‘Ataque à memória de Arraes’

Jornalista do PCdoB ataca a fusão do PSB com o PPS

arraes e eduardo

O jornalista Wevergton Brito Lima, filiado ao PCdoB, publicou ontem (18) na página do partido o artigo intitulado “Fusão entre PSB e PPS – O coro dos castrati” no qual ataca o presidente nacional do PPS, chamando-o de “trânsfuga”.

Ele diz que esta fusão é uma afronta à memória de Miguel Arraes, João Mangabeira, Jamil Haddad e outros socialistas históricos porque o PPS se transformou no Congresso numa “linha auxiliar” da direita.

Confira os principais trechos do artigo:

I- O jornal Folha de S. Paulo publica nesta segunda-feira (18) artigo intitulado “Um novo projeto para o Brasil”, assinado pelos presidentes nacionais do PSB, Carlos Siqueira e PPS, Roberto Freire. Tratando da anunciada fusão entre as duas legendas, os articulistas prometem “uma plataforma política conectada com os anseios da sociedade contemporânea”. A leitura do texto e o conhecimento sobre a trajetória recente destes partidos bastam para revelar o tamanho do embuste.

II- O artigo, publicado na página A3 do jornal paulista, é longo. Apesar disto, nele não se encontra qualquer vestígio de conceitos palpáveis que pudessem fundamentar a prometida “plataforma política”.

III- O infeliz leitor se depara com um deserto de ideias, cercado de lugares comuns e chavões. “O fundamental é olharmos para a frente”. “Convidamos a sociedade a participar desse processo (…) o que a sociedade deseja é encontrar novas formas de se expressar e participar – e o novo partido não fugirá de suas responsabilidades”. “Não devemos nos conformar jamais com a desesperança, o descalabro, a desfaçatez, o estelionato eleitoral, a corrupção”. “A nova força política que emergirá da união entre PSB e PPS acredita no Brasil”.

IV- Platitudes como estas revelam o vazio programático desta fusão, tornando pertinente o esforço para entendê-la.

V- Comecemos pelo menor número desta equação, o deputado federal Roberto Freire. Se no futuro algum historiador desocupado perder seu tempo analisando a trajetória política de Roberto Freire, terá, ao final, o trabalho de cunhar apenas uma simples frase: “Foi um trânsfuga”. Freire foi o condutor da liquidação do antigo Partido Comunista Brasileiro (PCB).

VI- Militante do PCB desde 1966, quando estudava Direito na Universidade Federal de Pernambuco, ele teria supostamente participado da organização das primeiras Ligas Camponesas.

VI -Estranhamente, em 1970 o general Médici, o mais feroz dos gorilas que infelicitaram a nação durante a ditadura militar, nomeou o “jovem advogado comunista” (28 anos) para o importante cargo de procurador do Incra. Lembremos que apenas seis antes o regime ditatorial fez o também pernambucano Gregório Bezerra desfilar pelas ruas do Recife sendo puxado por uma corda no pescoço, o que torna ainda mais intrigante este tipo de nomeação em plena ascensão da repressão.

VII- A crise do socialismo, com a queda do muro de Berlim e o fim dos regimes socialistas na Europa, encontrou em Freire um combatente com a consistência de uma manteiga. Rapidamente enfunou suas velas na direção de onde vinha o vento. Anunciou que a “luta de classes era um conceito superado”. Agora, dizia Freire, o que veríamos era a “parceria conflitiva entre capital e trabalho”.

VIII- Mudou o nome do PCB (depois refundado por militantes que não concordaram com a manobra) para PPS e para não deixar dúvidas de sua total rendição, Roberto Freire entregou à Fundação Roberto Marinho a guarda de documentos históricos do movimento comunista no Brasil.

IX- A partir daí o então Partido Popular Socialista (PPS), que surgia para ser a voz de “uma nova esquerda”, foi se transformando de fato em linha auxiliar da direita, apoiando a pauta neoliberal e assumindo um discurso cada vez mais afinado com o conservadorismo.

X- Na Câmara dos Deputados, são os parlamentares do PPS que fazem alguns dos mais histéricos discursos contra o período iniciado em 2003 com Lula presidente. Igualmente atacam a “ditadura bolivariana” na Venezuela e toda e qualquer experiência da esquerda no continente.

XI- Desmoralizado em seu estado natal, Pernambuco, Freire precisou transferir para São Paulo seu domicílio político para, sob as bênçãos dos tucanos, tentar voltar à Câmara. Mesmo com todo o empenho do padrinho Alckmin, Freire ficou apenas com a quarta suplência, mas o governador garantiu sua posse nomeando deputados titulares para o secretariado estadual.

XII- Em 2013, no entanto, sempre de olho em uma nova oportunidade, Freire tentou acabar com o PPS, fundando o MD (Mobilização Democrática), que surgiria de uma junção com o PMN. Tal movimento fracassou.

XIII- Mas agora vai. O trânsfuga prepara o PPS para a morte e engendra uma nova força, que tendo o DNA disgênico de Roberto Freire, já nasce moribunda. O PSB, fundado em 1947 por João Mangabeira e refundado em 1985 por Jamil Haddad, Evandro Lins e Silva, Antônio Houaiss, Rubem Braga e Roberto Amaral, teve, até há bem pouco tempo, uma trajetória consequente como uma força da social-democracia de esquerda.

XIV- Sobre a atual fusão, ninguém melhor para comentar do que o primeiro secretário-geral do PSB de 1985 e ex-presidente da legenda, Roberto Amaral: “Já não existe o combativo partido que se opôs a Sarney, a Collor, que fez frente a FHC e à privataria tucana (…) tudo é possível esperar de sua atual direção. Essa mesma gente entregou o partido em Santa Catarina ao clã Bornhausen, no Paraná a Beto Richa (cuja obra está estampada nas manchetes) e acolheu em seus quadros, como deputado federal, o inefável Heráclito Fortes. (…) essa fusão é moralmente inaceitável, é o ponto final do PSB. É o sepultamento, no seu programa, do socialismo, do nacionalismo e da prática de uma política de esquerda”.

XV- Na verdade, nada tem a oferecer de novo esta fusão do PSB com o PPS. Antigamente, garotos, em geral pobres e abandonados, eram castrados antes de entrarem na puberdade para que suas vozes não mudassem, garantindo assim um tom original para o coro das igrejas.

XVI – A prática da castração foi proibida apenas no final do século 19 e os castrati sumiram do mapa. A castração ideológica da esquerda é peculiar, pois neste caso não existe qualquer conotação de gênero: pode atingir indistintamente homens, mulheres ou partidos, pois do que se trata é do abandono de uma identidade e de seus compromissos basilares.

XVII- Neste sentido, PSB e PPS são os castrati do campo político. Unidas, suas vozes serão talvez agudas, mas para servir sempre ao mesmo coro de loas ao status quo do capital e da burguesia, som inevitável que embala esta união entre oportunismo e traição.

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