Por Daniel Leite
Da Folha de Pernambuco
A vida pública do deputado Eduardo Cunha (PMDB) é marcada por manobras e escândalos de corrupção, desde o início. Porém, enquanto presidente da Câmara Federal, sua capacidade de articulação tomou outra proporção. Além de dificultar a tramitação de matérias caras ao Planalto, articulou a aprovação de projetos polêmicos, usou o impeachment da petista para se blindar das investigações sobre sua participação no esquema de corrupção na Petrobras e favoreceu, até mesmo, a troca de tapas entre membros do Conselho de Ética da Casa, que se debruçam sobre sua cassação. Em um ambiente onde o conservadorismo impera progressivamente, a atuação de Cunha provoca uma séria reflexão sobre a solidez das próprias instituições democráticas brasileiras, que se vêem submetidas aos mais diversos tipos de tramas e interesses.
Em fevereiro, o peemedebista venceu a eleição para presidente da Câmara, com 67 votos, ao derrotar o candidato do governo, Arlindo Chinaglia (PT). Na ocasião, disse que “o parlamento soube reagir no voto” à tentativa do Governo de impedir sua vitória. No mesmo mês, reeditou a CPI da Petrobras e autorizou o uso de verba parlamentar para compra de passagens aéreas para cônjuges de deputados, a fim de cumprir uma de suas promessas de campanha. No mesmo sentido, anunciou a construção de um “parlashopping”, que abrigaria um centro de compras orçado em cerca de R$ 1 bilhão. A obra, que recebeu diversas críticas pelo elevado custo, terminou sendo abortada, em outubro, em função da crise econômica atual.
Em maio, três meses após os membros da comissão especial criada para tratar da reforma política apresentarem o relatório final, Cunha decidiu ignorar o documento. Isso porque o texto, construído depois de inúmeras consultas e estudos, não adotou uma proposta de seu interesse: implantar o sistema eleitoral chamado de Distritão, que acabaria com o quociente eleitoral vigente. Nele, os candidatos mais votados, independente da coligação, sairiam vitoriosos, o que beneficiaria diretamente os políticos do PMDB.
Dentro da mesma discussão, o peemedebista realizou uma manobra para aprovar a continuidade do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. Ao ver derrotada a proposta, no plenário, articulou a apresentação de um projeto com o mesmo conteúdo, que terminou sendo aprovado. Mais uma vez, sua atuação gerou uma série de insatisfações e questionamentos sobre a validade das decisões tomadas pelo Parlamento.
Em julho, após a proposta de redução da maioridade penal ter sido rejeitada na Câmara, Cunha repetiu o feito. Em uma segunda votação, conseguiu apoio da oposição para aprovar uma emenda aglutinativa, que continha o mesmo conteúdo da matéria que já havia sido derrotada.
No mesmo período, ao ser acusado de receber uma propina de US$ 5 milhões, pela sua participação no esquema de corrupção da Petrobras, decidiu se alistar nas fileiras da oposição e partiu para o ataque frontal contra o governo. Com isso, trabalhou para derrubar uma série de vetos presidenciais, que poderiam gerar um custo extra ao Executivo de R$ 23,5 bilhões em 2016, prejudicando ainda mais o ajuste fiscal tocado pelo Planalto.
Da mesma forma, acelerou a aprovação das contas dos ex-presidentes Itamar Franco, Fernando Henrique e Lula, com o objetivo de abrir caminho para análise das contas da presidente Dilma, reivindicada por setores da oposição. Em outubro, o Tribunal de Contas da União (TCU) tomou a inédita decisão de rejeitar as contas da petista relativas a 2014, o que favoreceu a abertura do impeachment da presente, em curso.
Em seguida, criou o rito do impeachment, com o intuito de viabilizar a derrubada do governo. Conforme sua decisão, caso optasse pelo arquivamento do pedido, o plenário poderia recorrer da decisão. Isso tiraria sua responsabilidade direta pelo afastamento de Dilma. O rito, entretanto, foi barrado pelo Supremo Tribunal Federal.