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Foto: Priscilla Melo/DP Foto |
As primeiras chuvas de 2025 que atingiram o Recife deixaram ainda mais explícita a quantidade de lixo que os moradores descartam de forma irregular em diversos pontos da cidade. Os alagamentos causados pelo temporal deixaram são a prova de como este crime ambiental prejudica não só a natureza, mas a população.
Cenas de diversos lixos espalhados pelas ruas cheias de lama depois das chuvas e de canais entupidos repercutiram nas redes sociais nos últimos dias. Populares tiveram que desviar da sujeira que não foi causada pela chuva, mas pelos próprios moradores, que não se surpreendem em ver pneus, calçados e até móveis espalhados pelas ruas.
Apesar de ser praticado com frequência, o descarte irregular de lixo é um crime ambiental e pode resultar em multas e/ou detenção, dependendo da gravidade. Jogar lixo em terrenos baldios, margens de estradas e rodovias e em cursos d’água é proibido e está previsto na Lei nº 9.605/98.
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Foto: Priscilla Melo/DP Foto |
Os canais do Recife foram amplamente impactados pelo descarte ilegal de lixo, que dificiltam a drenagem da água. Esta, por sua vez, acaba retornando mais suja para a casa dos moradores por meio dos alagamentos.
“Estudos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e da BRK relatam que há uma maior facilidade de encontrar os resíduos como bitucas de cigarro, tampinhas, canudos plásticos, embalagens de alimentos de si e embalagens plásticas. Acredito que o plástico seja pior que a bituca de cigarro, pois tem o potencial de fazer a vedação da calha pluvial”, explica o engenheiro ambiental Gabriel Mendes.
De acordo com o engenheiro, os pequenos lixos, por mais inofensivos que sejam, podem se tornar um grande problema com o passar do tempo por conta do alto número de descarte e acúmulo.
“Os bueiros possuem grades de proteção que fazem uma pré-filtragem dessa calha de água para que o resíduo e folhas não passem. Porém, os resíduos menores conseguem passar por esses sistemas e se acumulam em lugares que acabam causando obstrução. Então as sacolas e as bitucas de cigarro, geralmente, conseguem passar por esses pré-filtros e se acumular em um ponto que se torna um local de obstrução da calha”, complementa Gabriel Mendes.
A Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife (Emlurb) informou que promove anualmente a limpeza dos 99 canais que cortam a cidade, um custo de R$ 9 milhões aos cofres públicos. Todos os anos, esses sistemas de macrodrenagem recebem ao menos uma vez a ação de limpeza.
Esse montante de R$ 9 milhões seria o equivalente aos recursos necessários para construir duas creches ou ainda quase o valor total para erigir duas Unidades de Saúde da Família (R$ 4.4 milhões).
O montante seria ainda o suficiente para a construção de quatro encostas, que protegeriam cerca de 700 pessoas, para realizar o dobro do que foi investido na requalificação e construção de todos os banheiros da orla de Boa Viagem (R$ 4,8 milhões) e para construir mais quatro parques alagáveis na cidade (R$ 2,5 milhões cada).
Apenas com os recursos destinados para a limpeza do canal do Jiquiá (R$ 400 mil), a Prefeitura poderia implantar cinco escadarias com corrimões em áreas de morro.
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Foto: Priscilla Melo/DP Foto |
Parte das pessoas que descartam os lixos de maneira irregular não pensam nas consequências que este ato causa ao meio ambiente e os danos aos cofres públicos. Mesmo depois das consequências sofridas por esta prática, as ruas amanhecem cheias de lixo no dia seguinte. É como enxugar gelo.
Para o engenheiro ambiental Gabriel Mendes, as pessoas não mudam as atitudes por não conseguirem observar os efeitos cumulativos do descarte irregular.
“Isso ocorre porque a pessoa não consegue observar de forma clara aquele efeito e pensar que é uma tampinha, só um chiclete, só uma bituca de cigarro. Voltamos novamente para a questão da educação e da informação para que as pessoas entendam esses pequenos atos e como eles acumulados são impactantes”, pontua.
Diante deste problema a Prefeitura do Recife pretende penalizar quem joga lixo nos canais da cidade. Segundo o prefeito João Campos (PSB), a possível aplicação de multa para estas pessoas será analisada depois de uma revisão no código de limpeza do Recife.
Se você descartar, eu descarto
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Foto: Priscilla Melo/DP Foto |
O efeito “Maria vai com as outras” também contribui para que o lixo se acumule em ruas, pontes e terrenos baldios da capital. Mas aqueles resíduos não foram parar ali da noite para o dia e não pertencem a uma única pessoa.
O acúmulo de lixo em um determinado ponto acontece de forma quase que despojada, uma vez que os moradores tendem a fazer os descartes em locais já conhecidos, como terrenos baldios, e que sabem que outras pessoas farão o mesmo.
O lixo acumulado produz um líquido denominado de chorume, que tem uma coloração escura com cheiro desagradável e capaz de atingir águas subterrâneas, como aquífero, lençol freático. Tanto o solo quanto as pessoas podem ser contaminadas por estes lixos. As mais vulneráveis são aquelas que possuem contato com áreas de deslizamentos de encostas, assoreamento de mananciais e enchentes.
“A bituca de cigarro, por exemplo, possui acetato de celulose, que se decompõe bem lentamente, libera várias substâncias tóxicas que contaminam o solo, lençol e o lençol freático. É um resíduo que tem fácil movimentação e potencial de realizar uma contaminação de água e de solo”, explica Gabriel Mendes.
O acúmulo de lixo também contribui para a penetração de microplásticos no solo. Estas são partículas de plástico com até 5 milímetros de diâmetro que podem ser encontradas em animais consumidos por humanos, no solo, no ar e na água.
“Existem várias pesquisas que tratam de mudanças como porosidade, permeabilidade de solo, alteração da infiltração na água e saúde do solo em si. O microplástico interfere bastante nisso, pois ele vai criando uma camada que pode impermeabilizar a entrada de água no solo e isso para o efeito da drenagem é bem pesado. Além disso, o microplástico tem o poder de transportar outras substâncias orgânicas e metais pesados. E tudo isso causa um impacto muito grande de efeito cumulativo na cadeia e no solo. Ele é um facilitador de transporte desses elementos”, frisa o engenheiro ambiental.
Para evitar estes danos ao meio ambiente, a Emlurb promove a coleta seletiva em 65 bairros do Recife. A ação é feita por 10 cooperativas de reciclagem cadastradas pelo município.