FHC afirma que Alckmin precisa “transmitir uma mensagem” aos brasileiros

A candidatura do governador Geraldo Alckmin (SP) à presidência da República começa a ser alvo de questionamentos dentro do próprio PSDB.

Nesta terça-feira (2), em entrevista ao jornal “O Estado de São Paulo”, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirma que seu companheiro de partido precisa provar que é capaz de unir o “centro democrático” e “transmitir uma mensagem” aos brasileiros para se tornar competitivo.

E acrescenta: “Se houver alguém com mais capacidade de juntar, que prove essa capacidade e que tenha princípios próximos aos nossos, temos que apoiar essa pessoa”.

Confira trechos da entrevista:

O senhor tem algum temor em relação a 2018? Está entre os pessimistas ou otimistas?

FHC – Tenho, mas estou no intermediário. Do ponto de vista econômico, estamos começando a ter um bom momento no mundo. O mundo conta sempre. Há o momento em que o ciclo é ascendente. Isso ajuda. Nós aqui demos alguns sinais de melhoria. Se tivermos condição de eleger alguém confiável ao país, tem possibilidade de um certo avanço no Brasil. Nesse lado sou otimista. O meu temor é que não se consiga organizar o centro. É preciso que haja lideranças capazes de organizar. Há o perigo de que um demagogo dê sensação às pessoas de que vão influenciar a favor dos que mais precisam. Mas acredito que dá tempo de organizar o centro.

O senhor inclui o ex-presidente Lula nesta lista de demagogos?

FHC- O Lula mesmo se declarou uma metamorfose ambulante. Ele é extremamente sensível aos estímulos do momento. Sabe se posicionar definindo o inimigo. Esse inimigo varia, de acordo com o momento. O que ele tem não é demagogia no sentido banal, mas a capacidade de explicar. É muito importante em uma sociedade de massa que o líder fale. A sociedade nem sempre quer ouvir, mas agora está aberta porque está perplexa. É preciso que alguém toque nas cordas sensíveis à população. O Lula toca de ouvido. O candidato sem capacidade de expressão tem dificuldade de se firmar, ainda que esteja certo. Eu não conheço o Bolsonaro. Ele era deputado no meu tempo e não tinha uma expressão maior. Queria me fuzilar, mas nunca dei atenção. Não sei o que ele pensa sobre qualquer tema.

Não sei se ele é capaz de expressar o que pensa sobre qualquer tema. Às vezes a pessoa, mesmo sem ter a capacidade de expressar, simboliza.

O senhor acha possível em 2018 termos uma candidatura do Planalto e outra, do PSDB, com outros partidos apoiando Alckmin?

FHC- É possível, mas não desejável. Chegamos a um ponto em que é preciso unir, colar. Está tudo muito desagregado. No mundo contemporâneo você consegue muito mais essa colagem pela mensagem do que qualquer outro fator, para o bem ou para o mal. Veja o que aconteceu nos Estados Unidos: o (presidente Donald) Trump colou lá. Na França, o (presidente Emannuel) Macron também. Cada um de um jeito, com orientação diferente. Por mais que exista comunicação entre as pessoas, é necessário que alguém lidere e seja capaz de emitir uma mensagem.

Qual é a mensagem?

FHC- Esse é o ponto. O partido que tiver uma mensagem que pegue no povo. Não é tanto a mensagem, mas como ela é emitida. No nosso caso, o que é necessário é ter um novo sentimento de coesão nacional. Não dá para levar um país de 200 milhões de habitantes na base de fracionar e destilar uma situação de radicalização, como aparentemente está se formando. Quem tiver uma mensagem mais abrangente, tem mais chance. As pessoas querem emprego, segurança – que é um tema que não estava na pauta eleitoral, mas hoje está – e as questões básicas. A mais básica da agenda do Estado é a educação. Não há emprego possível sem educação. Do ponto de vista da agenda das pessoas, há também o transporte e a saúde.

O senhor disse que o pior cenário seria o centro se fragmentar. Se chegar lá na frente e não acontecer um acordo, se o governo insistir em lançar um candidato, qual deve ser a posição do PSDB: manter uma candidatura que mantenha esses valores ou sucumbir e apoiar outra?

FHC- Tem que manter a candidatura, mas tem que ter efeito no voto.

Viabilidade eleitoral?

FHC- Isso. Senão, vai para a academia. Quem entra na política sai da área de conforto. Tem que ter capacidade de juntar pessoas com opiniões diferentes. Se houver alguém com mais capacidade de juntar, que prove essa capacidade e que tenha princípios próximos aos nossos, tem que apoiar essa pessoa. Não vejo quem seja.

Então não necessariamente o candidato do centro tem que ser do PSDB?

FHC- Tem que ter um. Espero que esse (candidato) tenha capacidade de aglutinar. Se houver outro que aglutine, vai fazer o quê? Veja o que houve no Rio: ficou entre (Marcelo) Crivella (atual prefeito pelo PRB) e (Marcelo) o Freixo (deputado estadual pelo PSOL que perdeu para Crivella na disputa municipal).

Estamos há menos de um mês do julgamento do recurso de Lula no TRF da 4ª região. Do ponto de vista da sociologia e da política, qual seria o impacto para o país de uma eventual condenação de um ex-presidente da República?

FHC- Do ponto de vista do país, é sempre ruim. É ruim para o país e para a memória, mas não acredito que a população vai tremer nas suas bases por causa disso. Não acho que o país vai tremer em função disso. É claro que existe também uma estratégia política do PT: a perseguição. Se o julgamento terminar em condenação, tem que aceitar.

Como o senhor explica o fato de Lula liderar as pesquisas de intenção de votos?

FHC- Pega o caso do Peru, que nós citamos. O “fujimorismo” é a força predominante até hoje e o Fujimori está na cadeia (estava até o dia 24, quando recebeu indulto humanitário do atual presidente Pedro Pablo Kuczynski). O próprio Perón teve um momento assim. É curioso ver que em países como os nossos, com um nível educacional relativamente pouco desenvolvido, as pessoas têm muitas carências. Aqueles que dão às pessoas a sensação de que atenderam às suas carências, ganham uma certa permissão para se desviar da ética. É pavoroso, mas é assim. É populismo. É a cultura que prevalece nesses países. A nossa está em fase de mudança. Aqui a sociedade já tem mais informação. Nos regimes parlamentaristas têm menos chance de que isso aconteça. Tem mais filtros. A emoção global não leva de roldão. Pode alguém irromper, mas difícil é governar depois.

O senhor disse que o PSDB precisa fazer autocrítica. Qual seria?

FHC- Acho que o PSDB está, à sua maneira, fazendo. Mudou a direção e, ao mudar, escolheu pessoas com responsabilidade. Não que os outros não tivessem. Aécio (Neves, senador por Minas Gerais e ex-presidente do PSDB) não é um irresponsável. Fez coisas positivas para o PSDB. Mas o partido tem que dizer que, se houve erro de algum peessedebista, problema dele. O partido não tem que se solidarizar com o erro de seus filiados. A Lava Jato foi um marco importante na vida brasileira, o que não quer dizer que não tenha excessos aqui e ali. Acho um pouco exagerada essa vontade de vingança que existe hoje.

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