Série governadores: Paulo Guerra

Opinião

Capítulo 4

Como Nilo Coelho, personagem de ontem desta série sobre governadores de Pernambuco, Paulo Pessoa Guerra (PSD), que chegou ao poder com a deposição de Miguel Arraes em 1964, de quem era vice, veio do Interior. Enquanto Nilo partiu de Petrolina, no Sertão, para quebrar preconceitos naturais de um Estado movido pela supremacia da economia açucareira, Guerra deu seu grito de guerra saindo de Nazaré da Mata, a Nazaré dos seus maracatus encantados.

Veio ao mundo em 1916, cheirando a melaço, nascido no engenho Babilônia, onde seu umbigo foi enterrado, uma das formas, naquela época, de estreitar os vínculos sentimentais e criar raízes com a terra. Mas enquanto Nilo foi governador biônico, nomeado pelo presidente Castelo Branco, Guerra passou pelo teste das urnas em 1962, ano da última eleição direta antes do golpe, em 1964. Pelo sistema eleitoral vigente, o vice também era votado numa chapa em separado.

Vice de Arraes por uma indicação do PSD, legenda comandada por Etelvino Lins, sertanejo de Sertânia, também ex-governador, Paulo Guerra teve quase a mesma votação do seu companheiro de chapa: 224.350 votos, o que equivalente a 46.59% dos votos válidos, enquanto Arraes teve 264.499 votos, 47,9% dos votos válidos. Arraes só ficou um ano no poder. Perseguido pelo regime militar, acabou cassado.

“Mas em nenhum momento, Paulo Guerra conspirou para ver Arraes deposto e ele assumir o Governo”, atesta o tarimbado e veterano jornalista Ângelo Castelo Branco, que conviveu de perto com Guerra, de quem ouviu muitas histórias de bastidores. “Guerra era um político correto, do bem, jamais puxaria o tapete de quem quer que fosse, menos de Arraes, por quem nutria forte admiração”, completa Castelo.

A coligação que apoiou Arraes e Paulo Guerra era formada por dois pequenos partidos, o Social Trabalhista, de Guerra, e o Trabalhista Brasileiro, de Arraes. Juntos, derrotaram João Cleofas de Oliveira, da UDN (União Democrática Nacional) e Armando Monteiro Filho do, do Partido Social Democrático (PSD).

Paulo Guerra começou a sua vida pública ainda estudante, nomeado pelo governador-interventor Agamenon Magalhães prefeito de Orobó, cargo que exerceu entre 1938 e 1940. Deu certo e foi nomeado em seguida prefeito de Bezerros por 14 meses, também por Agamenon. Em 1939, foi diplomado bacharel em Direito pela mais concorrida e célebre instituição de ensino superior da época, a Faculdade de Direito do Recife.

Recém-formado, assumiu a função de delegado distrital do Recife até o dia 10 de dezembro de 1942. Em seguida, até 1945, foi diretor da Penitenciária Agrícola de Itamaracá. Naquele ano seria eleito deputado federal pelo PSD e reeleito em 1949. Em 1950, foi deputado estadual e presidiu a Assembleia Legislativa, numa carreira política que culminou com a eleição para vice-governador de Miguel Arraes, em 1962.

Senador da República – Depois de cumprir a missão de governador, em um período tão conturbado da vida nacional, com o povo resmungando do regime e chorando com saudade de Arraes, convertido em mito por causa da cassação, Paulo Guerra foi eleito senador da República, mandato que exerceu concentrando as suas preocupações na atuação na defesa dos interesses do Nordeste. Durante seu governo, ocorreram vários impasses políticos, devido à influência exercida pelos chefes do movimento militar, resultando em várias prisões políticas, sobretudo de pessoas consideradas esquerdistas.

Restauração, sua grande marca – Marco da gestão de Paulo Guerra, o Hospital da Restauração do Recife, a quem a Assembleia prestou uma grande homenagem batizando-o com o seu nome, ainda é, hoje, a maior emergência mantida pelo sistema SUS no Estado. Em seu Governo, Guerra lançou também as bases da Fundação do Ensino Superior de Pernambuco, hoje Universidade de Pernambuco. Estimulou a eletrificação rural, a industrialização e investiu em infraestrutura. Criou também o Colégio da Polícia Militar de Pernambuco (CPM), em 1966.

Perfil apaziguador – Com o golpe de 1º de abril, o governador Miguel Arraes foi deposto pela Assembleia Legislativa, sob a pressão dos militares vitoriosos, Paulo Guerra procurou apaziguar os ânimos e atenuar as perseguições políticas. Mas foi um período em que os movimentos operários e camponeses foram fortemente reprimidos, não por desejo de Guerra, mas por fortes pressões que recebia do Governo Central. Durante o governo de Arraes, teve divergências, sobretudo nas ocasiões em que os grupos políticos radicalizaram as suas posições. Habilidoso, soube superar com o tempo.

Líder do Governo Geisel – Em 27 de outubro de 1965, o Ato Institucional Número Dois instituiu o bipartidarismo e, em razão disso, Paulo Guerra ingressou na Arena. Dedicou-se à pecuária após deixar o Palácio do Campo das Princesas. Retornou à política em 1970, quando foi eleito senador, chegando ao posto de vice-líder do governo Ernesto Geisel. Em 1977, o governo baixou o Pacote de Abril, para garantir a maioria governista em 1978. Paulo Guerra aceitou renovar seu mandato por via indireta, mas faleceu três meses depois, assumindo a sua cadeira Murilo Paraíso.

Nem na pressão cedeu – Filho de João Pessoa Guerra e Maria Gayão Pessoa Guerra, tradicional família proprietária de engenhos na Zona da Mata e com grande influência política, o governador Paulo Guerra foi surpreendido com o convite de Arraes para compor a sua chapa. Consultou Etelvino Lins, presidente estadual do PSD (na foto ao lado), e dele recebeu carta branca. Mas depois que participou do primeiro ato ao lado de Arraes, na praça central de Limoeiro, Etelvino foi pressionado a forçá-lo a sair da chapa. A esta altura, Guerra, já afinado com Arraes, bateu o pé e foi até o fim, saindo vitorioso.

CURTAS

OS ELEITOS – Nas eleições de 1962, a última antes da deposição do presidente João Goulart e a instalação do regime militar, também foram eleitos em Pernambuco os senadores José Ermírio de Moraes e Pessoa de Queiroz, mais 24 deputados federais e 65 estaduais.

PROLE GRANDE – Enquanto exercia cargos públicos, de deputado estadual a senador da República, Paulo Guerra se dedicava também às atividades voltadas para a pecuária e a agricultura. Faleceu em 9 de julho de 1977, deixando viúva Dona Virgínia, com quem gerou para o mundo 13 filhos.

Por: Magno Martins

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