Série governadores: Marco Antônio de Oliveira Maciel

 

Capítulo 15

Dos políticos que chegaram a governar Pernambuco sem passar pelo crivo do voto antes do reencontro do Brasil com a democracia, os chamados governadores biônicos, Marco Antônio de Oliveira Maciel, ou simplesmente Marco Maciel, foi o último. Indicado pelo presidente Ernesto Geisel e pelo futuro presidente João Batista Figueiredo, Maciel foi eleito para o cargo pela Assembleia Legislativa do Estado em setembro de 1978. Tomou posse em março do ano seguinte, após concluir seu mandato na Câmara dos Deputados.

Também conhecido como o “Marco de Pernambuco”, já queria ser governador quatro anos antes, em 1974, quando perdeu, numa eleição interna na Assembleia Legislativa, a indicação, também de Geisel, para José Francisco de Moura Cavalcanti, a quem sucedeu em 78. Maciel já era um político nacional. Em novembro de 1976, dois antes de chegar ao poder no seu Estado, foi eleito presidente da Câmara dos Deputados para o biênio 1977-1978 e assumiu o cargo em 28 de fevereiro de 1977.

Em abril daquele ano, o presidente Ernesto Geisel decretou o fechamento provisório do Congresso Nacional, sob o pretexto de implementar a reforma no Poder Judiciário proposta pelo governo, cujo encaminhamento vinha sendo sistematicamente obstruído pela oposição. Impotente diante da decisão do Executivo, Maciel procurou minimizar a importância do fato, declarando tratar-se de mera rearrumação institucional.

O “recesso” do Congresso vigorou por 14 dias e resultou na decretação do chamado “pacote de abril”, conjunto de medidas destinadas a garantir a hegemonia da Arena no cenário político nacional, ameaçada pelos resultados das eleições legislativas de 1974 e municipais de 1976, que revelaram notável crescimento do partido oposicionista, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Com a extinção do bipartidarismo em novembro seguinte e a consequente reformulação partidária, participou da organização do Partido Democrático Social (PDS), agremiação que substituiu a Arena na sustentação ao regime militar.

Entre as principais iniciativas de seu governo em Pernambuco, destacou-se o projeto Asa Branca, que visava ao desenvolvimento econômico da região semiárida por meio de perenização de rios, construção de estradas vicinais e eletrificação rural. Executou também o projeto Viver, programa de apoio às populações da zona canavieira financiado pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e pelo Banco Nacional da Habitação (BNH), destinado a minimizar as tensões sociais naquela área com a construção de casas e estradas vicinais. No período do seu governo, o Estado viu avançar obras estruturadoras, como o Complexo Industrial Portuário de Suape.

Em 1982, último ano de sua administração, a Corveta Forte de Coimbra foi o primeiro navio a atracar no porto. Marco Maciel também obteve financiamento para o Metrô do Recife e implantou um programa habitacional com mais de 100 mil casas e criou 167 mil vagas na Educação. Além disso, estendeu a rede de abastecimento de água para dezenas de cidades em Pernambuco e tirou do isolamento das comunicações todas cidades do interior, implantando o posto telefônico da Telpe.

O mote do Governo era Desenvolvimento com Participação – Com o lema “Desenvolvimento com participação”, Marco Maciel levou ações do seu Governo para todos os recantos do Estado, auxiliado por uma equipe de técnicos qualificados, como Aloísio Sotero, escolhido para a Secretaria de Agricultura; Margarida Cantarelli, na Casa Civil; Francisco Bandeira de Mello, na Cultura; Roberto Pereira (Educação), e políticos que mais tarde vieram a se projetar na vida pública, como Gustavo Krause, José Jorge Cavalcanti, Joel de Hollanda, Silvio Amorim, Romero Jucá, e tantos outros. Fez uma gestão marcante no desenvolvimento econômico e social do Estado. Empreendeu o mais arrojado programa habitacional com a construção de 100 mil casas, priorizando a educação, cultura e turismo, a saúde, o saneamento e água para o sertanejo. Deu início concretamente à implantação do Complexo Industrial Portuário de Suape. Implantou o Metrô do Recife e quando vice-presidente da República fez a sua ampliação.

Monitoramento do governo era feito em reuniões num ônibus – Nos fins de semana, Marco Maciel montava uma caravana com os seus secretários em viagem pelo interior do estado. O objetivo era verificar obras em andamento ou inaugurá-las, além de ouvir a população. Eram verdadeiras maratonas, geralmente começando às sextas-feiras e só encerrando já tarde da noite dos domingos. Enquanto percorria longos percursos, Maciel aproveitava o tempo para despachar com a equipe, ouvir sugestões e fazer cobranças, uma espécie de monitoramento, como Eduardo Campos fazia em seu governo, só que a portas fechadas, ao longo de um dia inteiro, no Palácio do Campo das Princesas. Em sua gestão, Maciel tirou do papel também a ampliação do Aeroporto dos Guararapes, a duplicação do trecho Prazeres/Cabo, na BR-101, a construção do gasoduto Pilar-Cabo, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Partiu dele o Centro Regional de Ciências Nucleares, pioneiro no Nordeste, o primeiro Centro de Desenvolvimento tecnológico na área de Ciência Nuclear.

Barragens do projeto Asa Branca se derreteram feito Sonrisal – “Louvado seja Deus/Abençoada a canção/Louvado seja o homem/Que dá água para o Sertão”, cantou Luiz Gonzaga, ao celebrar a iniciativa do governador Marco Maciel ao criar o projeto Asa Branca, voltado para perenização dos rios sertanejos. Inspirado numa canção de Gonzagão, que fala do pássaro símbolo do Sertão tangido pela seca, o projeto era ambicioso. A meta hídrica previa a perenização de inúmeros rios, com a utilização de águas acumuladas em reservatórios reguladores, distribuídas em sucessivas barragens, utilizando, inclusive, águas do Rio São Francisco. O projeto envolvia, ainda, a perfuração de milhares de poços para uso humano e animal, impermeabilização de barreiros, construção de adutoras e a recuperação de barragens, entre outras ações. Em geral, as intenções visavam ajustar as metas de vários órgãos do governo a seus objetivos, como no caso da construção de estradas e eletrificação rural. Muitas das obras relacionadas pelo projeto foram concluídas, mas quase metade das barragens sucessivas foram danificadas ou destruídas completamente um ano depois, em 1981, pelas chuvas intensas. Essa fragilidade deveu-se, também, segundo estudo do Condepe, à rapidez da construção das barragens, com obras iniciadas antes mesmo da entrega dos projetos executivos. Resultado: grande parte estourou. Foi embora um sonho. O projeto ganhou a marca do improviso, as barragens ficaram conhecidas como obras com cara de Sonrisal, que logo se dissolve. Mas Luiz Gonzaga ainda fez a música Projeto Asa Branca, contando os feitos de Marco Maciel. “Bendito foi o momento/De divina inspiração/Quando feita a conclusão/De um grande planejamento/Dia onze de dezembro/Do ano setenta e nove/Vem à tona e se promove/Uma ideia rica e franca/ Marco Antônio Maciel/Criou o Projeto Asa Branca”.

Ingresso na vida pública começou pelo movimento estudantil – Marco Antônio de Oliveira Maciel nasceu em Recife no dia 21 de julho de 1940, filho de José do Rego Maciel, deputado federal por Pernambuco de 1955 a 1959, e de Carmem Sílvia Cavalcanti de Oliveira Maciel. Estudou na Faculdade de Direito da Universidade de Pernambuco, concluindo o curso em 1963. Por duas vezes, dirigiu o diretório central dos estudantes da instituição e, em 1963, assumiu a presidência da União dos Estudantes de Pernambuco. Sua atuação na política estudantil caracterizou-se pela oposição à linha ideológica de esquerda então predominante na União Nacional dos Estudantes (UNE), entidade da qual se desligou naquele mesmo ano por intermédio de manifesto publicado na imprensa. Na mesma época, alinhou-se às forças políticas que se opunham ao governo de Miguel Arraes em Pernambuco (1962-1964). Após o movimento político-militar de março de 1964 que depôs o presidente João Goulart e cassou o mandato de Arrais, Marco Maciel foi convidado pelo governador Paulo Guerra (1964-1967) para exercer o cargo de secretário-assistente do governo de Pernambuco. Devido à pouca idade, não pôde aceitar o convite, mas atuou como assessor do governador. No pleito de novembro de 1966 elegeu-se deputado estadual em Pernambuco na legenda da Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido de sustentação do regime militar. Empossado em fevereiro do ano seguinte, exerceu a liderança da bancada governista durante toda a administração do governador Nilo Coelho (1967-1971). No pleito de novembro de 1970 elegeu-se deputado federal por Pernambuco, na legenda da Arena, assumindo em fevereiro seguinte sua cadeira na Câmara dos Deputados. Membro efetivo da Comissão de Minas e Energia e suplente das comissões de Economia, de Relações Exteriores e da Bacia do São Francisco, integrou ainda o grupo de trabalho formado para estudar a atualização do regimento interno da Câmara. Em 1972, tornou-se segundo-secretário do diretório nacional da Arena, passando no ano seguinte a primeiro-secretário. Nessa época, o partido era presidido pelo senador Filinto Müller. No pleito de novembro de 1974 reelegeu-se deputado federal por Pernambuco. No ano seguinte seu nome foi cogitado pela corrente liderada pelo ex-governador Nilo Coelho para ser o candidato arenista à sucessão de Eraldo Leite no governo de Pernambuco, ao mesmo tempo que seu pai era indicado para o mesmo cargo pelo também ex-governador Paulo Guerra. O nome escolhido, no entanto, acabou sendo o de José Francisco de Moura Cavalcanti, eleito por via indireta e empossado em março de 1975.

Apagador de incêndios, fez a articulação do Governo FHC com o Congresso – Marco Maciel exerceu todos os cargos que um político almeja: deputado estadual, deputado federal, governador, senador da República, ministro de Estado, vice-presidente e presidente da República, interinamente, por mais de 80 vezes. Vice de Fernando Henrique Cardoso, tomou posse em 1º de janeiro de 1995. No exercício do cargo, manteve seu prestígio como negociador político, a um só tempo discreto e influente. Com bom trânsito no Congresso Nacional, foi designado por FHC como articulador político do governo, função até então tradicionalmente exercida no país pelo chefe do Gabinete Civil. Dessa forma, coube a Maciel coordenar as negociações em torno da aprovação das reformas constitucionais defendidas pelo novo governo, entre as quais se destacavam as reformas administrativa e fiscal voltadas para o controle do déficit público, a reforma da previdência social, a quebra do monopólio estatal sobre o petróleo e as telecomunicações, o fim da estabilidade para os servidores públicos e a extinção dos obstáculos à atuação de empresas estrangeiras no País. Em janeiro de 1996, criticou publicamente o envolvimento de ministros nas eleições municipais previstas para outubro daquele ano, receando possíveis abalos na base de sustentação do governo federal. Ao mesmo tempo, voltou a criticar a reeleição para a Presidência da República e demais cargos executivos, tese que então ganhava força nos pronunciamentos de destacados líderes governistas. Ainda em junho daquele ano, entrou em atrito com o ministro das Comunicações, Sérgio Mota, um dos mais entusiasmados defensores da aprovação da emenda constitucional que abriria caminho a um possível segundo mandato presidencial consecutivo de Fernando Henrique. Dois meses depois, porém, acompanhando a mudança de posicionamento de seu partido, Maciel aderiu à tese da reeleição, tornando-se um dos principais defensores de sua aprovação no Congresso, afinal efetivada. Maciel teve seu nome confirmado como candidato a vice na chapa de Fernando Henrique Cardoso nas eleições presidenciais de outubro de 1998. A reeleição do presidente foi, então, defendida pelos mesmos partidos que o apoiaram no pleito anterior e teve ainda a adesão do Partido Progressista Brasileiro (PPB), liderado pelo ex-governador paulista Paulo Maluf. Realizado o pleito, a chapa Fernando Henrique/Marco Maciel venceu a disputa novamente no primeiro turno, com 53% dos votos válidos, derrotando, mais uma vez, Luís Inácio Lula da Silva, candidato de uma coligação de esquerda comandada pelo PT.

CURTAS

O FIM DA GUERRA EM EXU – Em 1982, atendendo a uma intervenção que Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, fizera ao vice-presidente Aureliano Chaves, no exercício da Presidência, Maciel acabou com a guerra das famílias Alencar, Peixoto e Sampaio na sangrenta Exu, promovendo uma intervenção administrativa. Nomeou o Coronel Moura como interventor. Deu certo. Exu era uma tristeza só. O derrame de sangue deixou marcas e uma dor que pareciam não sumir nunca das lembranças dos seus moradores. Deixou cerca de 60 mortos apenas no período mais duro – da década de 1940 ao início dos anos 1980.

FAMÍLIA E IMORTAL DA ABL – Com Anna Maria Ferreira Maciel, com quem foi casado por quase meio século, Marco Maciel teve três filhas – Gisela e Cristiana – e um filho, João Maurício, que lhes deram cinco netos. Em 3 de maio de 2004, foi eleito imortal da Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira que pertencia ao jornalista Roberto Marinho, das Organizações Globo. Escreveu, dentre outros livros, “Vocação e Compromisso”, “Educação e Liberalismo”, “Liberalismo e Justiça Social”, “Ideias Liberais e Realidade Brasileira”, “Tempos de Mundialização”, “Reformas e Governabilidade”, “Palavras, ações, obras” e “Política das Ideias”. Também foi autor de mais de uma centena de plaquetes de assuntos de relevância para a sociedade brasileira.

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