R$ 355 milhões gastos em 2012 com tratamentos na Justiça

A saúde é um direito garantido a todos pela Constituição. E é com este argumento que boa parte dos brasileiros que precisam de medicamentos, muitos deles ausentes na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), entram na Justiça para ter acesso ao remédio indicado no tratamento. Somente no ano passado, o Ministério da Saúde desembolsou R$ 355,8 milhões para pagar despesas com estes pacientes que buscaram os tribunais, um aumento de 34% em relação ao valor gasto em 2011. São ações movidas não só pela busca de remédios, mas por serviços que deveriam estar à disposição no serviço público, como leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e até aparelhos vitais, como um respirador artificial.

Apesar da alavancada no valor entre um e outro ano, este foi o menor crescimento desde 2005. Ainda assim, nos últimos cinco anos, o governo federal computou um aumento de 553% nos gastos com a chamada judicialização da saúde. A derrota nos tribunais que mais resulta em gasto para o ministério diz respeito a ações em que os cidadãos foram em busca de remédios para combater doenças raras, cujo tratamento chega na casa dos milhares de dólares por semestre para um único paciente.

A pasta, em geral, recorre dos casos. Algumas ações já tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF), como o caso de 85 pacientes que fazem uso do Soliris, medicamento usado no tratamento da anemia hemolítica crônica, uma enfermidade provocada pela redução dos glóbulos vermelhos no sangue. O custo do tratamento num semestre chega a quase US$ 266 mil dólares por paciente. No fim do ano passado, a presidência da Corte indeferiu o pedido da Pasta para suspender o fornecimento do remédio. O ministério recorreu, alega que o medicamento não tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e que sua eficácia não foi comprovada, mas a questão ainda não foi julgada pelo Supremo.

‘É uma escolha trágica para o magistrado’

O gasto com a compra de 10 tipos de medicamentos para doenças raras, seguindo decisão judicial, equivaleu a 72% do gasto total do ministério com a judicialização em 2012, para atender a 661 pacientes.

— É uma escolha trágica. Neste caso, existe todo um orçamento do sistema de saúde. O magistrado vai dar uma decisão que vai impactar nisso. Mas, ao mesmo tempo, tem o lado do cidadão, que pode ver seu estado de saúde piorar. É uma encruzilhada — comenta Clênio Schulze, coordenador do Comitê Executivo Nacional do Fórum da Saúde, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Segundo Clênio, justamente por esta encruzilhada é que, na dúvida, a decisão costuma ser favorável ao paciente — ele estima que, em 90% dos casos em que a demanda é contra o poder público, o cidadão sai vitorioso.

Nesta queda de braço com o poder público, o aposentado Marcus Tavares, de 52 anos, teve medo de perder. Ex-caminhoneiro, ele descobriu há sete anos que um dos rins já não funcionava. Tomava um remédio, e ele parou de fazer efeito. Teve que fazer uso do medicamento Mimpara, que controla os níveis de cálcio e fósforo no organismo. A caixa com 30 comprimidos custa entre R$ 900 e R$ 1 mil. Ele precisa de uma destas mensalmente e, sem ter como pagar, recorreu à Associação dos Doentes Renais e Transplantados do Rio. Recebeu ajuda para entrar na Justiça, em junho de 2012.

— Nunca tinha colocado nada na Justiça, mas consegui quatro meses depois. Tem gente que não consegue. Eu me senti um sortudo — contou ele, que teve uma perna amputada por conta do diabetes e vai buscar todo mês uma caixa do medicamento na Secretaria de Saúde do Rio.

Também aposentada, dona Olga da Silva, de 86 anos, estava internada quando recorreu à Justiça para conseguir fazer uma arteriografia urgente na perna, em um hospital de referência de Porto Alegre (RS). O exame permite visualizar a parte interna das artérias. A filha de dona Olga, Helda da Silva, conta que o acesso ao Hospital São Lucas, da PUC-RS, foi garantido um dia depois da sentença judicial. O caso, entretanto, se arrastou por quatro meses e só foi resolvido em abril. O juiz considerou a possibilidade de “dano irreparável ou de difícil reparação, sob risco de amputação do membro informado”.

— Depois que a Justiça mandou transferir a mãe para o São Lucas, ela foi muito bem atendida e consulta todo o mês, para acompanhar o tratamento — disse Helda. — Não tivemos mais problema nenhum com a doença dela.

mero crescente de demandas por internação, por medicamentos e pela garantia de procedimentos complexos que são retardados pelo sistema de saúde. Na dimensão em que chegamos, é prejudicial para a Justiça, para os usuários e para o próprio sistema — diz Marinês, afirmando que o número elevado de ações significa que o serviço de atendimento de saúde prestado ao cidadão não é bom e também que o usuário está mais consciente de seus direitos. (O Globo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *