TRT-15 proíbe pagamento por produção a cortador de cana
Por ser uma atividade penosa capaz de levar o trabalhador à morte por exaustão, o corte de cana não pode ser remunerado por produção. Esse foi o fundamento do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, em Campinas, para manter sentença que obriga uma usina a abandoar o pagamento de trabalhadores pela quantidade de cana cortada.
Em um voto longo e duro, o relator, desembargador Helio Grasselli, afirma que o pagamento por produção no setor sucroalcooleiro remonta aos abusos da Primeira Revolução Industrial, uma vez que leva o trabalhador aos seus limites físicos e mentais para mesmo assim receber no final do mês um salário aviltante. A remuneração média no setor não chega a R$ 1 mil.
“Justamente porque a atividade realizada pelo cortador de cana é diferenciada (haja vista sua insalubridade inerente; e, obviamente, sua penosidade inconteste), a remuneração desses trabalhadores por critério de produção deve ser proibida”, afirmou o relator.
Segundo um estudo que embasou a decisão, para se manter empregado, cada trabalhador deve cortar no mínimo 10 toneladas de cana por dia, sendo que a produtividade média atual é de 12 toneladas diárias. Considerando essa média, em um dia de trabalho, um cortador caminha 8,8 km, dá 366,3 mil golpes de facão, carrega 12 toneladas de cana em montes de 15 kg cada, faz 36,6 mil flexões de perna para golpear a cana, e perde em média 8 litros de água.
No caso dessa usina, o cálculo da remuneração conjugava metros cortados x tonelada, método considerado pelo relator de difícil entendimento por parte dos trabalhadores. “Percebe-se que o empregado faz o seu trabalho, corta a cana, após isso, todo o cálculo da remuneração fica a cargo da ré, apesar de estarmos em pleno século XXI, na sociedade da informação, da internet, da comunicação instantânea, ainda assim, o sistema e os meios de realização dos cálculos remontam ao século XVIII”, disse.
Condenada em primeira instância, a usina recorreu ao TRT com a alegação de que a remuneração por produção está amparada na legislação e que o Ministério Público do Trabalho não teria legitimidade para tutelar “direito individual heterogêneo”.
Sobre esse conceito, o relator afirmou tratar-se de uma invenção da ré para a noção de interesses individuais homogêneos, cuja tutela por parte do Ministério Público já foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal.
“A tese reacionária de se criar os interesses ou direitos ‘individuais heterogêneos’, a par das três categorias previstas na Lei 8.078/1990, é nítida tentativa de escapar da jurisprudência uniforme da Corte Constitucional acerca da ampla legitimidade do Ministério Público do Trabalho na defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores”, disse o relator.
O acórdão manteve a multa de R$ 1,5 mil por trabalhador atingido a cada mês de descumprimento da decisão. A corte deu 180 dias, a contar da intimação do trânsito em julgado, para o cumprimento da decisão.