Por Ricardo Antunes
Mesmo com a entronização no governo de deputados do Centrão, a recriação do imposto sindical dificilmente passará no Congresso. Por uma razão simples: tem tintas ideológicas e traz a triste memória do peleguismo nos sindicatos. Mais: se vier efetivamente a ser transformada em projeto de lei, a volta do imposto sindical altera uma decisão cara ao liberalismo professado pelo Centrão, a reforma trabalhista aprovada em 2017, que extinguiu a obrigatoriedade da sua cobrança.
A reforma trabalhista e o consequente fim da obrigatoriedade do imposto sindical foram aprovados em 2017 com folga nas duas Casas: 296 votos a favor contra 177 na Câmara dos Deputados e por 47 a 27 no Senado.
É bastante lembrar que, recentemente, o governo perdeu feio quando tentou alterar, por decreto, dispositivos do marco legal do saneamento, aprovado em 2020 com medidas que facilitaram a participação da iniciativa privada no setor. Os dois decretos foram revogados na Câmara dos Deputados, obrigando o governo a editar outros dois, mais palatáveis.
A ideia do retorno da contribuição sindical vem sendo discutida entre entidades sindicais e o Ministério do Trabalho, que já elaboraram uma minuta de projeto, revelada pelo jornal O Globo. O ministro Luiz Marinho diz que o governo pretende enviar o projeto de lei ao Congresso em setembro.
O líder do União Brasil no Senado, Efraim Filho (PB), já avisou que o imposto sindical tem memória negativa no Congresso e teve a obrigatoriedade revogada por larga margem de votos. “Dificilmente este entendimento será revertido”, disse Efraim em entrevista a O Globo.
ATÉ 1%
A proposta em discussão entre o Ministério do Trabalho e as centrais sindicais prevê a cobrança do imposto até o teto de 1% da remuneração anual do trabalhador, a ser descontado na folha de pagamento.
DOURANDO A PÍLULA
Para dourar a pílula, as centrais sindicais estão chamando o imposto, em nota oficial, de “contribuição negocial”, porque o valor será discutido nas negociações coletivas de trabalho. Insinuam que não será compulsório. Mas se não for aprovado na negociação coletiva, o acordo coletivo de trabalho não vale – isto é, na prática a “contribuição negocial” é compulsória, sim.
TRIPLICAR
O finado imposto sindical, que irrigou os sindicatos pelegos, sem representatividade e poder de negociação com os patrões, equivalia a um dia de trabalho. O teto de 1% em discussão entre o Ministério do Trabalho e as centrais sindicais representará três dias e meio de trabalho – ou seja, mais do que o triplo.
QUADRUPLICAR
O cálculo é do professor da USP José Pastore, especialista em relações do trabalho. A nova contribuição pode quase quadruplicar comparativamente à contribuição anterior. Segundo Pastore, antes um trabalhador que ganhava R$ 3 mil mensais tinha de pagar R$ 100 ao ano, por exemplo. Com o novo teto, considerando o 13º salário, a remuneração anual pode chegar, em média, a R$ 39 mil, o que resultaria em uma contribuição sindical de R$ 390.
BAGATELA
Em 2017, até ter sua obrigatoriedade extinta, a contribuição sindical arrecadou a bagatela de R$ 3,6 bilhões, informa o Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas Sócio Econômicas). Como passou a ser opcional, deverá arrecadar, este ano, R$ 68 milhões, prevê o Dieese.