Preterida por Bolsonaro, Globo usa articulistas para criticar proposta de relações exteriores

Nesta terça-feira (6), o jornal O Globo, principal veículo doutrinário do grupo, estampou em sua manchete análises de Merval Pereira, Miriam Leitão e José Casado sobre a “falta de clareza do programa de governo apresentado na campanha e as declarações contraditórias” sobre propostas de Bolsonaro.

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Preterida pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL) – que claramente dá preferência à Record, do bispo Edir Macedo, em suas ações na mídia -, as organizações Globo tem usado articulistas e colunistas para tecer críticas às propostas do militar da reserva.

Nesta terça-feira (6), o jornal O Globo, principal veículo doutrinário do grupo, estampou em sua manchete “Declarações de Bolsonaro sobre política externa acendem alerta, analisam colunistas do Globo“, com análises de Merval Pereira, Miriam Leitão e José Casado sobre a “falta de clareza do programa de governo apresentado na campanha e as declarações contraditórias”, que deixam “incertezas” na condução da política externa de Bolsonaro.

Merval Pereira, membro do Conselho Editorial e uma das vozes que dá as diretrizes na cobertura política das Organizações Globo, diz que “é preocupante o rumo que Jair Bolsonaro parece querer imprimir à política externa, que poderá por em risco a credibilidade das instituições brasileiras e promover a importação de ódios e terrorismo, em vez de exportar concórdia, resultante do convívio harmônico entre judeus e árabes, de que o país é exemplo”, relata, indiretamente, sobre a proposta de Bolsonaro de, a exemplo dos Estados Unidos, transferir a embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém.

“O exemplo dos Estados Unidos parece fascinar o presidente eleito Jair Bolsonaro, mas ele tem que entender que o Brasil, por maior que possamos ser no continente, é periférico na geopolítica internacional”, afirma Merval, minimizando o papel do Brasil nas relações internacionais.

Ele também critica a decisão de desdenhar da parceria comercial comn a China, para privilegiar o comércio estadunidense. “Desdenhar da China, nosso principal parceiro comercial, afastar-se do Mercosul bruscamente, menosprezar a Argentina como parceira regional importante, tudo parece improvisado e ditado por uma política ideológica de que o próprio presidente eleito acusa os governos anteriores”.

Política externa ideológica
Miriam Leitão, que foi fortemente atacada por bolsonaristas nas redes sociais durante a campanha, afirma que “a transferência da sede da embaixada do Brasil para Jerusalém pode ter como efeito bumerangue a retaliação comercial dos árabes ao Brasil”. “Mas principalmente é ruim por significar um retrocesso no não alinhamento automático com os Estados Unidos, um dos avanços conseguidos na diplomacia dos últimos governos militares”.

Sem deixar de lado as críticas ao alvo preferido – o PT -, Miriam diz que “o pior que pode nos acontecer é depois de termos saído de uma política externa ideológica de esquerda, irmos para outra ideológica de ultra-direita”. “Quando outros elementos, como manias e idiossincrasias do governo de plantão, entram nas decisões algo dá sempre errado”, conclui.

Poeta se falar menos
José Casado, editor especial do jornal, compara a diplomacia de Bolsonaro com os Estados Unidos com a relação de músicos brasileiros – como Astrud Gilberto (voz), Antonio Carlos Jobim (piano), Tião Neto (baixo), Milton Banana (bateria), João Gilberto (violão) – com colegas americanos, como Stan Getz, para levar a Bossa Nova aos Estados Unidos.

“Foi um dos grandes momentos da diplomacia brasileira: o disco ‘Getz/Gilberto’ abriu o mercado dos EUA e da Europa para a bossa nova. Bolsonaro não possui átomo da genialidade diplomática de Jobim, mas seria um poeta se falasse menos sobre política externa no seu mandato”.

E complementa. “Em uma semana (lapso de tempo em que os seis de Nova York lapidaram um revolucionário Made in Brazil), Bolsonaro e equipe conseguiram semear tensões e incertezas sobre o futuro do Brasil com Argentina, Paraguai e Uruguai (sócios no Mercosul), China, Cuba, União Europeia, países árabes e muçulmanos”.

Casado termina com um conselhor. “Bolsonaro pode não gostar da melodia de Tom e preferir o punk-brega de Trump, mas deveria ouvir o conselho grátis do bilionário Warren Buffet, um conservador: ‘Se você está num buraco, a coisa mais importante a fazer é parar de cavar’”.

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