Série governadores: Gustavo Krause Sobrinho

 

Capítulo 19

Da fornalha de quadros por excelência que passaram pela escola do ex-governador Moura Cavalcanti, e depois a macielista, de Marco Maciel, Gustavo Krause, vindo da sua Vitória de Santo Antão, berço sagrado da batalha do Monte das Tabocas, é, sem dúvida, um dos mais brilhantes. Por onde passou, da chefia de gabinete de Moura, ainda imberbe, no Ministério da Agricultura, ao Ministério de FHC, deu show, quase uma unanimidade como gestor público.

Pai da vice-governadora Priscila Krause, Gustavo foi governador de Pernambuco por 11 meses, sucedendo a Roberto Magalhães, que se afastou para disputar o Senado nas eleições de 1986. Discípulo fiel, deu continuidade ao modelo de gestão, iniciado lá atrás, em 78, por Marco Maciel, e sequenciado por Magalhães, primando pelo controle dos gastos públicos. Fez uma transição civilizada para o então governador Miguel Arraes, que venceu as eleições em 86, elegendo os dois senadores – Mansueto de Lavor e Antônio Farias.

Fez questão, inclusive, de prestar contas sobre a situação financeira do Estado em publicação nos jornais de maior circulação no Estado, bem como o balanço de todos os órgãos da administração indireta também, o que até a oposição bateu palmas. Num mandato curto, deu continuidade às obras deixadas por Magalhães, inaugurando barragens, agências do Bandepe e o Terminal Integrado de Passageiros – TIP.

Depois da passagem pelo Governo de Pernambuco, Krause foi brilhar no plano nacional. Foi ministro da Fazenda e do Meio Ambiente durante os governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Por Pernambuco, além de governador, foi deputado federal, secretário da Fazenda, prefeito e vereador do Recife. Gustavo Krause nasceu em 19 de junho de 1946, filho de Severino Joaquim Krause Gonçalves e Emocy Krause Gonçalves. Em 1964, ingressou na faculdade de Direito na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

No mesmo ano, foi nomeado oficial-de-gabinete de José Francisco de Moura Cavalcanti, então secretário de Administração no Governo de Paulo Guerra. Quando assumiu o Ministério da Agricultura, Moura fez de Krause seu subchefe de Gabinete. Encantado com o desempenho do sobrinho da sua mulher, dona Suçu, ao chegar ao Governo de Pernambuco em 1975, Moura Cavalcanti o escolheu como secretário da Fazenda.

Quatro anos depois, Krause recebe uma missão de Marco Maciel: prefeito biônico do Recife. Fez uma gestão diferenciada, trazendo inovações para a administração e finanças públicas. Manteve sintonia com os diversos segmentos sociais e as camadas mais pobres, com obras e programas voltados para melhoria da qualidade de vida dos menos favorecidos.

Afastou-se da Prefeitura de Recife em maio de 1982, para participar das eleições estaduais como candidato à vice-governador na chapa encabeçada por Roberto Magalhães e que se saiu vitoriosa, derrotando o então favorito senador Marcos Freire, candidato das esquerdas, esmagado nas urnas por causa do casuísmo do chamado voto vinculado e da sublegenda.

Barracões da Prefeitura e Murais da Crítica como prefeito do Recife – Nomeado em 1979 prefeito biônico do Recife, pelo então governador Marco Maciel, Gustavo Krause imprimiu uma gestão popular e democrática, voltada primordialmente para as classes mais carentes e em ampla expansão nas cercanias de Recife. Realizou muitas obras estruturadoras, principalmente nas áreas de periferias, como escadarias e muros de arrimos. Mas a maior marca da sua gestão como prefeito foi a fixação dos chamados “barracões” da Prefeitura, nas áreas pobres do município, que eram “centros de atendimentos sociais” com médicos, engenheiros e vários servidores que atendiam a comunidade. Lançou os “Murais da Crítica”, espaços públicos para que a população pudesse se expressar e se comunicar com o governo, através da realização de pichações e grafites. Eles ficavam em locais estratégicos, de grande visibilidade, geralmente próximos de praças, universidades e vias de grande fluxo de trânsito. Diariamente, uma equipe da Prefeitura fotografava os grafites e registravam as solicitações ou manifestações deixadas pela comunidade. Servia como um canal direto com o cidadão, além de preservar os muros e fachadas de edifícios, deixando a cidade mais limpa e bonita. Essa iniciativa foi considerada bastante ousada para a época, servindo de inspiração para medidas semelhantes em outras cidades do País.

Ministro da Fazenda de Itamar, vítima do preconceito de Paulo Francis – Um momento mais marcante da trajetória política de Gustavo Krause se deu em 1992, quando pediu demissão do cargo de ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, dois meses apenas depois de ser empossado. Sua saída teria sido motivada pela aproximação do presidente com economistas que tinham teses opostas às suas. Itamar não queria entregar a Fazenda a São Paulo e pediu ao então governador Joaquim Francisco, amigo de Krause, a sugestão de um nome. “Eu levei um susto quando ele disse: “Joaquim indica o ministro da Fazenda”, porque seria quebrar um tabu muito grande e tirar o controle da política econômica do eixo paulista”, lembrou o ex-governador, numa entrevista, ao confirmar que indicou Gustavo Krause. Nem o próprio Krause, quando avisado por Joaquim, acreditou em tamanha ousadia. De Nova Iorque, o jornalista Paulo Francis, que carregava no sangue e na alma exagerado preconceito contra nordestinos, debochou de Itamar, disse que ele formou um ministério de compadres e sugeriu que Krause era um Jeca Tatu. No plano pessoal, Itamar Franco talvez tenha sido o mais desequilibrado presidente que este país já teve: impulsivo, detalhista, desinformado, com parca capacidade de discernimento, tanto em relação a fatos quanto a pessoas, e uma necessidade quase doentia de autoafirmação. Suas virtudes – de homem simples, bem-intencionado, menos afeito a práticas fisiológicas e ao uso da máquina do Estado que a maioria dos políticos – pareciam insuficientes para contrabalançar seus vícios de temperamento. Numa entrevista ao jornalista pernambucano Geneton Moraes Neto, Itamar contou bastidores do seu governo nunca revelados. Disse que políticos o procuraram para sugerir o fechamento do Congresso. “O Congresso enfrenta uma crise muito séria. Há corrupção generalizada na Comissão de Orçamento. É melhor fechar por um tempo”, sugeriram parlamentares, segundo relato do próprio Itamar, que não revelou os nomes dos deputados.

Atuação no Meio Ambiente com maior relevância – No primeiro mandato do Governo Fernando Henrique Cardoso, Gustavo Krause aceitou assumir mais um desafio: o Ministério do Meio Ambiente, num instante em que o País assiste, perplexo, ao aumento da devastação da mata amazônica. Imbuído de levar a efeito o desenvolvimento sustentável, sua agenda ambiental foi marcada por conflitos, em particular no que diz respeito à preservação da Amazônia e outros biomas, ao uso do solo para agricultura, pecuária e mineração e ao represamento de rios para geração de energia elétrica. Teve dificuldade de fazer respeitar a lei em regiões remotas do País e a política ambiental dividiu de FHC tanto a sociedade gerou reações de governadores. A riqueza da biodiversidade brasileira e os novos instrumentos de atuação do Estado e da sociedade estimularam várias ONGs ligadas ao meio ambiente a se instalar no Brasil, as quais Krause soube ter uma excelente relação. Mas com Krause no Meio Ambiente, o Brasil passou a assumir um protagonismo cada vez maior na área ambiental com ações voltadas à proteção do meio, com destaque para a questão da mudança do clima.

Um caso raríssimo na vida pública: disputar um cargo de vereador depois de governar o Estado – Contrariando todas as regras e princípios do jogo da política, em 1988, dois anos após deixar de bater ponto como governador no Palácio do Campo das Princesas, Gustavo Krause se lança candidato a vereador do Recife pelo PFL e saiu das urnas consagrado: 21 mil votos. Sua decisão pegou o mundo político do Estado de surpresa, porque não há ninguém no País que tenha deixado a função relevante de governador para se submeter em seguida ao teste das urnas para vereador, estágio inicial da grande maioria dos que entram na vida pública. Mas seu gesto foi entendido como um sinal de valorização da política municipalista. Provavelmente inspirado na filosofia de que o caminho mais certo de vencer é tentar mais uma vez, a chegada à Câmara de Vereadores do Recife lhe deu régua e compasso, mídia mais do que imaginava, para dois anos depois se eleger deputado federal.

Compositor de frevo vencedor no Fantástico, encheu de orgulho as mulheres com o “Adoro celulite” – Além de político e gestor público, Gustavo Krause é um escritor primoroso, construtor de frases antológicas. Também boêmio e poeta, compôs um frevo, em parceria com o compositor e cantor Jota Michiles, vencedor do Concurso de Marchinhas promovido pelo Fantástico. A música ‘Adoro Celulite’ faz uma homenagem às mulheres comuns e derrubou mais de 1,3 mil canções para chegar à final do concurso. Numa entrevista, ele contou que se arriscou como compositor quando estava em um spa. “Eu estava tentando emagrecer, mas chegou um cabra safado para acabar com minha dieta e a gente fez nascer esta canção de protesto, de contestação à ditadura da magreza”, disse, afirmando que gosta de mulher gordinha. “Eu acho que essa camadinha de gordura é melhor que aquela musculatura dura, que não parece muito com mulher”, destaca. “Gordinha, linda Afrodite/parei no seu it de anjo barroco/você me deixa louco com seu apetite/acredite/adoro celulite!”, diz a composição de Krause, que nasceu na década de 1990. Na época, o cantor de frevo Almir Rouche conheceu a canção e fez questão de gravá-la. Ele disse que se identificou porque a música tem tudo que uma canção de carnaval precisa. “Tem alegria, energia e irreverência e não desmerece ninguém. Música de carnaval tem que ser assim, tem que levantar o espírito. E, até hoje, esta é uma das canções mais irreverentes que já gravei”, disse Rouche.

CURTAS

NAS ESCRITAS, VALOR AO FREVO E A CAPIBA – Krause empresta seu talento hoje como articulista na mídia. Em recente artigo para o site Metrópoles, fez loas ao grande Capiba, um dos maiores compositores do País. “Descontados o ufanismo e a mania pernambucana de grandeza, “Pernambuco tem uma dança que nenhuma terra tem”. É o primeiro verso da letra que termina com “É frevo meu bem” de Capiba, um gênio pernambucano de talento universal”, escreveu, para acrescentar: “Para os que imaginam Capiba como o maior compositor de frevo, é importante salientar que sua primeira composição foi uma valsa (Meu destino) e o primeiro prêmio foi um tango: “Flor, as ingratas”. Sua obra é um precioso acervo criador de mais de duzentas composições: sambas, maracatus, valsas, cirandas, mais de cem frevos e músicas eruditas. Com parcerias de consagrados poetas, compositores e cantores”.

PRISCILA, A HERDEIRA POLÍTICA – Gustavo Krause tem cinco filhos, três do primeiro casamento com Cléa Borges, e dois do segundo com Débora. Priscila é a única da prole que herdou a vocação política do pai, que tem ainda Daniela, Manoela, Arthur e Lara. Antes de ser eleita vice-governadora na chapa de Raquel Lyra, Priscila foi, como o pai, vereadora do Recife e depois deputada estadual.

Por: Magno Martins

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