Opinião – Devagar com a Bahia!

    Maria José Lima

Cheguei à cidade da Bahia para acompanhar o ciclo de debates sobre o FUNDEB, da Comissão de Desenvolvimento Regional do Senado Federal, com jeito de paulista depois da gripe, criticando os baianos pelo atraso nos compromissos, fazendo piadinhas sobre o devagar, quase parando, dos meus conterrâneos, e no dia seguinte veio a resposta às minhas críticas, no estilo dos velhos baianos.

Devagar com a Bahia!, Uma crônica, quase poesia.  A resposta baiana às críticas, bem diferente desse estilo tosco da atualidade, veio cercada de classe, história e cordialidade.  Durante um lauto almoço no Q’ Muqueca, oferecido pela querida amiga professora Joca, sucessora de Adroaldo Ribeiro Costa, na Hora da Criança, me foi oferecida a crônica do grande jornalista e escritor centenário: Devagar com a Bahia!

Joca me contou que, certa feita, uma famosa pianista teria ido à Bahia e, contrariada com o atraso dos baianos para o início do Concerto,   deu uma entrevista à TV Bahia  dizendo que “as três velocidades dos baianos eram devagar, mais devagar e parado”.

No dia seguinte, Adroaldo Ribeiro Costa estampava em A Tarde a sua crônica Devagar com a Bahia!,  em resposta àquela pilhéria ofensiva. Poucas crônicas, do autor, causaram tanto entusiasmo para o público baiano daquela época.  Por isso resolvi compartilhar, aqui, com os demais brasileiros, apenas um trechinho da crônica de Adroaldo:

 “Sabe você, amigo, qual é a velocidade do baiano? Mas, com certeza sabe que velocidade é o espaço percorrido, numa medida de tempo. Então, devem compreender que a nossa velocidade deve ser medida pelo caminho percorrido durante quatrocentos e setenta anos completos. Porque o Brasil nasceu aqui, como você sabe. Devagar… devagar… com a chegada das caravelas cabralinas. E, devagar, foi crescendo, aqui na Bahia, um povoado aqui, outro ali, até que nasceu a bela cidade que você está vendo, quase meio século depois do descobrimento. Cidade que também foi crescendo devagar, derramando – se pelas colinas, mostrando, desde menina, os meneios graciosos que ensinou às baianas, e que elas mostram, quando andam,devagar pelas ruas… Mas a  Bahia não ficou aqui, debruçada sobre o mar que, devagar e manso, vem quebrar nas praias. Devagar foi conquistando as terras de massapê do Recôncavo, plantando canas e engenhos, construindo devagar e solidamente a primeira  grande riqueza nacional. Devagar os negros plantavam, devagar a Natureza fazia germinar e crescer plantas, devagar os rijos braços ceifavam e moíam, ferviam e cristalizavam, ao som das cantigas dolentes, que ninavam e ensinavam ternura e saudade à Bahia menina….[…] Devagar a  Bahia amamentava o Brasil, e o ensinava a ser Pátria”.

Devagar, porque só vagarosamente isto pode ser feito, a Bahia sedimentava e desenvolvia a sua cultura. Então, minha  gente , devagar com a Bahia!

Maria José Rocha (Zezé) é mestre e doutoranda em Educação. Ex-deputada baiana, preside a Casa da Educação Anísio Teixeira em Brasília.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *