Cientistas investigam ligação entre remédios da classe do Ozempic e depressão; entenda

Estudo encontrou alterações cerebrais que podem explicar um aumento no risco para alguns pacientes

Um novo estudo internacional publicado na revista científica Current Neuropharmacology analisou uma potencial ligação entre os análogos de GLP-1 e alterações cerebrais associadas a um maior risco de depressão e ideação suicida. Os resultados apontaram para caminhos genéticos que podem justificar uma relação entre os sintomas e os medicamentos em determinados pacientes.

Os análogos de GLP-1 são uma classe de fármacos muito utilizada no tratamento de diabetes tipo 2 e obesidade, em expansão no Brasil e no mundo. Segundo um levantamento da IQVIA Brasil, a venda daqueles à base de liraglutida e semaglutida ( Ozempic, Wegovy, Victoza e Saxenda), dois dos remédios mais populares da classe junto à tirzepatida, do Mounjaro, cresceu 663% no país entre 2018 e janeiro de 2024.

Com a ampliação do uso dos remédios, relatos de possíveis associações com um aumento no risco de depressão e ideação suicida se tornaram alvo de análises de pesquisadores e de agências reguladoras. Embora, até agora, estudos não tenham encontrado uma ligação sólida, os pesquisadores dos Estados Unidos, Brasil, Irã e Israel fizeram novas descobertas sobre o tema.

Liderado pelo professor da Universidade Western de Ciências da Saúde, nos Estados Unidos, Kenneth Blum, o trabalho observou que os análogos de GLP-1 podem ter um efeito negativo especificamente entre indivíduos com hipodopaminergia, ou seja, que já têm a função dopaminérgica reduzida.

Os autores encontraram associações genéticas entre o uso dos medicamentos e genes como DRD3, BDNF e CREB1, que estão relacionados à regulação do humor e às vias de recompensa. Para eles, isso indica que o uso crônico nesses pacientes poderia desregular a sinalização de dopamina e agravar o risco de sintomas depressivos, distúrbios de humor e de ideação suicida.

Ozempic – Foto: Haberdoedas/Unsplash

“Este estudo não deve ser ignorado, apesar da euforia em torno dos resultados clínicos positivos dos agonistas do receptor de GLP-1. Instamos a comunidade médica prescritora a agir com cautela para evitar outra trágica onda de ‘pessoas morrendo para perder peso’”, defende Blum em comunicado.

Para o psiquiatra de dependências e professor da Universidade Washington, coautor do estudo, Mark S. Gold, o artigo “fornece evidências críticas para a reavaliação do uso generalizado” dos remédios e deveria levar as autoridades a “considerar cuidadosamente as descobertas no que diz respeito à rotulagem e ao monitoramento desses medicamentos”.

Panayotis K. Thanos, especialista em neurofarmacologia da Universidade de Buffalo, nos EUA, uma estratégia que poderá ser avaliada é a utilização de testes genéticos para entender a função dopaminérgica e o perfil de risco de dependência do paciente antes da administração dos remédios.

Estudos analisam relação
A análise do risco a partir de características específicas de cada paciente pode ser importante já que, de um modo mais amplo, não foi encontrada uma relação direta entre o uso dos análogos de GLP-1 e um aumento no risco de depressão e ideação suicida para o público-geral.

Essa foi a conclusão da análise iniciada pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) em 2023. “Os detentores da autorização de comercialização desses medicamentos continuarão a monitorar esses eventos de perto, incluindo quaisquer novas publicações, como parte de suas atividades de farmacovigilância, e notificarão quaisquer novas evidências sobre esse assunto”, disse a autarquia.

Além disso, estudos que acompanharam usuários dos remédios também não encontraram evidências de um risco aumentado de forma geral. Um deles, conduzido pelo Instituto Karolinska, na Suécia, e publicado no periódico JAMA Internal Medicine, analisou dados de 300 mil adultos entre 18 e 84 anos.

Os indivíduos tinham iniciado tratamento para diabetes com os análogos de GLP-1, com inibidores de SGLT2 ou outros fármacos entre 2013 e 2021. A comparação entre as estratégoas não encontrou um maior risco entre aqueles que tomaram o Ozempic e semelhantes.

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