1974 – Revolução dos Cravos põe fim à ditadura herdada de Salazar

Sem derramar sangue, rebelião militar conduzida por jovens derruba o governo português de Marcelo Caetano
Uma rebelião militar conduzida basicamente por jovens capitães do exército derruba, em 25 de abril de 1974, o governo português de Marcelo Caetano, herdeiro da ditadura de Antonio de Oliveira Salazar. Uma imensa massa sai às ruas para manifestar solidariedade aos soldados.

Wikicommons

Assume então o comando do país o general António Spínola, que promete permanecer no posto somente até as próximas eleições. Nos dias seguintes, os cárceres são abertos e os prisioneiros políticos libertados, a censura à imprensa é levantada. O secretário-geral do Partido Comunista, Álvaro Cunhal e o secretário-geral do Partido Socialista, Mário Soares voltam do exílio. A história consagrou esse movimento como a Revolução dos Cravos.

Logo ao amanhecer de 25 de abril o povo começou a juntar-se nas ruas. Uma florista que levava cravos para um hotel teria entregue um cravo a um soldado, que o colocou no cano da espingarda. Outros imitaram o gesto, enfiando cravos vermelhos no cano das suas armas.

No século 19, Portugal viveu o desejo e a ilusão de continuar sendo o império da época dos descobrimentos. Nas complexas negociações do século 20 da divisão dos territórios africanos com outras potências europeias, mesmo sem o poder de Inglaterra ou França, os portugueses mantiveram Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e outras possessões menores.

O período posterior à Segunda Guerra Mundial detonou uma série de movimentos de libertação. A presença portuguesa era garantida à custa de uma dispendiosa ocupação militar, que cada vez mais indispunha o governo com os setores da sociedade que não estavam mais dispostos a pagar por isso. Portugal tornava-se um império periférico, que cedia, cada vez mais, à exploração de suas colônias a empresas estrangeiras e vinculava-se economicamente ao mercado europeu. Em 1961, teve início a chamada Guerra no Ultramar. Tropas guerrilheiras em Moçambique, Angola e Guiné-Bissau rebelaram-se contra o governo português, que obrigou o país a desviar ainda mais recursos do orçamento para manter o conflito que durou até 1974.

De fato, a Revolução dos Cravos derrubou a longa ditadura salazarista e de seus herdeiros. Salazar tomou o poder em Portugal em 1932, instituindo o Estado Novo e governou com mão de ferro. Na década de 30, não estava sozinho. Ao lado de Francisco Franco, da Espanha, de Benito Mussolini, da Itália, e Adolf Hitler, da Alemanha, compunha o quadro de ditadores fascistas. Quando a guerra eclodiu, o governo português tinha muitos interesses econômicos fora do Eixo, e, ao lado dos espanhóis, preferiu a neutralidade. Nos anos que se seguiram, o país mergulhou numa mórbida placidez. Salazar desestimulou a economia, preferindo entesourar o dinheiro e incentivar o grosso da população a permanecer no campo. Qualquer crítica ao governo era punida pela PIDE (Polícia Interna de Defesa do Estado), que prendia, torturava e matava os opositores.

Quando Salazar morreu, em 1970, a ditadura continuou com o professor Marcelo Caetano que, na prática, já governava como ministro de Salazar, quem, depois de um derrame, em 1968, estava impedido de exercer o cargo. Os anos de repressão e isolamento político haviam colocado no mesmo barco da oposição, um largo espectro de descontentes: comunistas, socialistas, liberais, ex-combatentes da guerra na África, exilados e refugiados.

A primeira reunião clandestina de capitães foi realizada em Bissau, em 21 de Agosto de 1973. Uma nova reunião, em 9 de Setembro de 1973 no Monte Sobral (Alcáçovas) dá origem ao MFA (Movimento das Forças Armadas). No dia 5 de Março de 1974 é aprovado o primeiro documento do movimento “Os Militares, as Forças Armadas e a Nação” que passa a circular clandestinamente. No dia 14 de Março o governo demite os generais Spínola e Costa Gomes dos cargos de Vice-Chefe e Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas, por Spínola ter escrito e Costa Gomes ter dado cobertura a um livro, “Portugal e o Futuro”, em que, pela primeira vez, uma alta patente advogava a necessidade de uma solução política e não militar para as revoltas independentistas nas colónias.

No dia 24 de Abril de 1974, um grupo de militares comandados por Otelo Saraiva de Carvalho instalou secretamente o posto de comando do movimento golpista no quartel da Pontinha, em Lisboa.

Às 22h 55m é transmitida pelo rádio a canção “E depois do Adeus”, de Paulo de Carvalho (Para ouvir, clique aqui). Este foi um dos sinais previamente combinados. O segundo sinal foi dado às 0h20, com a transmissão de “Grândola, Vila Morena”, de José Afonso, que marcava o início das operações.

À Escola Prática de Cavalaria, comandada pelo capitão Salgueiro Maia, coube o papel mais importante: a ocupação do Terreiro do Paço em Lisboa. A ocupação se deu às primeiras horas da manhã. Maia moveu parte de suas tropas para o Quartel do Carmo onde se encontrava  Marcello Caetano, que ao final do dia se rendeu, fazendo, contudo, a exigência de entregar o poder ao general Spínola que não fazia parte do MFA, para que o “poder não caísse na rua”. Caetano se exilou no Brasil. A revolução resultou na morte de 4 pessoas, quando elementos da polícia política dispararam sobre um grupo que se manifestava à porta das suas instalações.

No dia seguinte, forma-se a Junta de Salvação Nacional, constituída por militares, e que procederá a um governo de transição. O essencial do programa resume-se nos 3 D: Democratizar, Descolonizar, Desenvolver.

Entre as medidas imediatas da revolução contam-se a extinção da polícia política (PIDE/DGS) e da Censura. Os sindicatos livres e os partidos foram legalizados.Passada uma semana, o 1.º de Maio foi celebrado legalmente nas ruas pela primeira vez em muitos anos. Em Lisboa reuniram-se cerca de um milhão de pessoas.

Portugal passou pelo PREC (Processo Revolucionário Em Curso), que durou cerca de 2 anos, marcado pela tensa disputa entre forças de esquerda e de direita. No dia 25 de Abril de 1975 realizaram-se as primeiras eleições livres, para a Assembleia Constituinte, que foram ganhas pelo Partido Socialista. Na sequência dos trabalhos desta assembleia foi aprovada, ao calor ainda da Revolução, uma nova Constituição, de forte pendor socialista, e estabelecida uma democracia parlamentar de tipo ocidental.

Acabada a guerra colonial, durante o PREC as colônias africanas e Timor-Leste tornaram-se independentes.

*Com informações do prof. Lincoln Secco

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *