Escolas recheiam listas escolares de itens vetados pela lei; saiba quais são

Em vistorias este mês, o Procon-BA e o Codecon-BA autuaram 28 instituições de ensino por irregularidades no material escolar pedido, que vão de exigência por marca, pedido de produto de uso coletivo a falta de plano de uso

Joana Rizério e Victor Longo
Como início das aulas se aproximando, mães e pais lotam papelarias do Centro para adquirir itens da lista de material escolar, que, pela lei, nem poderiam ser pedidos pelas escolas

Parece a lista de compras de um escritório. Pede caixas de clipes, grampos, canetas, marcadores e centenas de folhas de de papel ofício. Às vezes, lembra também a de uma lanchonete – tem guardanapos, copos descartáveis e palitos de churrasco entre os itens. Poderia ser também a oficina de uma costureira, já que inclui novelos de lã, metros de chitão, de viés estampado e de tecido came. Mas são listas escolares de alunos de até 10 anos de escolas particulares de Salvador.

“O maior absurdo eu vi ontem. Uma escola pediu um quilo de farinha de trigo sem fermento”, diz o vendedor Wendell Carlisso, de uma papelaria na Avenida Joana Angélica. Segundo ele, são raras as listas de material escolar que não contenham pelo menos um item abusivo ou proibido por lei. “Esta semana apareceu uma mãe cuja lista pedia 25 potes de tinta guache. Cada um custa R$ 5,50. Ou seja, R$ 137,50 só de tinta”, diz.

A manicure Jucélia do Amor Divino, que tem um filho de 1 ano e 10 meses matriculado na Escola Tecendo o Saber, no  Jardim Esperança, diz que a sua lista “está até básica”. Deliberadamente, ela riscou alguns dos itens obrigatórios, como rolos de papel higiênico e copos plásticos, materiais proibidos de integrar listas escolares pela Lei nº 6.586, de 16/6/1994. “Só falta pedirem a água”, brinca.

O motorista Joel Miranda, 40 anos, esperou um tempinho livre no trabalho para ir à Avenida Joana Angélica comprar o material escolar do filho de 5 anos. Na cesta de compras, 12 rolos de emborrachado e cinco metros de tecido came, material usado em festas e na confecção de lembrancinhas na escola. “O problema é que, no dia das festas, eles ainda cobram uma taxa”.

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Desperdício
Na Livraria Monteiro, uma mulher que não quis se identificar se queixou dos itens pedidos pelo Centro Educacional Porto Bello, onde trabalha. “Tem coisas que eu sei que não usam, e eles pedem mesmo assim. Ano passado, pediram dois livros caros, e não deu tempo de usar o segundo. Não têm o menor planejamento”. Na lista da escola, consta o pedido de seis apontadores de lápis com reservatório.

“O que achei mais absurdo: lixa de parede. Para quê? E rolinho de pintura?”, pergunta a dona de casa Ana Cristina Batista, 32, mãe de um menino de 5 anos. “A lista da outra escola era mais reduzida. Com essa, tomamos um susto”, reclama da instituição onde o filho estuda, a Escola Pequeno Garcia, no bairro do IAPI.

marcas Ana também se queixa da exigência por marcas específicas dos produtos. Sugerir marcas também é uma prática proibida pela lei, no Artigo 3, inciso 3. “Fica vedada, sob qualquer pretexto, a indicação pelo estabelecimento de ensino, de preferência por marca ou modelo de qualquer item do material escolar”, diz a legislação.

As duas caixas de lápis de cor pedidas pela escola vêm com a indicação de uma marca – Faber Castell, que custa R$ 13,90 cada uma na loja Livros e Cia. São R$ 10 a mais do que uma outra marca com a mesma quantidade de itens – a Slim, que sai por R$ 3,90. Ou seja: se seguisse a lista, Ana Cristina gastaria R$ 20 a mais só com o item.

A mesma lista tem outras indicações proibidas: um tubo de cola da marca Cascorez,
um pote de 500 gramas de massa de modelar da marca Uti Guti e uma tesoura sem ponta da marca Tramontina ou Mundial.

O Colégio Antônio Vieira e o Colégio Miró também pedem itens proibidos. Ambas exigem, por exemplo, a compra de agendas específicas produzidas pelas próprias escolas. O Vieira indica uma livraria para a compra de materiais, além de marcas de produtos.

Papel
O Colégio Elizabeth Souza, em Cosme de Farias, pede oito unidades de um produto vetado: papel higiênico. Uma observação ao lado do item indica que o uso será para fazer papel machê. “Lá, eu nunca vi nada de papel machê. Acho que usam no banheiro mesmo”, diz a dona de casa Fernanda Dias, 35, mãe de uma criança de 3 anos.

Não importa se é para fazer machê ou para usar no sanitário. O coordenador geral da Coordenadoria de Proteção e Defesa do Consumidor (Codecon), Rubem Carneiro Filho, é categórico. “Não tem como pedir papel higiênico, pois é de uso coletivo”, diz. A mesma escola possui uma imensa lista de material de uso coletivo, incluindo, por exemplo, marcadores para quadro branco, duas resmas de papel ofício, dentre outros.

Escolas respondem, mas Procon confirma que existem ilegalidades
Colégios com listas irregulares que foram ouvidos pelo CORREIO tentaram justificar os erros, mas o Procon reiterou que os pedidos são ilegais. A diretora do colégio Elizabeth Souza, em Cosme de Farias, disse que, por se tratar de um colégio “de bairro, com mensalidade barata”, os materiais são uma espécie de ajuda dada pelos pais à escola. “Se eles não puderem dar, não é obrigatório”, afirmou.

“A mensalidade custa entre R$ 130 e R$ 140, não é suficiente para pagar os custos, até porque muitos pais não estão em dia”, justificou. O Colégio Antônio Vieira enviou uma nota, mas não justificou as irregularidades: “O Colégio Antonio Vieira informa que não recebeu nenhuma notificação do Procon sobre irregularidades na sua lista de material escolar”.

O diretor do Colégio Miró, Tadeu Coelho, afirmou que todos os materiais solicitados na lista da escola serão utilizados para fins didáticos. “No caso da agenda da escola, pedimos porque a agenda facilita a comunicação entre a escola e os pais, através de um espaço para bilhetes”, justificou. As demais escolas não atenderam os telefonemas ou não foram encontradas.

O superintendente do Procon, Ricardo Maurício, reafirmou que os pedidos constantes nas listas são ilegais. “A incidência de material de uso coletivo em lista, ainda muito comum nas nossas escolas, é ilegal. O mesmo para pedidos de material com marcas específicas”, disse. Em operação feita semana passada, o Procon notificou 17 escolas por irregularidades.

Maurício orienta os pais que tiverem problemas com a lista. “Os pais devem exigir da escola o planejamento didático-pedagógico para ver se os materiais são cabíveis”, orienta. A depender do caso, escolas podem pagar multas que vão de R$ 600 a R$ 6 milhões. Mais informações podem ser obtidas através do Procon Fone: (71) 3116-0567.

Fonte: Correio

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