Especialistas debatem educação no semiárido

Uma das propostas estudadas é a reimpressão do livro  didático “Conhecendo a  caatinga”, que aproximaria  o conhecimento dos  estudantes do semiárido ao meio em que vivem

Uma das propostas estudadas é a reimpressão do livro didático “Conhecendo a caatinga”, que aproximaria o conhecimento dos estudantes do semiárido ao meio em que vivemFoto: Ari Cipola/folhapress

Imagine o cenário em que uma criança de uma pequena escola na caatinga pernambucana decora detalhes sobre a geografia do sudeste asiático ou mesmo as características da tundra subártica. Ao mesmo tempo, ignora as peculiaridades do bioma à sua volta. A situação, real, preocupa os especialistas em educação. Ontem, no complexo multieventos da Universidade do Vale do São Francisco, na divisa entre Juazeiro da Bahia e Petrolina, no Sertão pernambucano, o assunto foi debatido por dezenas de especialistas. Um documento com propostas para uma educação contextualizada para o semiárido está sendo criado no evento, que termina hoje.

Uma das propostas trazidas no evento é a reimpressão do livro didático “conhecendo a caatinga”, em dois volumes, que aproximaria o conhecimento das crianças ao meio em que está inserido. “Ele já foi testado e se conseguirmos produzi-lo com a marca do Governo, teremos possibilidade de inseri-lo no Plano Nacional de Livro Didático e disponibilizá-lo nas cidades do semiárido”, contou a pesquisadora Edilene Barbosa Pinto, da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), responsável pelo evento. Para a pesquisadora Alexandrina Sobreira, a necessidade de contextualização já é conhecida há muito tempo. “Pesquisei, quando na Secretaria Estadual de Meio Ambiente, e descobri que o bioma mais importante para o pernambucano é o amazônico. A caatinga é apenas o quarto.”

A caatinga trazida pela educação não pode ser a já conhecida, sinônimo de problemas, de acordo com o doutor em sociologia José Souza da Silva, um dos conferencistas do evento. “Só falar sobre o semiárido num material didático não é suficiente para dizer que se está contextualizando. É preciso pensar em qual sociedade queremos para que se pense na educação que precisamos para chegar lá.

Até então se mantém a ideia de que o mundo é um mercado. Antes, de que era uma máquina, focava-se na indústria. Mas não é nem um nem outro. É uma trama de significados e práticas que dão sentido à vida”, contou o pesquisador da Embrapa.

A noção de mundo como mercado também incomoda o ex-presidente da Fundaj, Paulo Rubem Santiago, quando o tema é a educação. Segundo ele, que acatou as propostas das pesquisadoras e deu o pontapé inicial ao evento, há 13 meses, não há como financiar o bem-estar social sob a perspectiva do capital. “O Plano Nacional de Educação (PNE) é um pilar de um projeto de nação, algo que não interessa o capital internacional. Sob essa égide, o semiárido é importante para exportação agrícola.”

Para Rubem, é importante que se destaque o semiárido no Plano Nacional de Educação. É necessário que haja um observatório só para essa região. “Porque, historicamente, é a área que tem uma necessidade específica. Onde há mais escolas precarizadas”, explicou o professor da UFPE. “Na fase atual de acumulação do capital que estamos, não é possível reconhecer o protagonismo e a autonomia dos movimentos sociais para a superação do atraso e da construção do novo.”

Nesse sentido, a noção de que a escola precisa ser uma ferramenta de emancipação foi trazida à tona na mesa de abertura do evento, composta por representantes de várias organizações que trabalham diretamente com a região como a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), o Instituto Nacional do Semiárido (NSA) e a Rede de Educação do Semiárido Brasileiro (Resab). Na discussão, a secretária de educação de Petrolina, Maeve Melo, também presente, assumiu o compromisso de fazer parcerias com essas entidades e ajudar a contextualizar a educação no município. “Já fizemos isso em outra gestão, mas todo o trabalho foi descontinuado”, lamentou.

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