais partidos, Cid filiou-se à Aliança Renovadora Nacional e foi eleito para exercer o mandato de deputado federal na legislatura de 1967 a 1971. Fiel à sua vocação de estudioso dos problemas nacionais, deixou sua marca construtiva durante essa passagem no Congresso Nacional.

Perdeu eleição para o Senado, mas foi senador assumindo a vaga de Nilo Coelho – Ao rebelar-se contra o bipartidarismo artificial vigente nos anos 70, disputou uma vaga de senador em 78 numa sublegenda da Arena contra o então candidato do MDB, Jarbas Vasconcelos, saindo vitorioso o ex-governador Nilo Coelho. A partir daquela eleição, o sistema de sublegendas partidárias começou a ser questionado com mais vigor até ser revogado depois das eleições de 1982. Com a morte do senador Nilo Coelho em 1983, Cid Sampaio chegou ao Senado na condição de segundo candidato mais votado nas eleições de 1978. Até 1987 teve uma atuação das mais profícuas como senador. Em 1994, concorreu novamente ao cargo de governador de Pernambuco, ficando em terceiro lugar, eleição ganha por Miguel Arraes, de quem já estava afastado. Cid foi ainda um dos articuladores da campanha do Brigadeiro Eduardo Gomes para a Presidência da República na década de 40. Em 1964, ficou contra o movimento militar, mas depois filiou-se à Arena, partido que apoiava o governo comandado pelos generais. Só saiu da Arena com a vigência do pluripartidarismo, passando depois ao PP e ao PMDB. Em 2002, a Assembleia Legislativa o agraciou com o título “Expoente de Pernambuco”.

Vitória em todas as urnas no Recife e a piadinha de Drayton Nejaim – Nas eleições para governador em 58, Cid Sampaio ganhou em todas as urnas no Recife, à exceção de uma localizada no colégio das Damas, onde votaram as freiras daquele educandário de ensino. O arcebispo dom Antônio de Almeida Morais Júnior havia tomado partido abertamente contra a candidatura oposicionista, notadamente após um grande comício no largo de Casa Amarela com a presença do líder comunista Luiz Carlos Prestes e realizado sob o som dos sinos das igrejas badalados por ordem da arquidiocese. Cid foi um renovador e inovador que implantou um novo modo de se comunicar com o povo nos comícios, usando termos até então desconhecidos para a grande maioria da população, levando o prefeito de Caruaru, Drayton Nejaim, a dizer que “as pessoas pensavam que industrialização, renda per capita e desenvolvimento eram os candidatos a vice-governador e senadores.”

Renúncia de Cordeiro e o famoso jingle “O povo é quem diz Cid (decide) – Diante da histórica derrota do seu candidato Jarbas Maranhão, o governador Cordeiro de Farias, aliado do ex-governador Etelvino Lins, renunciou ao cargo e voltou para o sul do País, passando a chefia do governo para o deputado Otávio Correia, presidente da Assembleia. Começou então um processo intitulado pela imprensa de política de terra devastada, através do qual o grupo político derrotado promoveu uma série de ações em proveito próprio e de seus correligionários, objetivando inviabilizar os planos do novo governo. As lideranças empresariais e sindicais se insurgiram e ameaçaram convocar o povo para invadir a Assembleia e jogar os deputados no Capibaribe, sustando tais ações nefastas. Na campanha eleitoral de 1958 pela primeira vez apareceu o trabalho de um marqueteiro, um paulista de nome Albano, criador do mote “o povo é quem diz Cid (decide)”. Mais tarde, por ocasião do carnaval de 1959, o mais animado do Recife, cidade que havia dado quase 80% a Cid, o imortal maestro Nelson Ferreira compôs a marcha Bloco da Vitória que dizia: “O bloco da vitória está na rua, desde que o dia raiou, vamos minha gente no nosso cordão, que a hora da virada chegou. Quando o povo diz “Cid cair na frevança não há quem dê jeito”.

O fim das perseguições e a lealdade de Pelópidas – Governador, Cid Sampaio acabou com a velha política de exercer o poder com nomeação, demissão e transferência de professoras, delegados de polícia e coletores. Durante todo seu mandato, contou com o apoio e a lealdade do vice-governador Pelópidas da Silveira, que também teve sua trajetória política como grande prefeito do Recife. No período que esteve à frente do Estado, Cid dedicou-se com total empenho às coisas republicanas, não havendo registro que tenha se afastado um dia sequer por motivo de férias ou qualquer licença. Sua última participação política ocorreu em 1982, quando concorreu à eleição para o Senado pelo MDB na chapa do candidato a governador Marcos Freire, numa campanha que empolgou o Estado, sendo, todavia, derrotados pela manobra da Arena, que criou o casuísmo do chamado voto vinculado e a sublegenda, obrigando o leitor a votar em candidatos do mesmo partido de vereador a governador.

CURTAS

CID LEVOU A PIOR AO CHAMAR ARRAES DE ZÉ NINGUÉM – A expressão Zé Ninguém, recentemente usada por Lula para atacar Bolsonaro, faz parte do embate político desde a década de 1960 quando o ex-governador Cid Sampaio chamou Miguel Arraes de Zé Ninguém, provocando uma onda de críticas pela condição socioeconômica de Sampaio, que era dono de usina de açúcar. Miguel Arraes, que disputou e venceu as eleições derrotando João Cleofas, aproveitou a crítica e a usou para reforçar sua presença na Zona. Arraes fora secretário de Fazenda de Cid Sampaio e deveria ter o apoio da UDN. Mas Cid decidiu apoiar João Cleofas que decidiu concorrer ao Governo contra Arraes.

QUASE CENTENÁRIO – Cid Sampaio nasceu em Recife e iria completar 100 anos no dia 7 de dezembro de 2010, quando morreu. Casado com dona Dulce Sampaio, que morreu em 2008, foi pai de cinco filhos, teve 12 netos e 12 bisnetos. Com sua morte, encerrou-se o ciclo de uma geração de políticos que atuava combinando a brilhante eloquência com a capacidade de apresentar propostas públicas que atendiam ao real interesse da sociedade.

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