Governo Jerônimo avalia “comitê” para resolver crise provocada por ocupações do MST no interior

Por Lula Bonfim

O governo Jerônimo Rodrigues (PT) está avaliando a possibilidade da criação de um comitê para debater questões fundiárias na Bahia. A ideia inicial é a construção de uma mesa de conversas para resolver a crise provocada pelas ocupações do Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no interior do estado, mas o órgão seria permanente, visando a resolução de quaisquer conflitos de terra em território baiano.

O “Comitê Permanente Sobre as Questões Fundiárias na Bahia” foi uma ideia do deputado estadual Eduardo Salles (PP), durante reunião realizada na terça-feira (11) com o secretário estadual das Relações Institucionais, Luiz Caetano (PT). O parlamentar revelou ao Bahia Notícias que sua grande preocupação é que os conflitos de terra no estado se acirrem e resultem em perdas de vidas.

“Minha preocupação é com as vidas envolvidas. Os produtores rurais, dos quais sou muito próximo, estão mais organizados e não estão mais dispostos a aceitar a invasão de suas terras, que são produtivas, que cumprem a função social da propriedade prevista na Constituição. Se as coisas continuarem evoluindo do jeito que estão, pode ocorrer uma guerra, com derramamento de sangue, e não é isso que queremos”, disse Salles.

O comitê seria formado pelos movimentos sociais de terra; por federações, sindicatos e associações ligados à agropecuária; pelas secretarias estaduais da Casa Civil, das Relações Institucionais, da Segurança Pública, da Agricultura e do Desenvolvimento Rural; deputados estaduais, incluindo os líderes do governo e da oposição; e por representantes do Ministério Público, do Tribunal de Justiça da Bahia, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

“Eu não sou contra a reforma agrária. Está prevista na Constituição e faz bem ao Brasil. Mas precisa ser feita dentro da legalidade, não invadindo terras de produtores rurais, não invadindo terras produtivas. São famílias que produzem ali. Muitas vezes, pequenos produtores. Eu entendo a pauta dos movimentos sociais, mas acho que tudo pode ser resolvido com diálogo. Precisamos evitar o confronto”, declarou Salles.

CPI DO MST

A gestão estadual está considerando adotar a medida sugerida por Salles. A intenção, além de resolver de forma pacífica os conflitos entre o MST e produtores rurais do interior do estado, é eclipsar as movimentações na Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA) pela instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as ocupações em território baiano.

A avaliação do governo Jerônimo é que uma CPI pode atingir as imagens das gestões petistas que se iniciam tanto a nível estadual quanto federal, devido às relações políticas, ideológicas e históricas entre o MST e o PT, que não tem disfarçado o incômodo com as ocupações na Bahia.

“É um movimento suprapartidário que eu respeito, que eu entendo que é extremamente importante para que a gente possa fazer uma reforma agrária neste país. Mas me desagrada a questão das ocupações. Eu não acho que devam ser feitas ocupações em locais que tenham produtividade. E, para isso, o governo do estado tem atendido ao Poder Judiciário, no sentido da reintegração de posse”, afirmou o líder do governo na AL-BA, Rosemberg Pinto (PT), sobre o MST.

Além de pensar na construção do comitê, o governo trabalha em outras frentes para impedir que CPI abale a imagem das gestões petistas. Dos 31 parlamentares que assinaram o requerimento para a abertura de investigação, 11 são da base governista. Há uma pressão para que esses deputados da situação retirem seu nome do pedido. Entretanto, esses mesmos quadros, também são pressionados por suas bases eleitorais, muito ligadas aos produtores agropecuários.

São os casos do presidente da AL-BA, Adolfo Menezes (PSD), que declarou ao BN nesta quarta (12) que não retiraria seu nome; e do deputado Eduardo Salles, que foi o 31º a assinar o documento e também garantiu que não voltaria atrás.

“Eu não vou tirar. Eu sou próximo da questão, próximo de muitos produtores rurais, dos grandes aos pequenos produtores, e todos têm sido muito prejudicados por essas invasões. Eu repito que não sou contra a reforma agrária. Somos a favor. Mas tudo precisa ser feito dentro da legalidade. Eu espero que a gente consiga resolver essa questão com diálogo, na paz, e por isso eu sugeri a criação do comitê”, comentou Salles.

Rosemberg garantiu que não tem feito nenhuma movimentação para impedir a instalação da CPI. Porém, o líder do governo afirmou que uma condição necessária para a abertura da investigação não existe: um fato determinado. Segundo ele, o tema “invasões de terra” é subjetivo e deveria ser debatido apenas no Congresso Nacional.

“Eu nunca pedi a nenhum deputado para assinar ou para não assinar. Não cumpre o meu papel essa tarefa. Meu papel é conscientizar os parlamentares daquilo que, na minha opinião, pode ou não pode ser feito. A CPI não tem um fato determinado. Ela trata de invasão de propriedade, que não deve romper, na minha opinião, com o que diz a Constituição Federal, porque a legislação sobre propriedade é restrita ao Congresso Nacional”, avaliou Rosemberg.

“Não tem motivação, não tem um fato determinado, e eu espero que a Assembleia Legislativa, com seu quadro jurídico, apresente essa posição para a Mesa Diretora da Casa. Se ela também não entender dessa maneira, eu não vejo nenhum problema. É da Casa legislativa essas questões de CPI e vamos enfrentar esse debate com muita tranquilidade”, concluiu o líder do governo.

Lideranças da oposição, entretanto, revelaram ao Bahia Notícias nos bastidores que há uma movimentação forte para a retirada de assinaturas do requerimento, com a participação do governo federal. Os deputados estaduais do PSD, por exemplo, estariam sendo pressionados desde Brasília para que desistam de subscrever o pedido de CPI. “Eu não sei se vai para frente, infelizmente. A pressão é muito grande”, disse um oposicionista, que preferiu não se identificar.

OTIMISMO

Por outro lado, o autor do requerimento para CPI se mostra otimista. O deputado estadual Leandro de Jesus (PL) acredita que, mesmo que aconteça um movimento de desistência de membros do governo, o pedido de investigação continuará de pé, com o mínimo de assinaturas exigida para a abertura da comissão. Como já há 31 parlamentares subscritos, até 10 poderiam desistir sem comprometer o andamento do processo.

“A sensação que eu tenho, com os colegas deputados, é que a maioria deve manter sim as assinaturas. Pode ser que haja um caso ou outro de retirada, mas acredito que a quantidade possível de retirada de assinaturas – se é que vai acontecer – não vai comprometer o resultado final. Eu tenho certeza que ficaremos acima das 21 assinaturas”, avaliou Leandro de Jesus ao BN.

O deputado do PL também respondeu aos argumentos de Rosemberg contrários à CPI. De acordo com Leandro de Jesus, há um claro fato determinado que motiva a investigação e o tema do requerimento não é a reforma agrária em si, o que permite a abordagem do assunto fora do Congresso Nacional.

“O líder do governo na Casa está desinformado. Não estamos falando de reforma agrária especificamente, nos termos legais, de como deveria ser. Estamos falando de fatos que são de interesse do estado, do governo e da sociedade baiana, porque são invasões ilegais. Estamos falando de uma questão de segurança pública, de impactos econômicos e também de questões sociais impactadas por essas invasões”, argumentou Leandro.

“Por isso, temos sim fatos que ensejam a instalação dessa CPI e o líder do governo, se não estiver equivocado, está tentando se utilizar dessa narrativa para tentar emplacar o enfraquecimento da CPI, o que não vai acontecer. Nós fizemos tudo dentro dos critérios exigidos, respeitando as regras da Casa, cumprimos todas as etapas e agora está nas mãos do presidente da Casa, que nos garantiu dar prosseguimento nessa instalação”, continuou o parlamentar do PL.

Apesar a persistência na CPI, Leandro de Jesus também vê com bons olhos a criação de um comitê permanente para o diálogo dos envolvidos na crise fundiária. O importante, segundo ele, é haver um processo legal e transparente de reforma agrária, sem prejuízo dos produtores rurais.

“Todo tipo de iniciativa que vise resolver o problema, eu vejo com bons olhos. Se essa iniciativa vier trazer luz para este momento de trevas que estamos vivenciando sobre essas invasões, eu acho ótimo, inclusive com a participação de todos os envolvidos, com os interessados de cada lado. E que o governo tenha uma atuação fora do palanque político e ideológico. É preciso buscar a reforma agrária conforme a legalidade. Eu não sou contra a reforma agrária”, finalizou Leandro. 

Fonte: BN

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