Morre o físico italiano Bruno Pontecorvo

Estudioso de partículas atômicas teve formação socialista e viveu boa parte de sua vida na União Soviética
Wikicommons/Bruno Pontecorvo

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No dia 25 de setembro de 1993 o físico italiano Bruno Pontecorvo, pioneiro no estudo dos neutrinos e de suas implicações cosmológicas, morre em Dubna vítima de Mal de Parkinson. Foi assistente precoce de Enrico Fermi nos famosos estudos prévios à reação de fissão do urânio em cadeia. Parte de uma próspera família judaica, foi irmão do cineasta Gillo Pontecorvo e do geneticista Guido Pontecorvo.

Nasceu em Pisa em 22 de agosto de 1913. Em 1936 viajou para Paris para estudar os efeitos das colisões de nêutrons com prótons e a transição eletromagnética entre isômeros no laboratório de Irene e Frederic Joliot-Curie. Nesse período, foi influenciado pelos ideais socialistas defendidos a vida inteira pelo casal Joliot-Curie.

Pontecorvo não pôde jamais retornar à Itália por conta da perseguição do regime fascista aos judeus. Permaneceu em Paris até o dia no qual os nazistas a invadiram. Fugiu com a família para a Espanha e, logo em seguida, para os Estados Unidos. Lá conseguiu um emprego em uma companhia petrolífera de Tulsa, no estado de Oklahoma. Embora célebre como um dos pioneiros da era nuclear, deixou de ser convidado para o Projeto Manhattan (de construção da bomba atômica) em virtude de seus posicionamentos políticos.

Já em 1948, após obter cidadania britânica, foi convidado por John Cockcrof para colaborar no projeto da bomba atômica britânica por meio da Divisão de Física Nuclear do país. Em 1950, foi indicado para a cadeira de física da Universidade de Liverpool, que assumiu em janeiro de 1951.

No dia 31 de agosto de 1950, Pontecorvo visitava a Itália em meio a um feriado. No entanto, abandonou repentinamente Roma com sua esposa e seus três filhos sem avisar quaisquer parentes e amigos. No dia seguinte, em Estocolmo, auxiliado por agentes secretos, consegue ingressar na União Soviética. Seu desaparecimento inusitado causou enorme preocupação em meio aos serviços de inteligência dos Estados Unidos e do Reino Unido pela hipótese de vazamento de segredos nucleares. Pontecorvo, no entanto, tinha acesso limitado aos assuntos secretos de modo que jamais ficaram comprovadas as acusações de espionagem ou de transferência de segredos aos soviéticos.

Na União Soviética foram-lhe concedidos privilégios reservados apenas a pouquíssimos estrangeiros. Trabalhou até os últimos dias no atual Joint Institute for Nuclear Research, em Dubna, concentrando-se totalmente nos estudos teóricos de partículas de alta energia. Formulou a hipótese da produção associada de híperons e mesons pesados na interação forte, comprovada vários anos depois e fonte da propriedade de estranheza, número quântico que deu origem a um dos quarks da teoria de Gell-Mann.

Em 1955, numa conferência de imprensa, explicou os motivos que o levaram a trabalhar na União Soviética. Afiliado ao Partido Comunista Italiano, acreditou firmemente no projeto soviético, o que foi motivo para que não recebesse diversos prêmios que certamente merecia. Em 1956, indicou a possibilidade de reações exóticas de aniquilação de antiprótons em um núcleo, vários meses antes de Emilio Segrè descobrir o antipróton. A investigação experimental desses processos, que recebem atualmente o nome de “reações de Pontecorvo”, ocorreu 30 anos mais tarde e se converteu em um campo de investigação muito ativo.

Em 1957, apresentou uma breve memória sobre a possibilidade de que um tipo de neutrinos se transformasse em outro. Esta teoria chamada de “oscilações” se comprovou experimentalmente em 1999. O teste, realizado pelos físicos norte-americanos L. Lederman, M. Schwartz e J. Steinberger, teve o resultado previsto por Pontecorvo. Estes cientistas ganharam o Prêmio Nobel de Física daquele ano.

Em 1964, foi eleito membro de pleno direito da Academia Soviética de Ciências e agraciado com o Prêmio Lenin. Foi professor da Universidade Estatal de Moscou onde ocupou a cátedra de física de partículas elementares. Quando se desencadeou no país uma campanha contra seu colega Andrei Sakharov por defender a necessidade de uma reforma profunda do Estado Soviético, negou-se a participar, o que provocou atritos com as autoridades do país.

Foi-lhe permitido viajar à Itália em 1978, quando já mostrava sintomas do mal de Parkinson. Foi autor prolífico em artigos de investigação científica, além de exemplar tradutor para o russo dos trabalhos de Enrico Fermi. Em sua memória, foi criado o Prêmio Internacional Bruno Pontecorvo para os trabalhos individuais mais sobressalentes em física de partículas.

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